"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



terça-feira, 6 de novembro de 2012

A SINUCA AMERICANA

 

Os Estados Unidos advertiram o governo de Israel contra seu projeto de ataque preventivo às instalações nucleares do Irã, conforme noticiou The Guardian, em sua edição de 4ª feira.
O aviso não foi das autoridades civis de Washington, e, sim, dos comandantes das tropas militares norte-americanas em operação na região do Golfo – o que, ao contrário do que se pode pensar, é ainda mais sério.



O argumento dos militares é o de que esse ataque, além de não produzir os efeitos desejados – porque o Irã teria como retomar o seu programa nuclear – traria dificuldades políticas graves aos aliados ocidentais na região, sobretudo a Arábia Saudita e os Emirados Árabes – de cujo abastecimento direto depende a 5ª Frota e as bases das forças terrestres e aéreas que ali operam.

Embora as dinastias árabes pró-ocidentais temam o poderio militar do Irã, temem mais a insurreição de seus súditos, no caso de que se façam cúmplices de novo ataque a outro país muçulmano. Nunca é demais lembrar que os Estados Unidos e a Europa dependem também do petróleo que passa pelo golfo e atravessa o Canal de Suez, controlado pelo Egito.

Há, nos Estados Unidos – e, entre eles, alguns estrategistas do Pentágono – os que pensam ser hora de ver em Israel um país como os outros, sem a aura mitológica que o envolve, pelo fato de servir como lar a um povo milenarmente perseguido e trucidado pela brutalidade do nacional-socialismo. Uma coisa é o povo – e todos os povos têm, em sua história, tempos de sacrifício e de heroísmo, embora poucos com tanta intensidade quanto o judeu e, hoje, o palestino – e outra o Estado, com as elites e os interesses que o controlam.

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DOMÍNIO MILITAR


Nenhum outro governo – nem mesmo o dos Estados Unidos – são tão dominados pelos seus militares quanto o de Israel. Eminente pensador judeu resumiu o problema com a frase forte: todos os estados têm um exército; em Israel é o exército que tem um Estado.

O Pentágono acredita que uma guerra total contra o Irã seria apoiada pelos seus aliados da região, mas os observadores europeus mais sensatos não compartilham o mesmo otimismo. A ofensiva diplomática de Israel na Europa, em busca de apoio para – em seguida às eleições norte-americanas – uma ação imediata contra Teerã, não tem surtido efeito.
Londres avisou que não só é contrária a qualquer ação armada, mas, também, se nega a permitir o uso das ilhas de Diego Garcia e Ascenção (cedidas pela Inglaterra para as bases ianques no Oceano Índico), como plataforma para qualquer hostilidade contra o país muçulmano.

Negativa da mesma natureza foi feita pela França, que, conforme disse François Hollande a Netanyahu, não participará, nem apoiará, qualquer iniciativa nesse sentido. É possível, embora não muito provável, que Israel conte com Ângela Merkel. Israel tem esperança na vitória de Romney, e a comunidade israelita dos Estados Unidos se encontra dividida.

Os banqueiros e grandes industriais de armamento, de origem judaica, trabalham com afã para a derrota de Obama. E há o temor de que, no caso da vitória republicana, os israelitas venham a aproveitar o esvaziamento do poder democrata para o ataque planejado.

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DOMÍNIO MILITAR


Além disso, Netanyahu não tem o apoio unânime entre os militares de seu país para esse projeto. Amy Ayalon, antigo comandante da Marinha, e dos serviços internos de segurança, o Shin Bet, disse que Israel não pode negar a nova realidade nos países islâmicos:
“Nós vivemos – avisa – em novo Meio Oriente, onde as ruas se fortalecem e os governantes se debilitam”. E vai ao problema fundamental: se Israel quer a ajuda dos governos pragmáticos da região, terá que encontrar uma saída para a questão palestina.

É esta também a opinião, embora não manifestada com clareza, do governo de Obama, de altos chefes militares americanos, e dos círculos mais sensatos da comunidade judaica naquele país.

O fato é que os Estados Unidos se encontram em uma situação complicada. Eles não têm condições militares objetivas para entrar em nova guerra na região, sem resolver antes o problema do Iraque e do Afeganistão. Seus pensadores mais lúcidos sabem que invadir o Irã poderá significar a Terceira Guerra Mundial, com o envolvimento do Paquistão no conflito e, em movimento posterior, da China e da Rússia. Washington, na defesa de seus interesses geopolíticos, deu autonomia demasiada a Israel, armando seu exército e o ajudando a desenvolver armas atômicas.
Já não conseguem controlar Tel-Avive.
Estarão dispostos, mesmo com o insensato Romney, a partir para uma terceira guerra mundial? No tabuleiro de xadrez, se trata de “xeque ao Rei”; na mesa de bilhar, de sinuca de bico.

(Do Blog de Santayana)
 
06 de novembro de 2012
Mauro Santayana

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