O fim da fase de cálculo das penas dos condenados no julgamento do mensalão foi considerado um marco histórico, dadas as circunstâncias do processo. Pela primeira vez, a Justiça brasileira condenava, em instância final, inclusive à prisão, poderosos na cena política. Entre eles, figuras estreladas do PT, partido inquilino do Planalto há pouco mais de 10 anos: José Dirceu, ex-ministro, o deputado José Genoino, ex-presidente da legenda, e João Paulo Cunha, deputado e ex-presidente da Câmara, os mais proeminentes.
O assunto foi notícia no mundo, pelo que representa em termos de fortalecimento das instituições num país da América Latina, continente de tempos em tempos varrido por ventos populistas e autoritários, e não tendo o Brasil qualquer tradição em punir judicialmente pessoas influentes. Justas repercussões — mas o julgamento tecnicamente ainda não acabara.
Os ritos jurídicos são intrincados. Há alguma razão para isso, pois um dos lastros do estado democrático de direito é dar ampla oportunidade de defesa aos acusados, embora, como em tudo, haja limites. Mesmo condenados ainda contam com alternativas de recursos.
Fato é que, com a entrega, segunda-feira, pelo ministro Celso de Mello, do seu voto por escrito, o último da Corte dos que participaram do julgamento a fazê-lo, o presidente do Supremo, Joaquim Barbosa, poderá remeter o acórdão do caso para publicação no Diário de Justiça. Feito isto, os advogados de defesa contarão com cinco dias úteis para encaminhar recursos, assim como o Ministério Público, o denunciante dos mensaleiros, caso discorde de alguma pena.
É possível que esta fase final ainda reserve emoções, porque é do óbvio interesse de advogados de condenados aproveitar as inúmeras brechas que a legislação permite para esgrimir com chicanas e tentar até mesmo rever penas em regime fechado.
Há duas possibilidades de recursos: os embargos declaratórios, para dúvidas de interpretação; e os infringentes, usados na atenuação de pena de quem teve quatro votos, no mínimo, a favor da absolvição. Caso, entre outros, de José Dirceu e José Genoino na acusação de formação de quadrilha. Há acesa discussão sobre a existência ou não deste tipo de recurso, pois, segundo alguns juristas, ele foi revogado por lei.
Existem, ainda, cálculos maquiavélicos pelos quais haveria a possibilidade de o desfecho do mensalão ser postergado para que a renovação do Pleno, em função da aposentadoria de alguns ministros, permitisse a nomeação de magistrados, digamos, menos antipáticos a certos mensaleiros.
Seria um descalabro, um escândalo. Chega a ser difícil admitir que alguém do nível exigido pelo Supremo aceite uma indicação a ministro já marcada pelo suspeição. É preciso um imenso cuidado a fim de não se manchar a imagem do STF, e das instituições republicanas em geral, com uma ação política aloprada na temerária tentativa de resgate de mensaleiros condenados.
10 de abril de 2013
Editorial d`O Globo
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