William Bonner levantou as sobrancelhas depois de ouvir Guido Mantega afirmar que a inflação do país não é generalizada, está concentrada nos alimentos e vai cair, "todo mundo sabe".
Possivelmente, foi apenas um recurso rotineiro do âncora para atrair a atenção e a empatia da audiência. Mas, dado o contexto, pareceu um sinal de incredulidade. Antes de levar ao ar a fala do ministro, o telejornal havia mostrado uma consumidora, um especialista e um punhado de números que diziam o oposto.
Economistas erram mais de 50% de suas previsões, o que, conforme a piada, torna sua ciência menos precisa que o cara ou coroa. É temerário, entretanto, imaginar que expectativas sejam irrelevantes. É com base nelas que industriais decidem investimentos e contratações, trabalhadores reivindicam salários, comerciantes reajustam preços.
Governos fazem gestos para, conforme o jargão, ancorar as expectativas. São palavras, metas, projeções e medidas destinadas a orientar os humores da audiência na direção desejada. Se a mensagem oficial tem credibilidade, tudo fica mais fácil: as decisões de empresários e consumidores convergem para o cenário traçado, num círculo virtuoso.
Com a freada da economia nacional e o insucesso dos sucessivos pacotes de estímulo à produção e ao consumo, a administração petista passou a colecionar palavras e medidas contraditórias, metas abandonadas, projeções desmoralizadas. Sem âncoras, expectativas à deriva tendem a agravar os danos.
A inflação esperada ignora a meta do Banco Central; as metas para as contas do Tesouro caíram em descrédito; as de crescimento foram abandonadas até por Mantega. Agora, são as previsões para a balança comercial e a dívida pública que ensaiam sair perigosamente do roteiro.
O otimismo renitente acaba sinalizando que nada será feito. Franzir a testa talvez fosse um começo.
12 de maio de 2013
Gustavo Patu, Folha de São Paulo
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