A menos de um mês da eleição dos novos quadros de vereadores das 5.565 cidades brasileiras é recomendável a sociedade refletir sobre o perfil das câmaras municipais do país, traçado em reportagens publicadas pelo GLOBO esta semana.
Mais do que preocupar, ele assusta: as Casas legislativas mais próximas do eleitor são uma máquina dispendiosa e nebulosa, e com indicadores de produtividade irrisórios, quando é possível calculá-los.
Em 2011, essa máquina custou ao país quase R$ 10 bilhões. São cinco orçamentos anuais do Ministério da Cultura e cerca da metade de um Bolsa Família. Pior: este valor corresponde apenas às despesas declaradas.
Isso quer dizer que pode ter sido ainda maior a conta paga ano passado pela sociedade para manter um Poder sem transparência e extremamente suscetível à corrupção. Em 2013, certamente o dispêndio será mais alto, em razão do aumento do número de vagas para vereadores e dos reajustes dos subsídios dos representantes.
Quando se desce a detalhes desse gasto chega-se a números absurdos. Segundo a ONG Transparência Brasil, cada um dos 51 representantes do Rio custa ao Tesouro R$ 7,8 milhões por ano, levando-se em conta a relação entre orçamento da Câmara Municipal e número de vereadores. Não à toa, a Casa é historicamente chamada de Gaiola de Ouro. Em São Paulo, a despesa é maior: R$ 8,5 milhões anuais por cada um dos 55 donos de assento no Legislativo da cidade.
A relação varia nos municípios, mas, em geral, a contrapartida em serviços para a comunidade, quando não é nula, é desconhecida. Isto porque a maior parte das Câmaras se dedica a produzir leis de quase nenhuma aplicação prática.
E quando o cidadão procura medir a produtividade de seu representante esbarra em mecanismos que lhe fecham as portas, em lugar de facilitar o acesso a informações. Não é exagero dizer que o Legislativo municipal é o poder menos transparente do país.
A multiplicação e a descaracterização do papel das câmaras não deveriam ser um fenômeno de causa e efeito. Mas, na prática, é como se o fosse.
A Constituição abriu espaço para a proliferação de prefeituras — a maioria sem condições de se manter com as próprias receitas. Daí para o empobrecimento da representação política foi um passo, e dessa equação decorreu uma farra com dinheiro público. Depois, a indústria de prefeituras foi contida, mas já era tarde.
Mesmo que os municípios respeitem a Lei de Responsabilidade Fiscal, mantendo os gastos com o Legislativo dentro dos parâmetros, é preciso relativizar. A relação custo-benefício desse sorvedouro é ruinosa.
Moralmente condenável, esse perfil atenta contra o princípio da representatividade, essencial para o estado democrático de direito, pois os absurdos induzem o cidadão a tachar esse Poder de supérfluo — uma perigosa distorção da importância do Legislativo.
12 de setembro de 2012
Editorial de O Globo
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