O casamento e o vidro de palmito
CRISTIANE SEGATTO
Repórter especial, faz parte da equipe de ÉPOCA desde o lançamento da revista, em 1998. Escreve sobre medicina há 15 anos e ganhou mais de 10 prêmios nacionais de jornalismo. Para falar com ela, o e-mail de contato é:
cristianes@edglobo.com.br.
Um dos grandes sustentáculos do casamento, como instituição, é o vidro de palmito. Penso nisso sempre que tento preparar uma super salada num domingo de verão. Meu marido conhece o filme. Apoio o vidro num pano de prato, faço força para abrir a tampa, tento soltá-la com uma faca, levanto o lacre de borracha e... nada. Consigo fazer muitas coisas difíceis nesta vida sem pedir a ajuda dele. Abrir o vidro de palmito não é uma delas. Não sei se todas as mulheres têm a mesma dificuldade, mas lá em casa só o jeitinho masculino resolve.
Meu marido se diverte quando digo que a falta de inovação da embalagem de palmito deve ser patrocinada pelo Vaticano. Só um motivo muito forte explica por que até hoje a indústria não foi capaz de inventar um jeito mais simples de embalar palmito com segurança – sem disseminar doenças e sem atazanar as consumidoras.
Para preservar a instituição do casamento tradicional e da família, o Vaticano condena a camisinha. Suspeito que, pela mesma razão, estimule a preservação do vidro de palmito tal como ele é. Quando uma mulher analisa os prós e os contras do casamento, deve considerar o que seriam os domingos sem salada de palmito. Podem ser lastimáveis.
Lembrei dessa história ao ler um texto da psicóloga americana Bella DePaulo, publicado na última edição da revista Psychology Today.
Bella, autora de um interessante blog chamado Living Single, afirma que um dos maiores mitos sobre os solteiros é que eles estejam sempre – e desesperadoramente – tentando arranjar um parceiro.
Muitos solteiros querem mudar de estado civil, é claro. Mas essa não é necessariamente a regra. “Talvez mais pessoas estejam escolhendo ser solteiras porque simplesmente gostam disso”, escreve Bella.
“Atualmente um solteiro consegue levar uma vida completa e divertida como nunca antes”.
Em um dos textos postados no blog, Bella discorre sobre estudos que tentam associar o casamento a benefícios de saúde. Eles já deram origem a inúmeras capas de revista. Principalmente nos Estados Unidos, onde há um forte movimento que defende o matrimônio tradicional.
A verdade, porém, é que esses estudos quase sempre são inconclusivos. É difícil isolar fatores que têm influência sobre a saúde e podem levar os pesquisadores a interpretações erradas.
Bella analisou a fundo os estudos disponíveis e concluiu que as evidências científicas permitem dizer o seguinte:
• As pessoas que sempre foram solteiras não têm mais problemas crônicos de saúde que as casadas
• Mulheres que nunca se casaram declaram ter uma saúde tão boa quanto a das mulheres que se casaram e continuavam casadas no momento da pesquisa
• Ao contrário do senso comum, os homens menos saudáveis eram os que haviam se casado mais jovens
As consequências do casamento sobre a saúde dependem do tipo de relacionamento que o casal cultiva. Um casamento ou namoro infernal eleva os níveis de stress crônico e pode aumentar o risco de doenças cardiovasculares, por exemplo.
Se a pessoa vive numa relação harmoniosa, a saúde agradece. Isso é óbvio, certo? É daquelas explicações que a gente não entende por que os pesquisadores precisaram gastar tanto tempo e dinheiro para chegar a elas.
Outro ponto interessante levantado por Bella é que os solteiros convictos (não os que se incomodam com a solteirice) sabem apreciar alguns valores importantes que, em geral, não são percebidos como tal pela maioria das pessoas. É o caso da solidão. Saber valorizar os momentos de sossego, de silêncio, de estar consigo mesmo é um privilégio. Solidão pode ser algo tão importante quanto a sociabilidade.
Os solteiros convictos também sabem que relacionamento não é uma palavra restrita às relações românticas. Eles sabem valorizar os amigos, os parentes, os mentores, os vizinhos. A solteirice, portanto, pode ser uma decisão valorosa. É uma escolha que a sociedade precisa respeitar. Sem pressões, sem piadinhas, sem pena.
