Na segunda-feira, 15, quatro dias antes de ser publicada a lista anual da revista Time com os nomes das 100 personalidades mais influentes do mundo - sempre aguardada nos quatro cantos do planeta com enorme e justa expectativa, apesar dos disfarces - um acaso me levou ao Canal Brasil, na rede privada de TV, que apresentava a primeira das duas partes do programa Espelho, conduzido por Lázaro Ramos.
Cheguei em cima da hora, mas a tempo de ver e me emocionar, como há muito não acontecia, com a produção da TV brasileira digna de ser inscrita a prêmio, desde já, entre as melhores de 2013. Aguardo a parte final, no começo da próxima semana, para confirmar a grata impressão com o conjunto da obra de arte e jornalismo.
Na frente do “espelho” apresentado em rede nacional, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa. Ele sim, em carne, osso e toda complexidade de sentimentos pessoais. O grande destaque do País e da América Latina na seleta e prestigiosa lista da revista norte-americana, apresentado como “o juiz brasileiro do Mensalão”. No programa ele foi muito mais que isso simplesmente.
Vale assinalar, diante da seleção de Time, que Barbosa assume o lugar frequentado até recentemente pelo ex-presidente Lula, ou pela atual ocupante do Palácio do Planalto, Dilma Rousseff. Na lista deste ano, os dois ficaram de fora, embora o Brasil tenha dois nomes entre os mais influentes, segundo a Time. O outro é o gourmet Alex Atalla, de São Paulo.
Lázaro, o mestre de cerimônia, por si só, é sempre uma atração especial, em qualquer cenário onde esteja: Uma das melhores aparições do palco e da tela na Bahia, ao lado de Wagner Moura, nas últimas duas décadas. Consagrado nacionalmente no teatro, cinema e televisão.
No mais recente Espelho, porém, o ator baiano teve diante de si um personagem invulgar e impressionante. Sentado enquanto aguentou a tortura das alfinetadas na coluna, que os rictos da face revelavam a cada instante nos flagrantes da câmera. Ou de pé, apoiado nos braços da poltrona presidencial, quando as dores tornaram-se insuportáveis.
Impressionante é mesmo a palavra. Tanto no campo específico de atuação do ministro, a Justiça, quanto no terreno profissional do grande ator que o entrevistava. Na verdade, um modelar, emblemático e brilhante exercício da arte da conversa e do entendimento pessoal e político entre pessoas civilizadas e verdadeiramente democráticas.
Algo cada vez mais raro de se ver, principalmente na Brasília que aniversaria neste domingo, 21, ocupada pelo desvairado pastor deputado Feliciano, eleito pela maioria de seus pares e partidos, para presidir a Comissão de Direitos Humanos do Congresso Nacional.
Na tela, o artista com pleno domínio do palco e da cena – embora às vezes precisando medir em excesso as palavra, para não mexer demais nas dores da alma do entrevistado, evitando assim colocar a prosa em risco insuperável. À frente do apresentador, o ministro presidente da suprema corte do País.
Claramente, ”um tipo sisudo, trancado e de pouca conversa”, como ainda se costuma dizer nas barrancas do São Francisco, o rio da minha aldeia. Mas com a força inegável dos grandes personagens no gestual e nas palavras.
O primeiro Espelho da série TV Brasil mostrou, principalmente, a figura de Joaquim Barbosa em seus labirintos humanos, desde a infância. Um tímido consumado.
Mas do tipo que adora viajar e tem nas viagens o seu confesso hobby principal, seguido da música popular e erudita e da leitura de autores como Lima Barreto (“meu autor preferido") e Machado de Assis. Um cidadão do mundo, que assume ter sido um roqueiro na juventude. “Afinal, eu vivo há muito tempo em Brasília”, acrescenta o magistrado a título de explicação.
E então, um momento especialmente pungente entre outros do breve programa: o entrevistado fala da primeira escola pública em que estudou na cidade natal, o desvelo da mãe, os altos e baixos do pai e da família em Minas Gerais.
A opção por Brasília, quando tudo degringola, em lugar de Belo Horizonte, para seguir os estudos até chegar à Universidade (UNB). De pé, o ministro Barbosa fala da opção pelo Direito, como carreira: “Pensei até em ser ator, e acho que poderia ter sido um ator razoável, se tivesse tido os meios na época, mas nunca tive a menor dúvida de que era isso, a justiça, o que eu sempre quis”.
Então outra intervenção de Lázaro Ramos, que apanha o ministro Joaquim Barbosa com a guarda aberta, e que produz a cena que por si só valeria um programa inteiro.
“Mas o ministro sabe que tem presença cênica?”, diz o ator baiano, meio constatando, meio interrogando, e acrescentando que se vê representando um filho do entrevistado em um palco.
“Mesmo? Veja só!”, balbucia o tímido Joaquim, sem esconder o contentamento e a emoção à flor da pele.
Bonito de ouvir, e, principalmente, de ver. Ajuda também a entender a presença do nome do ministro Joaquim Barbosa no ranking das pessoas mais influentes do mundo, divulgado esta semana pela Time.
Pena que o clima é quebrado , de repente, com um “volte na próxima semana”. Ainda assim, palmas para este Espelho de Lázaro e Joaquim.
20 de abril de 2013
Vitor Hugo Soares, jornalista, edita o site blog Bahia em Pauta, em Salvador.
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