A tendência de proibir o financiamento por pessoas jurídicas ficou clara na audiênciapública em que o ministro Luiz Fux ouviu especialistas e representantes da sociedade civil a respeito do financiamento das campanhas eleitorais. Mas não há consenso sobre o financiamento público exclusivo, como propõe o PT.
Embora a proposta de sistema eleitoral do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), o mesmo que originou o projeto de iniciativa popular que resultou na Ficha Limpa, trabalhe com a lista fechada para indicação de candidatos com o objetivo de facilitar a adoção do financiamento público de campanha, ela tem como objetivo secundário criar as condições necessárias para proibir o financiamento por pessoas jurídicas.
Também o cientista político Geraldo Tadeu Monteiro, diretor do Iuperj, declarou-se contrário, afirmando que a livre ingerência de grandes empresas privadas no financiamento eleitoral no Brasil é nociva à democracia porque desequilibra a disputa e influencia largamente no resultado.
“As doações por pessoas jurídicas são um fator altamente potencial para a corrupção”, disse ele em sua apresentação. Monteiro lembrou que o país já restringe as doações de pessoas jurídicas (sindicatos, ONGs, Oscips, concessonárias etc.) e deveria adotar a proibição total, acoplada a outras medidas, como o estabelecimento de teto para gastos e doações, ficando com um sistema de financiamento eleitoral “mais justo”.
Segundo ele, os gastos das campanhas eleitorais saíram de cerca de R$ 800 milhões em 2002 para quase R$ 5 bilhões em 2012.
O juiz Márlon Reis, do MCCE, afirmou na audiência pública no STF que não é razoável imaginar que as empresas brasileiras estão “doando” dinheiro para as campanhas eleitorais.
Os grandes doadores são “apenas as empresas que integram um círculo restrito das construtoras, dos bancos e das mineradoras. Seriam esses segmentos empresariais os exemplos de “cidadania”? Todas as demais centenas de esferas de atividade empresarial não participam do financiamento de campanha, afirmou Márlon.
Esses setores que concentram as doações, ressalta, são exatamente aqueles que precisam manter estreitas relações com o poder público.
Pesquisa realizada pelo Kellogg Institute for International Studies demonstra que as empresas doadoras em campanhas eleitorais recebem, nos 33 primeiros meses após a eleição, o equivalente a 850% do valor doado em contratos com o poder público. “É um retorno de 850% em relação à doação, que devemos chamar, sim, de investimento”, afirma o juiz.
Especialistas também compararam as doações a um sistema de crédito para as empresas, que vão buscar a compensação mais tarde nos cofres públicos. Lucieni Pereira, auditora do TCU e presidente da Associação Nacional dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas do Brasil (ANTC), chamou a atenção para o que ocorre com a concessão de benefícios fiscais para atração de empresas, que seria ao mesmo tempo, segundo especialistas denunciaram na audiência do STF, mecanismo para atrair doações de campanha aos candidatos a governos estaduais.
O tema também é uma preocupação na esfera federal. Em 2012, a União concedeu benefícios (renúncia de receita) da ordem de R$ 216,5 bilhões, conforme gráfico extraído do parecer prévio das Contas do Governo da República emitido pelo TCU.
Lucieni diz que a União, na renegociação da dívida dos estados, quer, na verdade, alterar o artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal, que restringe a capacidade do governo de fazer concessões de benefícios fiscais como vem fazendo, sem a devida compensação, o que o TCU proíbe.
A alegação de excesso de arrecadação é o ponto polêmico da proposta, forma não incluída no rol das compensações previstas na Lei Complementar, pois pode-se ter excesso de arrecadação em um bimestre e mais adiante ocorrer alguma crise fiscal ou cambial, e o excesso não se confirmar em relação ao total da receita prevista no orçamento.
Por isso, o excesso de arrecadação não é adequado para compensar renúncia de receita, que tem impacto em vários exercícios, com um poder de desestruturar as finanças, inclusive de futuros gestores, explica Lucieni Pereira.
27 de junho de 2013
Merval Pereira, O Globo
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