"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quinta-feira, 13 de outubro de 2011

OPINIÃO DO ESTADÃO: POLÍCIA LEGISLATIVA OU MILÍCIA?

Responsável pela preservação da ordem, do patrimônio e da segurança de deputados e funcionários nas dependências do Congresso, a Polícia Legislativa da Câmara, que conta com 500 agentes, está sendo acusada de ter exorbitado de suas prerrogativas.

Com a leniência do presidente da Casa, deputado Marco Maia (PT-RS), teria cometido crime de abuso de autoridade, agindo como milícia privada a serviço do deputado Roberto Policarpo (PT-DF), que há cinco meses foi procurado por três cabos eleitorais para cobrar dívidas e promessas da campanha eleitoral de 2010.

O caso, que foi divulgado pela revista Veja, foi levado à Polícia Federal e os três cabos eleitorais – todos filiados ao PT – se transformaram em testemunhas de um inquérito criminal que pode custar o mandato de Policarpo.

A acusação é tão grave que levou a liderança do PPS a apresentar uma representação ao Corregedor da Câmara, deputado Eduardo da Fonte (PP-PE), com o objetivo de apurar o envolvimento de Maia e de Policarpo (DF) num suposto crime de chantagem.

As três testemunhas – o vigilante Paulo Batista dos Santos, o lavador de carros Edmilson Almeida Lopes e o sem-terra Francisco Manoel do Carmo – alegam ter negociado com Policarpo os votos de 39 eleitores arregimentados em acampamentos rurais na periferia de Brasília e alugado um ônibus para transportá-los até suas seções eleitorais, no dia da eleição, o que é expressamente proibido por lei.

O valor do "negócio" teria sido acertado em R$ 4 mil mais a promessa de alguns empregos, mas o ônibus foi interceptado pela polícia. Na ocasião, o sem-terra Francisco Manoel do Carmo, que o dirigia, ainda tentou preservar Policarpo, alegando que o ônibus teria sido alugado por uma igreja evangélica para levar fiéis a um culto. Mas as autoridades não se convenceram e Carmo acabou sendo indiciado por crime eleitoral, além de não ter recebido um único centavo do então candidato.

Em abril deste ano, Santos, Lopes e Carmo solicitaram a Roberto Policarpo que pagasse a dívida contraída em troca da compra de votos de 39 eleitores. Eles também pediram os empregos prometidos. E lhe propuseram ainda que arcasse com o pagamento dos honorários de um advogado para defender o sem-terra no caso da apreensão do ônibus.

Em setembro, os três foram surpreendidos com a entrega de um "mandado de intimação" para que comparecessem à Coordenadoria da Polícia Legislativa, na Câmara, a fim de prestar esclarecimentos acerca de uma "ocorrência policial". Além de não ter competência legal para intimá-los, a Polícia Legislativa os teria coagido durante os depoimentos.

Para se defender, justificar a iniciativa da Polícia Legislativa e preservar a imagem de Maia, Policarpo alegou que os antigos cabos eleitorais o estariam chantageando. Mesmo que isso seja verdade, o parlamentar brasiliense deveria ter acionado o Ministério Público (MP) e a Polícia Federal, denunciando a tentativa de extorsão.

Para a liderança do PPS, se houve chantagem, ela teria sido cometida por Policarpo, que usou a Polícia Legislativa para ameaçar os acusadores. Além disso, se não procurou o MP e a Polícia Federal quando foi cobrado a pagar o que devia, é porque sabia que havia cometido um crime eleitoral que, se descoberto, poderia levá-lo à perda do mandato, dizem os líderes do PPS.

O fato de um parlamentar requisitar os serviços da Polícia Legislativa para atender a um interesse pessoal envolvendo cabos eleitorais já é condenável. O mais grave é que Policarpo confessou ter pedido esses serviços ao presidente da Câmara, seu colega de partido. O deputado Marco Maia, em nota, limitou-se a dizer que a solicitação teria sido encaminhada à Diretoria-Geral da Câmara – que está sob seu comando direto.

Se a representação formulada pela liderança do PPS for acolhida pela Corregedoria da Câmara, o passo seguinte será a abertura, no Conselho de Ética, de um processo contra Policarpo e Maia. No passado, processos como esse não davam em nada. Mas, desta vez, órgãos da sociedade civil -como a OAB – já anunciaram que irão pressionar o órgão a cumprir seu papel.

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