"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

RESTA A BUROCRACIA


Esclarecida a questão da perda de mandatos dos quatro parlamentares que tiveram seus direitos políticos cassados pelo Supremo Tribunal Federal (STF), não resta mais nenhum recurso aos reclamantes que tentar protelar ao máximo os trâmites burocráticos dentro da Câmara.
O presidente Henrique Alves esclareceu que quando afirmava que a questão seria finalizada na Câmara, se referia justamente a esses passos que têm que ser dados antes de declarar vagas as cadeiras e convocar os respectivos suplentes.

Esse processo pode ser rápido, como promete o novo presidente da Casa, ou pode vir a demorar se houver no caminho quem se disponha a retardá-lo com o objetivo de permitir que os deputados João Paulo Cunha (PT-SP), José Genoino (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT) estiquem suas permanências no cargo.

De acordo com o artigo 55 da Constituição, perderá o mandato o Deputado ou Senador, entre outros casos, “que perder ou tiver suspensos os direitos políticos”.
 Foi justamente o caso dos condenados no processo do mensalão, descrito no inciso IV do artigo. No parágrafo 3º do mesmo artigo 55 está dito que “nos casos previstos nos incisos III a V, a perda será declarada pela Mesa da Casa respectiva, de ofício ou mediante provocação de qualquer de seus membros, ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa”.

Além da perda ou suspensão dos direitos políticos, perde também o mandato o deputado ou senador “que deixar de comparecer, em cada sessão legislativa, à terça parte das sessões ordinárias da Casa a que pertencer, salvo licença ou missão por esta autorizada” ou “quando o decretar a Justiça Eleitoral, nos casos previstos nesta Constituição”.

A partir das experiências com deputados que perderam o mandato por decisão do TSE podemos ter uma ideia sobre o que poderá acontecer na tramitação dos casos atuais pela Câmara. O ex-deputado Ronivon Santiago, por exemplo, levou nada menos que um ano para ter a perda de seu mandato decretada, o mesmo acontecendo com o senador João Capiberibe, que conseguiu até mesmo uma liminar na justiça comum para não perder o mandato. Só um ano depois teve que deixar o Senado, mas pode se candidatar novamente e se elegeu. Os quatro condenados, pelo menos, não poderão voltar a se candidatar tão cedo, pois já estão enquadrados na Lei do Ficha Limpa.

O processo interno na Câmara tem várias etapas. Depois que o julgamento é considerado concluído pelo Supremo, o STF comunica à Câmara a perda dos direitos políticos dos deputados. O assunto tem que ser levado para a Corregedoria, que faz um relatório sobre o processo, e deve terminar na Mesa da Câmara, que declara a vacância do cargo.
Ou pode mandar o caso diretamente para a Comissão de Ética ou para o plenário, que debateriam o mérito da decisão do Supremo. Pelo que disse o presidente da Câmara, deputado Henrique Alves, o mérito da decisão não estará em questão na Câmara, mas apenas aspectos formais, como se o direito de defesa dos condenados foi obedecido.

É claro que nesse meio tempo, os condenados poderão fazer diversos recursos à mesa da Câmara ou ao Conselho de Ética, e é por isso que o PT está querendo presidi-lo. Se ficar caracterizada uma protelação indevida para evitar o cumprimento da lei, somente a pressão da opinião pública poderá denunciá-la.
No texto que escrevi para o meu livro “Mensalão”, da Editora Record, que já está nas livrarias (a noite de autógrafos será no dia 26 na Livraria da Travessa do Shopping Leblon), ressaltei o histórico voto do ministro Celso de Mello que definiu a dimensão da decisão, que sacramentou com seu voto, pela cassação dos mandatos dos parlamentares condenados no processo como consequência da perda de direitos políticos.

Celso de Mello chamou a atenção para o fato de que seria “inadmissível o comportamento de quem, demonstrando não possuir necessário senso de institucionalidade, proclama que não cumprirá uma decisão transitada em julgado emanada do órgão judiciário que, incumbido pela Assembleia Constituinte de atuar como guardião da ordem constitucional, tem o monopólio da última palavra em matéria de interpretação da Constituição”.

(Bom Carnaval a todos. A coluna voltará a ser publicada na quinta-feira dia 14)

08 de fevereiro de 2013
Merval Pereira

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