Na quarta parte do festival É Tudo Mentira, vamos conversar sobre um tipo de falácia comum na política desde Luís 14: a personalização das instituições. Isso tem se tornado cada vez mais comum nos três Poderes brasileiros, por mais que tenham degolado o absolutismo monárquico na Revolução Francesa.
A prática se manifesta de formas diversas, mas muito parecidas.
Se alguém critica as políticas do governo federal, o presidente Lula fala que essa pessoa "torce contra o Brasil". Ou seja: para ele, o Brasil é o governo dele.
Se o juiz Fausto de Sanctis manda prender o banqueiro Daniel Dantas duas vezes e o banqueiro recorre ao STF pra obter habeas corpus, o loquaz e ubíquo Gilmar Mendes lasca que o juiz "tentou desmoralizar o Supremo". Ou seja: o Supremo é ele.
Se aparecem críticas muito pontuais a gastos absurdos do Senado, membros do Congresso saem dizendo que estão "querendo fechar o Legislativo" e "trazer de volta a ditadura". Mostrar aos eleitores que processos eles respondem, dizem eles, é coisa da ditadura. Ou seja: o Legislativo é o descontrole dos gastos ou dos crimes.
Você já ouviu frases parecidas. Quem discorda de pontos das políticas públicas ou critica gastos é "inimigo do povo", "quer acabar com a democracia", "está contra o estado democrático de direito", "quer instaurar um estado policial", "é tudo coisa da imprensa golpista". Ainda ontem eu vi o pessoal do debate a favor dizendo que quem é contra a obrigatoriedade do diploma para jornalistas é a favor da burrice ou quer a ditadura de volta - ué, não tinha sido a ditadura que aprovou a obrigatoriedade?
Isso alimenta o esporte nacional dos gre-nais e outros demônios. É o que faz jornalistas serem agredidos em frente ao comitê eleitoral. Isso também se manifesta na cultura do "na dúvida, proíba-se", comportamento usado pelas autoridades sempre que não sabem o que fazer a respeito de alguma situação que sai de seu controle.
Porque aqui no Brasil é assim: se o estado não consegue fiscalizar o trânsito pra evitar mortes, proíbe-se a bebida. Se o jornal fala mal de um político em época de eleição, manda-se apreender a tiragem (e depois, quando fica feio, volta-se atrás). Se não se consegue fiscalizar o que os políticos fazem na internet, proíbe-se o uso da Web nas campanhas (e depois, quando fica feio, volta-se atrás). Se a modelo posa seminua com um terço, proíbe-se a reprodução da foto. Proíbe-se até videogame.
É isso que faz trocar a política pública pela politicagem rasa, enfim.
São os ecos de Luís 14.
O fato: Quem fala uma batatada dessas está querendo, na verdade, intimidar quem lhe critica. É o velho carteiraço, somado ao patrimonialismo do Estado brasileiro. Isso sinaliza uma fraqueza do conceito de democracia entre quem mais devia zelar por ele. É triste. Mas também se deve observar que a forma como se faz críticas no Brasil muitas vezes age do mesmo jeito - desqualificando completamente. Falta mais inteligência no debate nacional. Isso inclui a cabeça fria para nenhum dos lados ultrapassar a linha muito clara que existe entre crítica e ofensa.
E você com isso
A prática se manifesta de formas diversas, mas muito parecidas.
Se alguém critica as políticas do governo federal, o presidente Lula fala que essa pessoa "torce contra o Brasil". Ou seja: para ele, o Brasil é o governo dele.
Se o juiz Fausto de Sanctis manda prender o banqueiro Daniel Dantas duas vezes e o banqueiro recorre ao STF pra obter habeas corpus, o loquaz e ubíquo Gilmar Mendes lasca que o juiz "tentou desmoralizar o Supremo". Ou seja: o Supremo é ele.
Se aparecem críticas muito pontuais a gastos absurdos do Senado, membros do Congresso saem dizendo que estão "querendo fechar o Legislativo" e "trazer de volta a ditadura". Mostrar aos eleitores que processos eles respondem, dizem eles, é coisa da ditadura. Ou seja: o Legislativo é o descontrole dos gastos ou dos crimes.
Você já ouviu frases parecidas. Quem discorda de pontos das políticas públicas ou critica gastos é "inimigo do povo", "quer acabar com a democracia", "está contra o estado democrático de direito", "quer instaurar um estado policial", "é tudo coisa da imprensa golpista". Ainda ontem eu vi o pessoal do debate a favor dizendo que quem é contra a obrigatoriedade do diploma para jornalistas é a favor da burrice ou quer a ditadura de volta - ué, não tinha sido a ditadura que aprovou a obrigatoriedade?
Isso alimenta o esporte nacional dos gre-nais e outros demônios. É o que faz jornalistas serem agredidos em frente ao comitê eleitoral. Isso também se manifesta na cultura do "na dúvida, proíba-se", comportamento usado pelas autoridades sempre que não sabem o que fazer a respeito de alguma situação que sai de seu controle.
Porque aqui no Brasil é assim: se o estado não consegue fiscalizar o trânsito pra evitar mortes, proíbe-se a bebida. Se o jornal fala mal de um político em época de eleição, manda-se apreender a tiragem (e depois, quando fica feio, volta-se atrás). Se não se consegue fiscalizar o que os políticos fazem na internet, proíbe-se o uso da Web nas campanhas (e depois, quando fica feio, volta-se atrás). Se a modelo posa seminua com um terço, proíbe-se a reprodução da foto. Proíbe-se até videogame.
É isso que faz trocar a política pública pela politicagem rasa, enfim.
São os ecos de Luís 14.
O fato: Quem fala uma batatada dessas está querendo, na verdade, intimidar quem lhe critica. É o velho carteiraço, somado ao patrimonialismo do Estado brasileiro. Isso sinaliza uma fraqueza do conceito de democracia entre quem mais devia zelar por ele. É triste. Mas também se deve observar que a forma como se faz críticas no Brasil muitas vezes age do mesmo jeito - desqualificando completamente. Falta mais inteligência no debate nacional. Isso inclui a cabeça fria para nenhum dos lados ultrapassar a linha muito clara que existe entre crítica e ofensa.
- SÉRIE COMPLETA:
30 de março: "Eu Não Sabia"
31 de março: "Seis não; meia dúzia"
1° de abril: Estatísticas
2 de abril: "O Estado sou eu"
3 de abril: "Mas eles também!"
E você com isso
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