Lula não se fará de rogado para usar a sua luta contra o câncer para tentar fazer aumentar a devoção à sua figura?
1/12/2011
Uma observação nada sutil do articulista do jornal O Estado de S.Paulo José Nêumanne sobre a doença do ex-presidente Lula feita na última segunda-feira, 28, está causando grande ronrom.
Participando de um evento intitulado “Liberdade de Imprensa vs. Politicamente Correto”, em São Paulo, Nêumanne profetizou: “O câncer vai fazer Lula se tornar o Padre Cícero”.
Talvez entusiasmado com o tema do seminário do qual participava, José Nêumanne colocou de uma forma mais, digamos, midiática, ou pelo menos politicamente incorreta, o que muito já se comentou na imprensa nacional e internacional sobre o efeito que o tumor na laringe do ex-presidente terá sobre a vida política brasileira.
Vide a recente reportagem da principal revista de econômica e política do mundo, a The Economist, sobre as implicações políticas do diagnóstico de Lula, na qual se diz que “as palavras que ele proferir serão difíceis de ignorar. O sentimento de solidariedade com ele dará mais peso às suas indicações de candidatos e pedidos de unidade na coalizão”.
Devoção e mistificação
“Ele vai fazer o que quiser com o PT e com o Brasil”, disse ainda José Nêumanne, prevendo que Lula se tornará um colosso político ainda maior depois da cura, desfecho bastante provável do tratamento do ex-presidente, segundo os médicos.
Tais afirmações de José Nêumanne têm como substrato a suspeita de que Lula e seu círculo político não se farão de rogados para usar a sua luta contra o câncer a fim de tentar fazer aumentar a devoção à sua figura. Para alguns, o estratagema já está em curso, tendo começado mais exatamente quando o ex-presidente apareceu em um vídeo gravado no hospital Sírio-Libanês, após a primeira sessão de quimioterapia, para agradecer “a solidariedade e o carinho do povo brasileiro” e para dizer que a luta contra a doença “não é a primeira nem última batalha” que ele irá enfrentar.
No vídeo sobre o câncer, falou o político messiânico: “Não existe espaço para pessimismo, para ficar lamentando que o dia não foi bom. Sem perseverança, sem muita persistência, sem muita garra, a gente não consegue nada. Nós temos que lutar. Foi para isso que eu vim, para lutar, para melhorar a vida de todo mundo”.
O mistério do mindinho
A dita devoção a Lula foi construída, sim, com um carisma que o faz quase que imantado, mas também com boas doses de mistificações que foram se criando em torno de sua história de vida e de sua vida política.
Acerca de tais mistificações, o próprio Nêumanne questiona a história que Lula conta sobre a perda do dedo mindinho da sua mão esquerda. Segundo o ex-presidente, ele estaria trabalhando no torno quando um colega bêbado chegou e prensou seu dedo. Lula teria sido obrigado a seguir trabalhando porque o patrão não o teria deixado ir ao médico. Quando finalmente chegou ao pronto-socorro, depois do expediente, o plantonista teria amputado seu dedo por puro comodismo.
“Aí, eu pergunto: quem era esse bêbado? Quem era o patrão? Quem eram esses amigos? Quem era o médico? Ninguém sabe!”, disse Nêumanne em sua noite politicamente incorreta em São Paulo.
A mesma noite na qual ele levantou a bola de que o Lula de câncer curado, será o novo “Padim Ciço”, como diz a gente pobre do sertão. E completou: “É a mesma história das outras contadas pelo Lula:<b> ele sempre é o herói e sempre tem um filho da p… para atrapalhar”.
Caso se confirme o cenário de uso político do câncer de Lula pelo próprio doente, algo como uma volta por cima “como nunca antes na história deste país”, o ex-presidente estará legitimando por completo as campanhas que surgiram desde o seu diagnóstico pedindo que ele trate seu tumor pelo SUS, e não no Sírio-Libanês – campanhas diante das quais muita gente se escandalizou, exatamente por não admitir a mistura de Lula com Luis Inácio, ou seja, da política com a doença.
Hugo Souza, 1/12/2011
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"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)
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