Quer saber se você, no fundo, no fundo é um solteiro convicto, mesmo estando casado ou namorando firme? Faça o teste proposto por Bella.
VOCÊ É UM SOLTEIRO CONVICTO?
1) Quando você sabe que passará algum tempo sozinho, o que pensa?
a) Ah, doce solidão.
b) Oh, solidão não.
2) O que você acha da ideia de procurar um parceiro para uma relação amorosa de longa duração?
a) Tem a sensação de que é o que deveria fazer, mas, sinceramente, não é bem o que gostaria de fazer.
b) O processo pode não ser muito divertido, mas encontrar um bom parceiro seria sensacional.
3) Quando você pensa em fazer uma grande mudança na sua vida (escolher uma nova carreira, por exemplo), o que você escolheria?
a) Tomaria a decisão que lhe parecesse certa, sem se preocupar se o parceiro iria ou não aprovar sua decisão.
b) Tomaria a decisão junto com o parceiro, mesmo que isso significasse não seguir sua opção favorita.
4)Muitos parceiros têm a expectativa mútua de estar junto com o outro em todas as ocasiões. Como você se sente em relação a isso?
a)Prefere ir a alguns eventos sozinho ou com outras pessoas. Ou simplesmente ficar em casa.
b)Sente-se confortável em ter o parceiro sempre com você, apesar de ser obrigado a comparecer a compromissos que preferiria não comparecer.
5) Quem são os adultos mais importantes da sua vida?
a) Um mix de amigos, familiares e colegas de trabalho.
b) O cônjuge ou parceiro de longa data.
6) Quando você tem vontade de comer fast food ou assistir a programas trash na TV, como você se sente.
a) Feliz por poder fazer exatamente o que sente vontade, sem ter ninguém por perto.
b) Preferiria ter o parceiro ao seu lado, tanto para curtir as delícias trash com você como para estimulá-lo a ter autocontrole.
7) Quando você pretende perseguir objetivos nobres, como comer comida saudável e ler grandes livros, o que você prefere:
a) Perseguir esses objetivos por conta própria ou com um amigo
b) Ter um parceiro para persistir no caminho certo
8) Quando você tem pequenos contratempos, como se sente:
a) Aliviado por não ter que explicar para ninguém como as coisas deram errado.
b) Gostaria de ter um parceiro para encontrar em casa e poder dividir o que aconteceu.
9) Você é autossuficiente? Costuma lidar com seus problemas e desafios quase sempre sozinho?
a) Sim.
b) Não.
RESULTADO
Conte quantas vezes você escolheu “a”
0 a 3: Você tem alguma apreciação pela solteirice, mas não está completamente convicto disso.
4 a 6: Você gosta de muitos aspectos da solteirice, mas também gosta de passar longos períodos com o parceiro. Quando está casado ou num relacionamento sério, prefere não estar totalmente misturado ao seu parceiro.
7 a 9: Você é um solteiro convicto.
Comigo o teste funcionou. Escolhi quatro vezes a alternativa “a”. Concordo com o diagnóstico. Gosto de muitos aspectos da solteirice. Tenho necessidade dos “meus” momentos, mas também preciso da companhia do meu parceiro. Ela é um privilégio. E não é só por causa do vidro de palmito.
Cristiane Segatto
Repórter especial, faz parte da equipe de ÉPOCA desde o lançamento da revista, em 1998. Escreve sobre medicina há 15 anos e ganhou mais de 10 prêmios nacionais de jornalismo. Para falar com ela, o e-mail de contato é:
cristianes@edglobo.com.br.
E você? É um solteiro convicto? Já teve um parceiro amoroso que, no fundo, era um solteiro convicto? O que aconteceu? De que forma o estado civil influencia nossa saúde? Conte pra gente. Queremos ouvir a sua opinião.
Um painel político do momento histórico em que vivem o país e o mundo. Pretende ser um observatório dos principais acontecimentos que dominam o cenário político nacional e internacional, e um canal de denúncias da corrupção e da violência, que afrontam a cidadania. Este não é um blog partidário, visto que partidos não representam idéias, mas interesses de grupos, e servem apenas para encobrir o oportunismo político de bandidos. Não obstante, seguimos o caminho da direita. Semitam rectam.
"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)
"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)
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