Ô gente chata! Chata e, eventualmente, mau caráter — na hipótese de que não padeça de analfabetismo funcional. Foi a VEJA chegar às bancas e aos assinantes com Daniela Mercury e sua “esposa”, Malu Verçosa, na capa para que começasse a patrulha: “E agora? Você vai continuar a escrever seus textos em defesa de Feliciano?”. Ora… Em “defesa de Feliciano” uma ova! Em defesa da democracia, do estado de direito e contra a intolerância! Vamos começar do começo.
E, no começo de tudo, cabe uma observação. Se eu discordasse da VEJA nesse caso — e é prudente que se leia a reportagem, que não faz proselitismo; muito pelo contrário —, não seria a primeira vez.
Já escrevi isto e repito: os meus pontos de vista não podem ser atribuídos à revista, ainda que haja mais convergência do que divergência. Alguns tontos estão acostumados ou a um partido político de corte ainda leninista, em que só se pode pensar como ordem unida, ou às confrarias de bebuns de boteco, quando, na penúltima dose, todos concordam porque já não se lembra mais o tema em questão.
A revista não é assim. As coisas que escrevi sobre aborto, aborto de anencéfalos ou pesquisas com embriões humanos, para citar alguns exemplos, são opiniões minhas, só minhas. A VEJA não tem nada com isso. Já observei isso aqui umas 300 vezes.
Ocorre que, no caso da união gay, não há discordância nenhuma em essência. Eu sou favorável ao casamento gay. Fui mais longe aqui em 18 de março de 2009 e defendi a adoção de crianças por homossexuais. E isso não quer dizer que eu concorde, porque não concordo, com o que chamo “sindicalismo gay”, seus métodos e sua campanha “evangelicofóbica” ou “cristofóbica”.
Não escrevo para agradar, não! Aliás, quem escreve só para ser aplaudido pelos grupos de sempre é prosélito de causa política. Prefiro me dedicar a esse ofício para incomodar mesmo, para causar desconfortos. Considerando o número de visitas deste blog, acho que os leitores gostam do debate. Reproduzo alguns trechos do post a que me refiro acima — nem se falava, então, de Marco Feliciano, e Jean Wyllys ainda não era o Schopenhauer das redações (em azul). Volto em seguida.
(…)
Há o que não se pode escolher. Ninguém é gay porque quer. E também não pode deixar de ser gay ainda que queira. Hetero e homossexuais podem ser decentes e indecentes, morais ou imorais, promíscuos ou comportados, bons e maus pais e mães…
Como o segredo de aborrecer é dizer tudo, vamos lá: creio que casais heterossexuais, desde que ajustados (porque os há monstruosos, não é?) e com as devidas condições, devam ter a preferência na adoção. E a razão é simples: a criança terá certamente menos explicações a dar. Não vislumbro a possibilidade de que uma família de dois pais ou de duas mães venha a ser considerada coisa tão corriqueira quanto a do casal heterossexual.
Mas a possível estranheza de um casal gay, para a criança, é o menor dos problemas se a alternativa é permanecer em alguma instituição, sem afeto, sem atenção, sem cuidados. Homossexualidade “não pega”. E heterossexualidade também não — ou a esmagadora maioria dos gays não viria de lares heterossexuais.
“Então nisso você não está coma a Igreja?” É, não estou. Até já deixei de fazer certas coisas por fidelidade à Igreja. Mas jamais deixei de dizer o que penso. Não conheço uma interdição explícita à adoção, mas não ignoro que essa família a que não me oponho é reprovada pelo Vaticano. Exponho-me à reprovação. Só peço a delicadeza que não igualem uma questão como essa ao aborto, por exemplo.
Note-se: crianças abandonadas, no Brasil, são um verdadeiro flagelo social. Os orfanatos estão cheios. Parece que as famílias tradicionais não têm acorrido em seu socorro em número suficiente. Não posso crer que seja um ato de amor impedir que dois homens ou duas mulheres — dotados das devidas condições psicológicas, morais e financeiras — as adotem. Nesse caso, essa é minha escolha moral. E não me parece generoso, ademais, que uma pessoa impedida de escolher a sua sexualidade também seja impedida de ser feliz ao lado de quem ama.
