"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

TOCA O BONDE!

 


Ando neste bonde desde junho de 2005, quando botei o pé no estribo para meu primeiro passeio. Tenho me divertido à grande, me irritado às vezes e aprendido muito e sempre.

Quando o motorneiro tem anos de estrada e é muito competente, pode escolher a linha de sua preferência e sendo, como o nosso, um ás nos controles, perito nas curvas e ladeiras mais complicadas, com olhos de lince, o bonde que ele conduz passa a ser dele.

Nosso motorneiro dá a impressão de só estar atento à paisagem, mas nessa eu não caio mais, não: sei que ele como já foi inspetor, fiscal, condutor e motorneiro, sabe tudo do bonde e conhece cada trecho da viagem como a palma da sua mão. E é exigente.

Entrei como passageira, mas depois de muitas horas de viagem aprendi a ser inspetor, fiscal, condutor e até, sendo necessário, amostra de motorneiro, mas só para cobrir as férias do chefe. Ser motorneiro, mesmo cópia, é uma responsabilidade tremenda, que me custa por ser muito exaustiva.

Gosto da viagem, gosto muito do bonde e do motorneiro e adoro ser o condutor. Para quem não está familiarizado com a linguagem dos nossos bondes, explico: condutor não é, como parece óbvio, quem conduz... Quem conduz é o motorneiro.

O condutor é encarregado de controlar o pagamento das passagens, de ver se todos os passageiros já embarcaram ou desembarcaram e de só então, todos a postos, dar o sinal para o motorneiro tocar o bonde. Ele não fiscaliza, nem inspeciona, mas tem que lidar com os passageiros.

O bonde, como anda sobre trilhos, não altera o itinerário e obedece às paradas. Não havendo nenhum contratempo, respeita o horário. Assim, não é de estranhar que o condutor acabe conhecendo todos os passageiros.

E é nesse conhecimento que mora o encanto e também o perigo da viagem. Gosto de ouvir o papo dos passageiros – ouço coisas do arco da velha! Dou alguns exemplos: tem os que acham que o motorneiro é o culpado da condição das ruas, das estradas, das árvores, das calçadas e até do clima! Não lhes ocorre que ele só tem que cuidar da sua máquina e que a viagem seja a melhor possível.

Tem os que odeiam a companhia proprietária do bonde porque odeiam tudo que não é do Estado. Mas como o Estado não tem competência para organizar e manter bons bondes em funcionamento, o que é que esses hepatitosos fazem? Não largam nosso bonde.

No Carnaval, enfeitamos o bonde e saudamos Momo com toda a simpatia. Antigamente, a festa durava três dias de folia... Hoje em dia, dura uma semana e para alguns passageiros que vêm da capital, dura muito mais.

O pobre do condutor tem trabalho dobrado: é sua responsabilidade não deixar os passageiros viajarem em pé no estribo. Pois sim! Vejam aí pela foto se o coitado tem como impedir essa fuzarca:


Evoé, Momo!
 
08 de fevereiro de 2013
Maria Helena RR de Sousa

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