Os manifestos de Lomanto
31 de março de 1964, meia-noite. O Palácio das Laranjeiras era um pesadelo. As tropas de Mourão Filho avançavam de Minas e Jango não sabia o que fazer. Chegam o governador Seixas Dória de Sergipe e o ministro Osvaldo Lima Filho, da Agricultura. Jango se tranca com os dois:
- Seixas, preciso de um favor teu. Quero que pegues amanhã bem cedo um avião da FAB e sigas para o Nordeste colhendo assinaturas em um manifesto dos governadores que tu redigirás, em apoio a mim. Acabei de falar com o Lomanto pelo telefone. Ele me leu um manifesto de que gostei muito e já mandou para os jornais de Salvador, que publicarão amanhã. Passa na Bahia, articula-te com ele e vai procurar os outros.
***
SEIXAS
Seixas conhecia sua gente. Estava incrédulo:
- O senhor já conhece a posição dos outros?
- Todos me telefonaram hipotecando solidariedade integral.
- E o Virgílio?
- Virgilio não tem problema. É meu compadre duas vezes.
- E o Petrônio?
- Petrônio é firme. É um homem de esquerda, tem me estimulado.
Manhã cedo de 1º de abril, Seixas embarcou no avião da FAB. O governador Lomanto Júnior, da Bahia, que tinha combinado ir recebê-lo no aeroporto, lá não estava. No Palácio da Aclamação, cara de pânico, assombrado, Lomanto chamou Seixas a um canto:
- A situação virou, Seixas. Jango fugiu para Brasília, Arraes está preso, perdemos a parada. Eu tinha feito um manifesto de apoio a Jango ontem à noite, que o “Jornal da Bahia”, que é matutino, chegou a publicar.
Mas já assinei outro hoje de manhã e mandei para “A Tarde”, que é vespertino, divulgar. E a televisão e as rádios também. Este segundo está bom, como eles querem. Vou te dar uma cópia, para você chegar em Sergipe e lançar lá, que é batata. Aliás, foi redigido no comando da Região. Você pode ficar tranquilo. É só assinar, está seguro”.
***
LOMANTO
Seixas estava perplexo :
- Sim, Lomanto, mas eu não vou fazer uma coisa desta, não. Vou para Aracajú, vou lançar um manifesto, mas dizendo exatamente o que eu pensava até ontem. Quer dizer, o que eu e você pensávamos até ontem.
- Você está dizendo, no meu Palácio, que eu não tenho palavra?
- Não. Não estou dizendo que você não tem palavra. O que eu estou dizendo, Lomanto, é que você agora tem uma palavra diferente da minha.
Seixas foi para Aracajú, leu o manifesto, saiu do Palácio preso, foi mandado para Fernando de Noronha, onde já estava Miguel Arraes e depois chegaram Djalma Maranhão, prefeito de Natal, e Mario Lima, deputado socialista e presidente do sindicato dos Petroleiros da Bahia.
Lomanto foi ao “Jornal da Bahia”, recolheu o resto da edição, mandou queimar o primeiro manifesto e voltou para o Palácio tranquilo.
Sebastião Nery
25 de março de 2012
Um painel político do momento histórico em que vivem o país e o mundo. Pretende ser um observatório dos principais acontecimentos que dominam o cenário político nacional e internacional, e um canal de denúncias da corrupção e da violência, que afrontam a cidadania. Este não é um blog partidário, visto que partidos não representam idéias, mas interesses de grupos, e servem apenas para encobrir o oportunismo político de bandidos. Não obstante, seguimos o caminho da direita. Semitam rectam.
"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)
"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)
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