Pronto! Lá vem a pancadaria!
Voltei
E veio pancadaria adoidado! Como acho o PLC 122 (a tal Lei Anti-Homofobia) uma aberração jurídica; como acho que o STF violou a Constituição ao igualar os casamentos hetero e homossexuais (ainda não tinha se pronunciado quando escrevi) e como estou apontando a campanha fascistoide de que o deputado Marco Feliciano é vítima, estou acostumado a levar porrada da militância gay e dos oportunistas que adoram pegar carona em “causas”. No caso do texto de 2009, levei pancada dos cristãos também. A minha tarefa é escrever o que penso, não o que os outros pensam. Sou pago pra isso — e me considero um homem de sorte.
Assim, voltando à questão da capa da VEJA, não só não há discordância como tratei de outro aspecto que reconheço delicado, espinhoso, que não está contemplado na reportagem — porque o foco era mesmo outro.
Estranhamento
O que causa certo estranhamento é que concilio essas minhas opiniões com outras aparentemente contraditórias. E poucos se dão conta de que, na minha concepção, a liberdade ocupa, na construção e na manutenção da democracia, um lugar superior ao da justiça. Com a primeira, pode-se conquistar a segunda. Nos regimes autoritários, com frequência, em nome da segunda, mata-se a primeira.
Os gays têm o direito de reivindicar que não haja distinções entre um casamento e outro, mas há quem seja contrário porque se trata de uma instituição social e de uma forma encontrada pela sociedade para organizar a família. Acho que ninguém duvida de que se trata de uniões distintas. É perfeitamente possível se opor à equiparação sem que, por isso, o crítico seja homofóbico. Um milhão de pessoas foram às ruas em Paris contra a legalização do casamento gay. Tudo aquilo era “homofobia”? Havia, acreditem, homossexuais contra a proposta.
Demonizar um deputado, tentar arrancá-lo de uma função para a qual foi eleito democraticamente, falar mesmo em cassar o seu mandato, tudo isso porque ele se diz contrário ao casamento gay ou porque acha que o certo é homem fazer sexo com mulher? Aí não dá! Como não dá para impor às religiões uma pauta. Como não dá para impedir que religiosos se elejam para o Parlamento. “Ah, mas o estado é laico!” Sim, o estado é laico, mas não é oficialmente ateu nem reprime a expressão da religiosidade. Que é que há?
Movimento gay quer cuidar até da educação!
O sindicalismo gay tem de aprender a conviver com a maioria, assim como a maioria tem aprendido a conviver com os gays. Lembrem-se dos famigerados kits preparado para as escolas. Não é possível que o movimento gay reivindique também a condição de educador das crianças. Aquele material que foi produzido e vetado por Dilma era uma coleção de despropósitos, de asneiras mesmo!
No entanto, a tal militância insiste em levá-lo às salas de aula, como se o debate sobre a tolerância só pudesse ser feito a partir da ótica do que se quer, e eventualmente é, oprimido. Errado! Estupidamente errado! O debate sobre a tolerância tem justamente de transcender os particularismos. Educação não é proselitismo.
Há uma larga, uma gigantesca diferença, entre debater a igualdade, então, de direitos civis e pretender instituir uma nova moralidade a partir de um ponto de vista que é e será sempre minoritário.
Os tontos podem tirar seu cavalo da chuva. A reportagem de capa de VEJA não me constrange minimamente, como evidencia o arquivo deste blog. Em essência, concordo com o que está lá.
E continuarei a combater o PLC 122 e os kits gays nas escolas.
E continuarei a combater o PLC 122 e os kits gays nas escolas.
E continuarei a defender o direito que parlamentares e religiosos têm de expressar seu ponto de vista.
E continuarei a chamar de fascistoides as manifestações contra Feliciano na Câmara ou à porta das igrejas em que ele prega.
E continuarei a discordar de Feliciano.
E continuarei a chamar de linchamento o que boa parte da imprensa vem fazendo com ele.
E continuarei a sustentar que a causa gay está sendo manipulada por espertalhões interessados em transformar a democracia refém de grupos organizados.
Não devo satisfações a aiatolás e a aiatolulas!
07 de abril de 2013
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