O capitalismo é a forma natural e mais bem sucedida de organização econômica desde a Antiguidade. Inexiste substituto melhor. Frei Betto, porém, não pensa assim. Ele duvida do êxito do capitalismo. Em entrevista à Rádio CBN (15/6/2013), disse: “Enquanto o Evangelho prega a solidariedade, o capitalismo prega a competitividade” (ele quis dizer competição, concorrência).
“Enquanto nós cristãos pregamos que o ser humano tem de estar acima de tudo, com seus direitos preservados, ele prega que a prioridade reside no capital” (não há prova dessa afirmação). Sua conclusão:
“O capitalismo é bom apenas para um terço da humanidade. Todo mundo fala no fracasso do socialismo. Engraçado, ninguém fala do fracasso do capitalismo para dois terços da humanidade”.
Segundo Max Weber (1864-1920), o capitalismo sempre existiu nos países civilizados. Havia empresas capitalistas “na China, na índia, na Babilônia, no Egito, na Antiguidade Mediterrânea e na Idade Média, tanto como na Idade Moderna”. Imagino que os vendilhões que Cristo expulsou do Templo (Mateus 21:12) praticavam um capitalismo primitivo.
O capitalismo moderno surgiu na Europa entre os séculos XVIII e XIX. Derivou de longa obra institucional, da qual se destacam dois eventos na Inglaterra: a Carta Magna (1215) e a Revolução Gloriosa (1688), que eliminaram o absolutismo.
A supremacia do poder foi transferida para o Parlamento. O rei perdeu a prerrogativa de demitir juízes e de gastar a seu bel-prazer.
O Judiciário independente passou a garantir direitos de propriedade e respeito a contratos. A ordem capitalista começou a emergir da segurança jurídica. Nasceu a liberdade de imprensa. Com a lei de patentes (1624), a propriedade, antes restrita aos bens físicos (finitos), se estendeu às inovações (infinitas).
Graças à criação do Banco da Inglaterra (1694), a taxa de juros caiu, e surgiu um amplo mercado de crédito para empresas. A inovação e o empreendedorismo explodiram, desaguando na Revolução Industrial.
A pobreza se concentra nos países que não construíram as instituições propícias ao florescimento do capitalismo
Depois, a pesquisa e o ensino ampliaram o conhecimento sobre o funcionamento da economia. Os governos aprenderam a construir instituições que lidam com os excessos do capitalismo e asseguram a melhor distribuição da riqueza gerada pelo mercado.
Na época de Smith, 90% dos europeus ocidentais eram pobres. Atualmente, apenas 10%. Foi a maior revolução social da história até então. A partir de 1978, com o primeiro-ministro Deng Xiaoping (1904-1997), a China protagonizaria outra revolução, mais rápida. Quando as reformas de Deng reinstituíram o capitalismo, a renda per capita era um terço da prevalecente na África subsaariana. Em três décadas, a China passaria a país de renda média, retirando da pobreza mais de meio bilhão de pessoas.
O capitalismo é um gigantesco processo de coordenação de expectativas e de cooperação entre indivíduos, empresas e governo. Não depende de um comando central como no socialismo. Ao contrário deste, incentiva a criatividade, a inovação, o avanço tecnológico e, em última instância, a criação de riqueza.
O capitalismo não é perfeito. Crises financeiras e de outra natureza provocam recessões que prejudicam a economia e o bem-estar. Sua vantagem é aprender com elas, renovar-se, e promover mudanças que previnem a repetição de erros e suscitam a recuperação. No socialismo não há tais crises, mas o regime fracassou. A União Soviética morreu. As crises do capitalismo tampouco ocorrem em Cuba e na Coreia do Norte, os sobreviventes, pois não têm sistema financeiro. Lá, o socialismo legou uma economia decadente e igualitária na pobreza.
Hoje, a pobreza se concentra nos países que não construíram as instituições propícias ao florescimento do capitalismo. Eles constituem a maior parte dos dois terços citados por Frei Betto. Se um dia se transformarem, o capitalismo também lhes trará o êxito. O fracasso ficará para trás.
09 de julho de 2013
Mailson Ferreira da Nóbrega
Fonte: revista “Veja”
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