O episódio em que o Coronel Ustra compareceu diante dessa CNV me fez lembrar do saudoso general Sylvio Frota, que no excelente “Ideais traídos”, lembra dois fatos, dos seus tempos de Realengo, para mostrar que “Era um Exército admirável! Amalgamados pela solidariedade militar e o espírito de classe, chefes e subordinados estavam sempre juntos nos cruciais momentos em que os brios da instituição eram feridos”.
Ao término do ano letivo de 1931, ou talvez no início do seguinte, um cadete de Artilharia cometeu transgressão disciplinar grave e passível de desligamento da Escola. Ocorre que os fatos não estavam bem esclarecidos e o cadete foi tão veemente sua negativa que companheiros de Arma intercederam junto aos oficiais por considerarem uma injustiça.
Mantido o desligamento, iniciou-se um movimento de solidariedade por alguns colegas e amigos do cadete que foi crescendo até se transformar em um “espetáculo grandioso, censurável do ponto de vista disciplinar, mas, inegavelmente, soberbo quando se pensa em coesão de uma classe: todos os cadetes, tranquilamente, sem gritos de histérica euforia nem semblantes de falsa tristeza, por dever de consciência, formaram para o desligamento. O bom senso, no entanto, conteve os ímpetos de prepotência e o aluno, pomo da discórdia, foi perdoado, voltando a Escola à normalidade”.
O segundo foi o empastelamento do Diário Carioca, em fevereiro de 1932 provocado pela sistemática campanha de difamações e injúrias lançadas sobre o Exército com artigos virulentos contra os integrantes das Forças Armadas. Face à inação do governo, oficiais do Exército reuniram-se no Clube Militar (para os novos: Clube Militar era o que é hoje o Círculo Militar da Guarnição do Rio de Janeiro) e ficou decidido que “à primeira publicação ultrajante o Diário carioca seria empastelado”. E, não deu outra: ao primeiro artigo injurioso, os oficiais convergiram para o ponto de reunião marcado no 1º RCD, em São Cristóvão. E o jornal foi empastelado “com ímpeto e agressividade que tocavam as fímbrias do desatino”.
Após estes gravíssimos eventos o ministro da Justiça (Maurício Cardoso), acompanhado do chefe de Polícia (Baptista Luzardo), procurou o ministro da Guerra (Gen. Leite de Castro) para protestar contra esse ato de vandalismo praticado pelos militares. O general Leite de Castro “empertigou-se sobre as luzidias botas e respondeu em voz com voz firme e clara”: “Sr. Ministro! Esses oficiais fizeram o que eu teria feito, se ao menos vinte anos tivesse”.
Instaurado IPM para apurar responsabilidades, a grande maioria dos oficiais da guarnição se apresentou dizendo-se participantes das depredações e cada um levava o nome de uns dois ou três que haviam participado, muitos deles, de outras Regiões Militares o que exigiria a expedição de dezenas de cartas precatórias.
Até o encarregado do IPM (Cel. Moreira Lima) afirmou no Relatório ter estado entre os que foram lavar as injúrias assacadas ao Exército. Moveu a reação o sentimento de que o jornal não tinha o direito de difamar os militares e sua instituição acobertado na liberdade de imprensa.
Agora eu pergunto aos caríssimos amigos: Será que podemos afirmar que pertencemos a um exército admirável como aquele dos tempos da Escola do Realengo (sempre invejei meu pai por ter, ele, vivido naquela escola que forjava aquele EXÉRCITO INVEJÁVEL)?
Tivéssemos um exército daquele quilate, o nosso Comandante estaria na primeira fila daquela sala de audiência pública da CNV com a sala atulhada de militares fardados e à paisana e teria dito aquilo que o general Leite de Castro usou para rechaçar o protesto do ministro da Justiça: “Senhores, o Coronel Ustra fez o que EU e todos os oficiais aqui presentes teríamos feito se incumbidos da missão”.
Os tempos, no entanto, são outros, outro o exército que dispomos. Naqueles tempos a cadetada formou ao lado do companheiro, mesmo diante do risco de queimar a sua carreira.
Hoje, um general cinco estrelas, no fim da carreira, se apega à carreira mesmo com sacrifício da honra da instituição.
Presto minha continência ao Coronel Ustra e aos dois bravos companheiros que reagiram contra a atitude agressiva daquele vereador. Seguramente, fazem parte daquele Exército admirável, lembrado pelo saudoso general Frota, composto por gente de fibra que “Amalgamados pela solidariedade militar e o espírito de classe, chefes e subordinados estavam sempre juntos nos cruciais momentos em que os brios da instituição eram feridos”.
12 de maio de 2013
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