Argumento embasou condenações e ajuda a decidir destino de Dirceu
BRASÍLIA — A teoria do domínio do fato, uma das mais temidas fórmulas de responsabilização criminal em processos com vários réus, serviu de referência a votos de condenação proferidos nos últimos dias pelos ministros Celso de Mello, Rosa Weber e Luiz Fux no julgamento do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF). De origem alemã, a tese poderá definir o destino do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu.
A teoria está na base do pedido de condenação do ex-ministro formulado pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, no primeiro dia do julgamento.
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Nos últimos dias, O GLOBO conversou sobre o assunto com cinco ministros do STF. Nenhum quis antecipar o voto, mas quatro deles entendem que a teoria, embora pouco difundida no país, está contemplada no direito brasileiro e pode ser aplicada dos casos mais simples aos mais complexos.
— Essa teoria tem, sim, acolhida no direito brasileiro. Inclusive já foi usada em alguns casos. Mas eu nem posso falar muito sobre ela porque os advogados já estão se preparando defesa sobre esse assunto — disse um dos ministros.
A teoria do domínio do fato surgiu na Alemanha no final da década de 30 e foi atualizada depois por Claus Roxin na década de 60. Segundo o advogado Nilo Batista, um dos maiores especialistas do país, a teoria foi aperfeiçoada para assegurar a punição dos chefes das tropas de Hitler e dos oficiais envolvidos no assassinato de fugitivos do Muro de Berlim.
Pelas leis comuns, só os soldados, que estavam na linha de frente e atiravam contra os fugitivos, eram passíveis de condenação. A teoria do domínio do fato permitiria a responsabilização criminal de coronéis e oficiais que, mesmo não estando no front, tinham o poder de impedir os crimes com uma simples ordem aos soldados de plantão.
Logo depois, a teoria começou a ser usada para punir chefes das máfias italianas e outras organizações criminosas, sob a mesma lógica. Os chefes quase nunca deixam digitais nos crimes cometidos pela base das quadrilhas. Restaria ao Estado, a responsabilização indireta.
No voto, a ministra Rosa Weber sustentou que “nos crimes de guerra punem-se, em geral, os generais estrategistas, que desde seus gabinetes planejam os ataques, e não os simples soldados que os executam”.
A ministra fazia referência à ideia central da teoria, que prevê a responsabilização criminal do chefe de uma organização, mesmo que ele não apareça na cena do crime. É o que os alemães chamam de “o autor por detrás do autor”.
A partir de amanhã, o relator Joaquim Barbosa começa a narrar os crimes atribuídos aos políticos da suposta organização, entre eles José Dirceu, colocando na mesa a discussão sobre autor, mandante e autor por detrás do autor.
Numa entrevista ao GLOBO na sexta-feira, o ministro Marco Aurélio disse que nem considera mais a teoria do domínio do fato uma novidade. Segundo ele, as linhas gerais da teoria estão previstas no artigo 29 do Código Penal.
O artigo define como autor todo aquele que, de forma direta ou indireta, participa de um ou contribui para um determinado crime. Ele argumenta, porém, que em qualquer dos dois casos, a condenação depende de um conjunto de provas ou indícios e não de uma mera dedução do juiz:
— Você tem que ter um elemento concreto que revele a participação ou a integração à quadrilha. Ou então a participação considerando o crime, no caso do José Dirceu, de corrupção ativa.
De início a fala de um co-réu não serve à condenação. Roberto Jefferson é co-réu, mas é um elemento que não se pode descartar. Você tem que somá-lo a outros para concluir pela culpabilidade ou não.
16 de setembro de 2012
Jailton de Carvalho
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