"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

WATERGATE - ROMANCE DE THOMAS MALLON

 


Dos meus primeiros livros, lembro mais dos romances históricos. Um deles é "Memórias de um Médico", de Alexandre Dumas, sobre a revolução francesa, em 15 tomos que, ainda adolescente, li duas vezes e marcou, definitivamente, meus interesses intelectuais e políticos. Foram romances históricos que formaram meu gosto pela história e pela literatura, embora, profissionalmente, tenha preferido ser engenheiro.

Pena que tanto tempo depois, ao ler Watergate, de Thomas Mallon, passei a duvidar dos antigos romances históricos que li. Porque esta foi a primeira vez que li um romance histórico reconstruindo um fato contemporâneo, que acompanhei. Porém, há pouca fidelidade histórica no romance histórico.

O livro de Mallon, que é um reconhecido autor de romances históricos nos EUA, trata o tema como se os personagens fossem conhecidos do leitor. Ao fazer isso, permite ao leitor perceber erros e fatos incompletos.

Não é possível escrever um livro histórico, mesmo romanceando a história, sobre Watergate, sem ter Berstein e Woodard como personagens importantes e sem ao menos citar o famoso e misterioso "Garganta Profunda". Sem a participação dele, a história provavelmente teria tomado outro rumo, menos dramático e mais indecente.

O livro, apesar de certa narrativa sedutora, é confuso pela profusão de personagens que entram e saem, o que deve fazê-lo incompreensível para quem não acompanhou os fatos pelos jornais.

É confuso também devido a temas paralelos claramente artificiais e sem uma consistência narrativa, nem de história, nem de romance.

Nixon

Vale a pena ser lido por quem tiver muito tempo disponível. Caso contrário, é melhor ler os livros de memórias escritos pelos próprios personagens. São tantos que permitem formar uma biblioteca inteira.

Especialmente os livros dos próprios jornalistas que desvendaram o escândalo da invasão do Comitê do Partido Democrata, nos EUA, em 1972, que levou à queda do presidente Nixon, dois anos depois.

É uma pena que o autor não soube explorar bem a história que reúne as três narrativas irmãs siamesas: reportagem, romance e história. Afinal, romance, história e reportagem são quase que a mesma coisa, apesar de suas diferenças: o imediatismo de uma, a imaginação da outra e o respeito às fontes da terceira.

Neste Watergate, nota-se claro divórcio entre essas três narrativas: nem é história, nem romance, muito menos jornalismo. É uma grande oportunidade perdida porque raramente reportagem e história estiveram tão próximas, esperando por um romancista. Que não foi o Thomas Mellon.

O livro pode, entretanto, servir para despertar os leitores jovens para um dos fatos mais surpreendentes do século XX, graças à irresponsabilidade de aprendizes de espiões a serviço de políticos sem ética nem escrúpulos e a extrema competência, coragem e sorte de dois jornalistas e seus editores.

18 de fevereiro de 2013
Cristovam Buarque, senador pelo PDT do Distrito Federal e ex-reitor da Universidade de Brasília, resenhará aqui, toda segunda-feira, um livro publicado no exterior ou um filme.

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