"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



segunda-feira, 6 de agosto de 2012

DESPOLITIZAÇÃO

 "Vivam os deuses marqueteiros. Morte à mobilização política."
As eleições municipais demoram mais e mais para fisgar o eleitor. A dois meses de irem às urnas, só 27% dos paulistanos têm o nome de um candidato a prefeito de São Paulo na ponta da língua, segundo o Ibope. Os últimos três meses de campanha não somaram nem 10 pontos a esse mínimo grau de interesse.
Ficou tudo para os 45 dias da propaganda de TV.
Salvem os santos marqueteiros.
Fim à mobilização política e partidária.


O repórter Daniel Bramatti publicou uma descoberta assombrosa no Estado de ontem: os candidatos a prefeito de capital com mais de 100 inserções semanais de 30 segundos na TV em 2008 tiveram 69 vezes mais sucesso - se elegeram de cara ou chegaram ao segundo turno - do que um adversário com menos de 50 inserções por semana.
Repare:
69 vezes.
Vivam os deuses marqueteiros.
Morte à mobilização política.
 
A eleição não se resume a uma simples correlação estatística, mas o palanque eletrônico é uma variável cada vez mais importante. A despolitização se espalha a cada pleito, e nada é capaz de promover tanta desigualdade entre candidatos quanto a propaganda eleitoral compulsória no rádio e na TV.

Nem a militância partidária, nem a internet (por ora), muito menos recursos paleozoicos como comícios e corpo a corpo com o eleitor.

É um processo que, além de não ter volta, tende a se agravar.
Que fazer?
Criar ainda mais regras, juízos e arbítrios?
Ressuscitar a Lei Falcão e seus enfadonhos currículos lidos pela voz monocórdia de um narrador oficial?
Vade retro Censurabrás.

Os EUA esticaram o tempo de campanha e liberaram quase tudo, até tiro ao candidato. O ciclo eleitoral da gringolândia dura quase dois anos. Desde as prévias, os candidatos debatem dezenas de vezes, por meses. E vão caindo pelo caminho, porque a maioria dos bonecos de ventríloquo não resiste ao excesso de uso.

Só perduram os mais resistentes e caros.
O sistema norte-americano - com suas máquinas mecânicas de votar e regras diferentes em cada um dos 50 Estados - está longe da perfeição. Criou a indústria eleitoral mais perdulária do mundo. Um presidenciável precisa de dólares aos bilhões para ter chances.

É o preço superfaturado de a eleição e o debate político fazerem parte do noticiário cotidiano, dos programas de variedades, da vida.
Lá como cá, sempre haverá eleitor confundindo Russomanno com Muçulmano. A diferença é que, no Brasil, ele é obrigado a votar.
(...)

José Roberto de Toledo O Estado de S. Paulo
06 agosto de 2012
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário