"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



domingo, 1 de janeiro de 2012

MISCELÂNEA

Que tal um lourinho para a Suécia?

Merece ser recontada a história da briga entre o presidente Jânio Quadros e o governador Carlos Lacerda, em 1961. Eles começaram a se estranhar por conta da política externa independente. Quando Jânio nomeou um negro para embaixador do Brasil em Gana, Lacerda lembrou estar vaga nossa embaixada na Suécia, perguntando se iam mandar um lourinho…

O episódio se lembra porque neste ano de 2012 a presidente Dilma terá de indicar mais dois ministros para o Supremo Tribunal Federal. Aposentam-se, por completarem 70 anos, Cezar Peluso e Ayres de Brito. A moda, na mais alta corte nacional de justiça, tem sido do preenchimento das vagas conforme critérios de gênero e de etnia. De repente, descobriu-se que faltava uma mulher entre os doutos juristas, tendo sido nomeadas Ellen Gracie e Carmem Lúcia e agora Rosa Weber. Depois, faltava um negro, convocando-se Joaquim Barbosa. Estabeleceram-se cadeiras cativas, demonstrando que esses processos, uma vez iniciados, não têm fim.

O problema é que se a peculiar representatividade continuar incorporada à norma constitucional de alto saber jurídico e reputação ilibada, logo surgirá alguém no palácio do Planalto lembrando faltar no Supremo um jurista japonês, outro índio, um bispo e até um gay. É preciso tomar cuidado com os exageros, que aliás tem raízes no passado. O presidente Floriano Peixoto nomeou um médico, João Goulart, dois comunistas, e os generais-presidentes, vários direitistas…

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“E QUEM DARÁ HABEAS CORPUS AO SUPREMO?”

Para ficarmos no Supremo e em Floriano Peixoto, vale lembrar que em plena revolta da Armada, com o país conturbado, o então presidente mandou prender alguns deputados, acusando-os de ligação com os revoltosos. Não podia, porque a Constituição de 1891 preceituava a imunidade parlamentar.

Rui Barbosa, já na oposição, impetrou habeas corpus para eles, junto ao Supremo. Era evidente a concessão, mas quando auxiliares indagaram do marechal o que aconteceria naquela hipótese, ele respondeu com outra pergunta: “E quem dará habeas corpus ao Supremo?”

Desnecessário dizer que os Meretíssimos escusaram-se de se pronunciar, os deputados continuaram presos e Rui Barbosa exilou-se na Inglaterra.

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“NEGO PORQUE PEDE”

Coisas da República Velha? Nem pensar. Em 1955, alegando motivos de saúde, Café Filho havia se licenciado da presidência da República, de modo a assumir o presidente da Câmara, Carlos Luz, empenhado no golpe para negar posse a Juscelino Kubitschek, presidente eleito. A trama desandou quando o general Henrique Lott botou a tropa na rua e fez valer a Constituição.

Café Filho ficou bom de repente e quis voltar. O ministro da Guerra mandou cercar o quarteirão de sua residência, em Copacabana, mantendo-o preso enquanto obrigava o Congresso a votar seu impedimento. Foi quando o já ex-presidente impetrou recurso junto ao STF. Outra vez os doutos juristas saltaram de banda, não se pronunciando e até contribuindo para a consolidação da democracia, ou seja, a posse de JK.

Naqueles dias perguntaram a Milton Campos como votaria, caso fosse ministro do Supremo, e genial professor de democracia respondeu com muito realismo e humor: “Meu voto seria nego porque pede”.

No caso, se um presidente da República precisa de decisão judicial para reassumir, é porque não é mais presidente da República…

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PRELIMINARES DE 2014

Inicia-se 2012 como preliminar para as eleições de 2014. No âmbito dos partidos, uma espécie de ensaio geral capaz de marcar o lugar dos principais atores no palco, cuidar da iluminação e da intensidade dos diálogos. Numa palavra, será no correr dos próximos doze meses que se definirão os protagonistas, ainda que obviamente sujeitos a substituições posteriores. Voltam-se as atenções para a oposição, ou seja, o ninho dos tucanos.

O PSDB precisa definir o perfil de seu candidato e, se possível, o próprio, porque sua trajetória será muito mais longa e áspera que a dos detentores do poder, tanto faz se Dilma ou Lula. Necessitarão, os tucanos, começar do zero em matéria de afirmação política. Mostrar porque são oposição, não só aumentando o diapasão de suas críticas ao governo, mas, em especial, elaborando um projeto alternativo para o país.

Se Aécio, Serra, Alckmin ou algum outro, será este ano a oportunidade de o futuro escolhido ordenar-se e sistematizar-se. Vale, para eles, o velho provérbio árabe de que bebe água limpa quem chega primeiro na fonte.

Do PT não há que falar, ou já falamos no parágrafo acima. Só o imponderável poderá afastar a atual presidente ou seu antecessor da disputa ainda distante.

E o PMDB, outrora maior partido nacional? Do jeito que as coisas vão, e pelos líderes de que hoje dispõe, a tendência é outra vez acomodar-se a reboque do PT. De preferência com Michel Temer de vice, caso os companheiros não sejam acometidos da febre totalitária de ocupar todos os cargos.

Na vaga possibilidade de serem expelidos, os peemedebistas precisarão encontrar um candidato próprio, tudo indica para perder e fazer encenação. Michel Temer? Sérgio Cabral? Tanto faz. Quanto aos demais, mera figuração. Eduardo Campos, pelo PSB, Cristóvam Buarque, pelo PDT, Marina Silva, sem os Verdes, Ciro Gomes, por legenda ainda indefinida?

Carlos Chagas

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