"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



terça-feira, 14 de agosto de 2012

A CHAVE NÃO ABRE, QUEBRE-SE A ´PORTA


O que significa a aprovação de cotas de 50% de vagas das universidades federais para oriundos de escolas públicas?
 
Essa é a pergunta que gostaria de fazer ao leitor, enquanto Dilma não sanciona a proposta.
 
Na sessão do Senado que aprovou as cotas, o senador Paulo Paim (PT-RS) afirmou que apenas um em cada 10 estudantes do país estuda em escola particular.
Ou seja, como argumento temos aí o tremendo fracasso da escola pública do país nas aprovações, o que já é também responsabilidade do partido do ilustre senador.
 
O que o Senado está nos dizendo é: o governo não tem condições de proporcionar ensino capaz de concorrer com as escolas particulares, e a melhor saída para o acesso do aluno estatal à universidade federal tem que ser o atalho.
 
Universidades foram concebidas como centros congregantes de inteligência. A pesquisa científica, o avanço tecnológico e a interpretação dos rumos da civilização brasileira dependem desse conceito meritocrático de “melhores se reunindo para pensar e contribuir melhor”. Se ela não opera assim é outra história, e aí é o caso de repensar o papel dela, e não o acesso a ela.
 
Não posso fechar os olhos para o fato de que hoje um diploma universitário é vital para o desempenho de uma carreira, e as federais são uma grife e tanto.
Mas justamente quem mais fala em ir contra as leis do mercado – a chamada “esquerda”, recheada de tantos intelectuais e acadêmicos – prefere fazer “justiça social” pelo viés mais mercadológico da educação acadêmica: o de que ela tem que preparar – ou melhor, chancelar – para o trabalho.
 
Vê-se também que a esquerda, não raro laica e até antiteísta, aposta demais num argumento igual ao da “culpa judaico-cristã” que despreza: o de que oriundos de certa classe ou cor teriam um “pecado original” a ser expiado por meio de gambiarras baseadas em cor e classe.
 
Paim ainda afirma que “a rejeição desse projeto significaria não querer que os negros, índios e pardos tenham acesso à universidade”, um argumento tão válido quanto o de um chaveiro ruim que, incapaz de fazer chaves que abram a fechadura, bota a culpa no “preconceito” da porta e a arromba.
 
Caso aprovado, o projeto de cotas dá o recado: nas escolas públicas, só somos capazes de ensinar o jeitinho.
 
14 de agosto de 2012
Márvio dos Anjos é Diretor Editorial do Jornal Destak
marviodosanjos@gmail.com
Siga no Twitter: @marvio
Fonte: Jornal Destak - Ed 536 - 10 Ago 12

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