A voz das ruas às vezes é tão rouca que fica difícil entendê-la.
Com exceção dos últimos atos de vandalismo no Leblon, perto da casa do governador do Rio, Sérgio Cabral, o resto do Brasil parece ter entrado numa espécie de compasso de espera, entre o rumor da conquista da Copa das Confederações e a expectativa da visita do papa.
O resultado prático das manifestações foi manter o preço das passagens do transporte coletivo paradas por mais algum tempo (o que segundo alguns prefeitos ameaça cidades de falência, mas ninguém se comove com isso) e mostrar que o País das Maravilhas de Alice só existia na cabeça de João Santana e sua trupe de animadores de auditório.
A verdade é que o país permanece essencialmente o mesmo, ainda que vitimado por algumas gritantes barbeiragens gerenciais, mas a percepção sobre ele mudou do dia para a noite, sem que ninguém consiga avançar sobre a essência do problema.
Ontem estávamos às portas do Paraíso, hoje vislumbramos o inferno cada vez mais próximo.
As condições econômicas objetivas do mundo mudaram bastante, em nosso prejuízo, e não existe ninguém disposto a bancar a ideia de que tudo não passa de uma “marolinha”, pois quem fez isso no passado sabe muito bem que hoje estamos sofrendo as consequências da irresponsabilidade e da leviandade de ontem.
Num texto escrito para o jornal “Valor Econômico” e debatido na Feira Literária de Paraty, o economista André Lara Rezende, um dos pais do Plano Real, resumiu com uma frase aquilo que estamos sentindo, mas não sabemos explicitar com clareza: o “mal estar contemporâneo”.
Ele deixa claro que esse mal estar não é o mesmo das praças árabes, nem do Occupy Wall Street, nem dos desempregados da crise europeia.
É alguma coisa especificamente brasileira e que a classe política que nos dirige, com sua rudimentar insensibilidade e seu primarismo pragmático, não soube nem de longe decifrar ou traduzir e menos ainda administrar.
As tentativas de solução que apareceram, como um arremedo ridículo de reforma política, a proposta de reforma constitucional exclusiva ou de plebiscito limitado, não tangenciam nem de longe os problemas do mal estar.
Foto: Pedro Ladeira / AFP
A oposição não é muito melhor do que isso. A diferença é que seu projeto envolve outros nomes.
No intervalo entre o clamor da vitória no futebol e a visita do papa, há um estranho silêncio pairando no ar, quebrado apenas pelo fragor dos vândalos do Leblon.
As ruas parecem ter mais algo a dizer. O que será?
19 de julho de 2013
Sandro Vaia
Nenhum comentário:
Postar um comentário