"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

AO SENADOR DEMÓSTENES TORRES



É muito difícil a batalha contra o crack. Já temos mais de um milhão de viciados rodando como zumbis pelas ruas das cidades.



Cracolândia é uma espécie de shopping center da droga, onde o viciado encontra tudo: crack, cachimbo, camaradagem e carinho. E, obviamente, traficantes, receptadores e exploradores da miséria humana para saciarem o vício, em troca de dinheiro, televisor, batedeira, tênis Nike.

As cracolândias são a mesma coisa que os maconhódromos das universidades, os banheiros dos bares da moda, com a diferença que atendem a escória da sociedade.

Tudo certo. O crack é a ralé da cocaína. O crack é a droga para quem não tem futuro garantido como o boyzinho e a patricinha da USP. Neste target, na maioria dos casos, nada que três meses na clinica, o amor incondicional, a mesada dos pais, a perspectiva profissional não resolvam.
Para estes, o vício é apenas uma fase, jamais no sentido de Fundação de Amparo Sócio-Educativo, a ex-FEBEM.

O crack tem um efeito devastador. Vicia à primeira tragada. É muito mais poderoso que outras drogas. Certa vez, um amigo disse, na roda, lá pelos anos setenta, dando o último pega no baseado: “maconha faz mal pra quem não tem caráter”.

Jamais esqueci. Ele queria dizer que o vício ocorre quando não existe conteúdo para substituir o barato legal. Leia-se como caráter a formação moral, o grau de instrução, a família, a igreja, a escola, estas estruturas e valores que garantem o livre arbítrio das pessoas e a base para a sua independência.

Quarenta anos depois, troquemos a maconha pelo crack e respondemos: a quem o crack está destruindo? Jovens, desempregados, com baixa escolaridade e poder aquisitivo, provenientes de famílias desestruturadas. Aquele magrão amigo meu tinha toda a razão. Gente sem "caráter".


Era uma jovem que como outros jovens amava o Luan Santana. Vivia no interior de uma pequena cidade do interior, com uma família de agricultores de profunda convicção religiosa, freqüentando uma boa escola até que conheceu outro jovem que amava o crack. Usou. Viciou. Virou dependente química. A família fez de tudo. Passou a roubar a família. Passou a trazer bandidos ameaçadores para dentro de casa. Instalou o terror naquele lar.

A família perplexa vendeu terras para pagar traficantes. Vendeu bens para pagar médicos. Entregou a poupança de uma vida para recuperar a filha.
De nada adiantou. A situação só foi contornada quando a mãe, professora, saiu do emprego e foi para casa, vigiar a filha durante 24 horas por dia, responsabilizando-se diretamente pelo tratamento. Uma espécie de cárcere privado.
A situação hoje está sob controle, mas não está resolvida. A jovem vive à base de calmantes, porque, além de carinho, atenção, amor, a única saída para um viciado em crack é a sedação.
Esta é uma história real. Uma história de família.


Por que tudo isso? Ontem, o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) publicou um artigo na Folha de São Paulo, abordando um louvável projeto de sua autoria que preconiza a internação compulsória do viciado em crack. O mesmo seria preso e a pena transformada, pelo juiz, em confinamento em uma clínica para tratamento pelo período de seis meses a um ano. Leia aqui.

Não existem clínicas para tratar mais de um milhão de viciados. Fatalmente, uma minoria será atendida por um programa deste porte e com este alcance.
O tratamento pode ser feito em casa, desde que exista atenção integral ao doente, de preferência por membro da família.

Sugiro ao senador que modifique o seu projeto para internação domiciliar, desde que um membro da família, devidamente capacitado, assuma a responsabilidade do acompanhamento.
Que este familiar saia do seu trabalho para ter dedicação exclusiva ao filho, à filha, ao marido, à esposa.

Existem recursos para isso. Hoje, o auxílio-reclusão paga a família do preso o valor de R$ 862,60. O dinheiro pode sair desta dotação ou de algo semelhante.
Esta Bolsa Família para 200.000 viciados custaria R$ 2 bilhões anuais, a metade do que o Governo Federal está prometendo para combater a epidemia. Sim, existem muitos viciados sem casa e sem família. Que estes sejam internados nas clinicas.

Aos viciados que ainda tem uma estrutura familiar, um resto de lar, que seja dado um tratamento com remédios e acompanhamento médico, mas também com amor, carinho e atenção de um familiar abnegado.
Somente estes valores podem ocupar o espaço vazio deixado pela droga.
coroneLeaks

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