O relator Joaquim Barbosa, no seu voto em tese condutor do julgamento, avançou em algumas questões até então em aberto: levou em conta as investigações da CPI, foi além da versão do crime eleitoral e mostrou que a dúvida sobre se havia pagamentos mensais ou não a parlamentares em troca de apoio ao governo Lula pode ser secundária.
O ministro condenou o deputado João Paulo Cunha, o publicitário Marcos Valério e dois sócios dele na agência SMP&B por peculato, corrupção e lavagem de dinheiro pelo uso da Câmara dos Deputados como instrumento de desvio de recursos públicos mediante contratação de serviços cuja prestação não correspondia aos pagamentos recebidos.
No período em que João Paulo foi presidente da Câmara, a empresa recebeu quase R$ 11 milhões pela execução de trabalhos no valor de apenas R$ 17 mil. Segundo o entendimento do relator, o deputado direcionou a licitação em favor de Marcos Valério, que o remunerou por isso.
A evidência seriam os R$ 50 mil recebidos pela mulher de João Paulo no caixa de uma agência do Banco Rural em Brasília, pagamento autorizado mediante fax pela empresa de Marcos Valério. Se a pedido do tesoureiro Delúbio Soares ou não, se para pagar dívida de campanha eleitoral ou não, o relator repetiu: pouco importa, pois o essencial é a caracterização da troca de favores.
Daí a corrupção, daí a infração do princípio da impessoalidade previsto no artigo 37 da Constituição. Da tentativa de ocultação (a primeira versão era a de que a mulher de João Paulo teria ido ao banco pagar uma fatura de TV a cabo) decorreria a lavagem de dinheiro e do uso das prerrogativas de presidente da Câmara para favorecer a SMP&B, o peculato.
Um episódio síntese, a partir do qual Joaquim Barbosa parece pretender desvendar a trama toda arquitetada pela organização cujos participantes cometeram o que o relator entendeu terem cometido os primeiros condenados por ele: corrupção, peculato, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e, por óbvio, formação de quadrilha.
A contabilização ou não de recursos nesse quadro, convenhamos, é o de menos.
À míngua. Houve um tempo em que as comissões de inquérito emitiam ordens de prisão, faziam operações de busca e apreensão e não davam trégua aos convocados para depor.
Cometeram-se muitos abusos, humilhações, sem contar memoráveis chamamentos ao "teje preso".
Da exorbitância caiu-se no terreno oposto da completa inação em decorrência dos sucessivos habeas corpus concedidos pelo Supremo nem sempre interpretados em sua real dimensão pelos parlamentares que, no lugar de encontrar um caminho adequado para fazer valer suas prerrogativas, preferiram abrir mão delas.
Chegou-se agora ao clímax da interpretação de que nada valem e podem muito pouco com o pedido de Fernando Cavendish ao STF para não atender à convocação da CPI do Cachoeira. O pedido em si é uma impertinência.
Se atendido, terá se configurado um desacato ao Congresso.
Lições do abismo. A três fatores o tucanato atribui a queda de José Serra nas pesquisas e o empate com Celso Russomanno: o peso da rejeição a Gilberto Kassab, a desconfiança do eleitorado de que Serra não cumprirá o mandato até o fim e o gosto por uma nova experiência, também conhecido pelo nome de fadiga de material.
Deixam de lado, contudo, outros dois: o desacerto interno do PSDB - nacional e regionalmente falando - e o "incentivo" de Kassab e companhia à candidatura de Russomanno na expectativa de tirar Fernando Haddad do segundo turno.
O último partido (PT) que tentou esperteza dessa natureza elegeu Severino Cavalcanti presidente da Câmara dos Deputados.
Agora a esperança dos tucanos é o pouco tempo de televisão do candidato do PRB e a preferência dos petistas por Serra na hora do vamos ver.
19 de agosto de 2012
Dora Kramer - O Estado de S.Paulo
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