É impossível pensarmos em uma Venezuela após a morte de Hugo Chávez sem compreender que seu legado simbólico balizará tudo. Antes de terem sido postas em prática suas políticas públicas de amparo, conhecidas como missões sociais (como a Boves, Sucre, Miranda e Bolívar), os royalties do petróleo concentravam 80% do PIB em menos de 20% da população.
Após treze anos de governo e as camadas mais pobres do país vivem melhor e tornam-se reserva eleitoral perene. Mudou o Estado e a sociedade.
Mudaram o Estado e sociedade através do método chavista, que traz em si a contradição. Aposta na constitucionalidade possível, apesar de haver entrado na política originalmente pela força.
A eleição de 1998 transforma em presidente o ex-golpista de fevereiro de 1992 que era herói nacional. Desde então Chávez enfrentou dois golpes de Estado (abril de 2002 e o locaute petroleiro na virada daquele ano), algumas eleições (quatro presidenciais) e referendos.
Na urna o caudilho falecido venceu quase tudo, sendo que na última conseguiu ganhar sem chegar a tomar posse. Internado em Cuba para tratamento de câncer, seu vice, Nicolás Maduro, assumiu de forma provisória.
Agora, mais que nunca, a sobrevida do sucessor implica na difícil coesão do partido chavista (PSUV) e na lealdade dos altos mandos militares. O risco de virada de mesa é real, mas não para logo.
O mais provável é que Maduro cumpra os prazos constitucionais, convoque eleições para presidente e ganhe de forma esmagadora. A oposição, ou as oposições, são uma rara mescla de cadáveres políticos do período oligárquico (conhecido como Pacto de Punto Fijo) e algumas estrelas em ascensão, como o ainda jovem Enrique Capriles, este também envolvido nas conspirações anteriores.
O grave problema para a continuidade do processo bolivariano é a luta interna chavista. Qualquer pessoa com contatos na base de movimentos sociais, como meios alternativos e comunitários, movimentos indígenas e afros, bairros bravos de Caracas como o 23 de Enero e a zona de Petare, além do pouco de sindicalismo classista que há, sabe o tamanho do abismo ideológico.
A liderança política é pouco afeita à democracia interna e dependia basicamente das relações com o Palácio Miraflores, ou junto ao próprio Chávez. Sem o líder carismático, a tendência no médio prazo é a fragmentação.
Até Maduro ser reeleito valerá o lema de Unidade e Disciplina. Na metade de seu governo, veremos o que há de organização social para levar adiante o legado de Chávez.
07 de março de 2013
Bruno Lima Rocha é cientista político
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