Ministros divergiram sobre recurso de réus a órgão da OEA. Para Celso de Mello, Brasil seguiria Corte; Barbosa vê ‘mambo jambo'
Durante o julgamento do mensalão, os ministros do Supremo Tribunal Federal discutiram se, em caso de recursos dos réus a cortes internacionais, o Brasil teria ou não de seguir eventual decisão reformando condenações. Para o ministro Celso de Mello, os réus condenados no processo do mensalão têm o direito de recorrer à Comissão Interamericana de Direitos Humanos para tentar mudar a decisão. Caso o órgão revogue as condenações, o Brasil terá de cumprir a determinação.
O entendimento de Celso de Mello foi registrado na sessão de 15 de agosto de 2012, durante o julgamento, e comporá o acórdão do mensalão. Outros ministros acreditam, no entanto, que não há possibilidade de a instância internacional anular a decisão do Supremo, por considerar que não houve violação de direitos dos réus.
“Retórica processual”
O ex-ministro da Casa Civil José Dirceu já manifestou interesse em apelar ao órgão internacional. Ele foi condenado a dez anos e dez meses de prisão por formação de quadrilha e corrupção ativa.
— Nada impedirá que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, sediada em Washington, esgotada a jurisdição doméstica (ou interna) e atendidas as demais condições estipuladas no Pacto de São José, submeta o caso à jurisdição contenciosa da Corte Interamericana de Direitos Humanos, em ordem a permitir que esta exerça o controle de convencionalidade — defendeu Celso de Mello, em agosto.
Os demais ministros não concordaram. O primeiro a se opor à tese foi o relator do processo e atual presidente do STF, Joaquim Barbosa.
— Justiça que se preza não se submete, ela própria, a órgãos externos de natureza política. E a Comissão o é — afirmou.
Depois, Barbosa arrematou:
— Tive o cuidado de trazer tudo, quase tudo a este plenário, exatamente para evitar esse tipo de “mambo jambo”, não é?
O ministro Gilmar Mendes registrou sua opinião contrária aos recursos ao órgão da Organização dos Estados Americanos:
— Raramente teve-se um processo com tal cuidado de observância do devido processo legal. Quer dizer, o recurso à Corte Interamericana, vamos reconhecer, é um recurso de retórica processual.
Mas Celso de Mello ressaltou que o Brasil, como signatário do Pacto de São José da Costa Rica, tem a obrigação de se submeter às decisões do órgão internacional:
— Não custa relembrar que o Brasil, apoiando-se em soberana deliberação, submeteu-se à jurisdição contenciosa da Corte Interamericana de Direitos Humanos, o que significa que o Estado brasileiro comprometeu-se, por efeito de sua própria vontade político-jurídica, ‘a cumprir a decisão da Corte em todo caso’ de que é parte — afirmou.
Pedido de suspensão negado
A discussão foi provocada por questão preliminar levantada pelos advogados dos réus Breno Fischberg e Enivaldo Quadrado, sócios da corretora Bônus Banval, que acabaram condenados por lavagem de dinheiro. Os dois queriam a suspensão do julgamento, alegando que o STF deveria esperar o resultado da denúncia deles à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, por cerceamento de defesa. O pedido foi negado por unanimidade.
Luiz Fernando Pacheco, advogado do deputado José Genoino (PT-SP), disse que a possibilidade de recorrer à OEA será analisada somente depois que o STF julgar embargos de declaração e embargos infringentes. Genoino foi condenado a 6 anos e 11 meses de reclusão por corrupção ativa e formação de quadrilha.
—Há possibilidade de recursos para as cortes internacionais. Não conseguindo reverter no Supremo, avaliaremos, estamos estudando ir à OEA. A possibilidade não está descartada nem definida — afirmou Pacheco.
20 de abril de 2013
Carolina Brígido e André de Souza - O Globo
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