Em agosto do ano passado, VEJA publicou uma reportagem sobre uma patriotada do Apedeuta, que não naufragou por pouco, ao custo de R$ 336 milhões. E a conta pode custar muito mais do que isso. A presidente da Petrobras, Graça Foster, ainda que tenha dito e feito coisas acertadas sobre a Petrobras, revelou-se fã dessa política. Vejam este navio e leiam o texto seguinte.
A foto acima, de 7 de maio de 2010, retrata uma cena explorada à exaustão na campanha de Dilma Rousseff. Com pompa e circunstância, o então presidente Lula, com Dilma no palanque, exibia no Porto de Suape, em Pernambuco, o primeiro navio petroleiro construído no Brasil em catorze anos.
Tudo teatro eleitoral. Tão logo a platéia se foi, a embarcação voltou ao estaleiro e de lá nunca mais saiu.
O que poucos sabiam até agora é que o vistoso casco do João Cândido - um portento planejado para transportar 1 milhão de barris de petróleo através dos continentes e que custou à Petrobras 336 milhões de reais (o dobro do valor de mercado) - escondia soldas defeituosas e tubulações que mal se encaixavam. Corria o risco de desfazer-se em alto-mar.
Concebido para ser o primeiro de uma série de 41 navios, símbolo do renascimento da indústria naval, o petroleiro precisou ser parcialmente refeito. O término da reforma está prometido para as próximas semanas, mas técnicos ouvidos por VEJA afirmam que, dado o histórico de trapalhadas, o calendário pode atrasar.
O João Cândido é o epítome da estratégia petista de privilegiar a todo custo mão-de-obra e fornecedores brasileiros como forma de fomentar os setores petrolífero e naval - a tal política do conteúdo nacional. De acordo com ela, no caso da construção de um navio, pelo menos 65% do valor final deve ser gasto no país. Trata-se de uma regra que despreza a inteligência e o bom uso do dinheiro público, como bem ilustra o episódio do João Cândido.
Foi o governo que patrocinou, por meio do BNDES, a criação do Estaleiro Atlântico Sul, encarregado de erguer esse e mais 21 petroleiros. Seus principais sócios são as empreiteiras Camargo Corrêa e Queiroz Galvão, que já fizeram todo tipo de obra, mas nunca montaram nem sequer uma lancha.
Dada a magnitude do projeto, seria preciso que contratassem mão de obra altamente especializada.
Mas quase todos os 2000 operários recrutados - incluídos aí canavieiros, donas de casa e sacoleiros da região estavam montando um navio pela primeira vez. “Com um contingente tão inexperiente, seria impossível não haver erros”, diz Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura.
Todos os países que têm uma indústria naval forte tiveram um dia de destinar subsídios ao setor. Foi assim com o Japão e a Coréia do Sul, hoje os maiores produtores de navios do planeta. Só que lá, ao contrário daqui, estabeleceram-se exigências técnicas e prazos que obrigaram a indústria a ganhar eficiência e a se tornar independente do governo.
Na primeira tentativa feita no Brasil de alavancar o setor, nos anos 60 e 70, foram todos à bancarrota assim que a fonte estatal secou. Agora, mais uma vez, é o governo, via Petrobras, que anuncia um investimento de nada menos que 9,6 bilhões de reais na área.
Enquanto isso, o João Cândido continua emperrado - um monumento à incompetência a lembrar com que facilidade se pode lançar ao mar o dinheiro dos contribuintes.
28 de junho de 2012
Por Reinaldo Azevedo
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