A popular expressão é geralmente usada para traduzir bagunça, caos, falta de bom senso. O que dizer, porém, quando o título deste artigo aponta para um dos três Poderes da República? E se este for o Judiciário, considerado o mais sagrado por abrigar a função de distribuir a justiça?
Pois essa é, infelizmente, a impressão causada pela acusação que as três principais entidades de juízes fizeram ao presidente da Corte Suprema do país, ministro Joaquim Barbosa, a quem acusam de agir de forma antidemocrática, “desrespeitosa, premeditadamente agressiva, grosseira e inadequada para o cargo”.
Sem papas na língua…
O destampatório adjetivado lapidou uma resposta a Barbosa, que, ao receber os presidentes das entidades que representam a magistratura, insinuou que juízes saem com pires na mão em busca de promoção na carreira, chamou de “líder sindical” um deles e acusou-os de atuar de maneira sorrateira para aprovar novos tribunais regionais federais, arrematando: “Os senhores não representam a nação, são representantes de classe. Não vim para debater com os senhores”.
O presidente do STF é uma figura sem papas na língua. Ao correr da história do Judiciário, nunca a locução que emana da cúpula e de suas bases chegou a patamar tão baixo. A linguagem de feição grotesca, que passou a ser ouvida nos (ex-)solenes ambientes do Judiciário, tem que ver com a intenção desse Poder de se aproximar da sociedade. Mesmo assim, causa surpresa o destempero verbal de atores a quem cabe interpretar as leis e contribuir para a harmonia social.
A liturgia do poder, que tem na palavra um dos seus eixos, está em descenso. Ela confere a mandatários o cetro da autoridade.
A ÍNDOLE DA FALA
A palavra carrega o dom de desvendar a condição do interlocutor. Retrata a índole da fonte, deixando ver o território em que atua. As circunstâncias propiciam a nobres e plebeus falar de coisas comuns. Sob essa perspectiva, altos dignitários, em instantes de descontração, chegam a empregar expressão menos pomposa.
Do alto de sua autoridade, o ministro Joaquim Barbosa não é obrigado a discorrer em juridiquês durante o tempo todo, da mesma forma que a presidente Dilma deixa de lado o politiquês ou o governês para apresentar sua receita de omelete no programa de Ana Maria Braga.
Os problemas ocorrem quando o verbo ultrapassa o limite de educada conjugação. Ou seja, quando mexe com os brios de outros, gerando prejuízo ético/moral. Ou quando adentra “o perigoso terreno da galhofa”.
No mais, muitos oradores se esforçam para conferir eficácia à palavra, por saberem que ela tem o poder de cooptar, criar rejeição, exprimir autoridade e buscar a conformidade social. Lula também é afeito à palavra que cala fundo. Às vezes, exagera na dose. Uma das suas:
“O vermelho da bandeira do partido é a cor do sangue de Cristo”.
No Judiciário, a ex-corregedora Eliana Calmon não escapa à linguagem ferina: juízes “decentes” não podem ser confundidos com “meia dúzia de vagabundos”.
Churchill dizia: “Somos mestres das palavras não ditas, mas escravos das que deixamos escapar”.
21 de abril de 2013
Gaudêncio Torquato
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