"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



terça-feira, 5 de junho de 2012

MADRI, EL CAMINO DE LAS PIEDRAS


Cafés

(fico nos cafés e restaurantes, a meu ver o melhor da cidade)

. Para começar, nada melhor que El Sobrino de Botín, tido como o mais antigo restaurante do mundo, junto à Plaza Mayor. Você até pode tentar outros pratos, mas sugiro fortemente ficar nos cochinillos ou corderos lechales. Vale uma viagem a Madri

· No Paseo de Recoletos, perto do Correio Central, estão o Gijón e o El Espejo, tradicionais cafés literários, um a poucos passos do outro, quase em frente à Biblioteca Nacional. Têm pavilhões no meio do Paseo, muito agradáveis. Mas acho que devem ser vistos principalmente por dentro. Teria sido no Espejo que Borges bolou suas metáforas. Em função deles, nunca consegui chegar à Biblioteca Nacional. Não conseguia atravessar o Paseo, ficava por ali mesmo

· El Oriente, frente ao Palácio Real. Meu refúgio compulsório aos domingos, a meu ver o mais refinado da cidade. Em meus dias de Madri, invariavelmente, eu encontrava a Geraldine Chaplin na mesa a meu lado. Nestes cafés, a cerveja será, é claro, um pouco mais cara que nos botecos normais. Mas para quem sai de São Paulo, acho que a diferença não é muita. Desç ao banheiro, aproveite para olhar o restaurante, uma cave do século XVI. Lá, El Rey recebia Mitterrand. Se você está em quatro pessoas, consegue reservar a mesa d’El Rey (para seis), no Comedor d’El Rey. Os preços estão acima da média dos demais restaurantes. Duas pessoas, com vinho, uns 100 euros

· Perto do Oriente, na calle Vergara, 1, o café Vergara. Bom

· Melhor ainda que o Vergara, El Alabardero, colado à Ópera

· Soto Mesa, na San Felipe Neri, 4, perto do Vergara. Não cheguei a curti-lo. Após a meia-noite, apresentações de música. Às quintas, flamenco. Não é o flamenco apresentado nos tablaos. Ou seja, é mais barato e menos pomposo

· Se você quiser ver um flamenco - recomendo vivamente -, lembre que tem direito a uma consumação com o preço do ingresso. Mas, atenção: não peça uma segunda, nem mesmo um refrigerante: aí você paga de novo o preço do ingresso, que já é caro. Se quiser beber algo durante o espetáculo, deve sair da sala e beber no balcão

· Procurar o La Favorita, restaurante onde os garçons são estudantes de música e recitam árias de óperas. Ambiente agradável. Não é caro. Comida ruim, pra não dizer péssima. Mas o vinho sempre é bom

· Cerveceria Alemana, na Plaza Santana. De alemã nada tem. Cervezas y pinchos, gente de teatro, universitários. Recomendo vivamente

· Logo abaixo da Alemana, na calle del Prado, esquina Etchegaray, o Café del Prado. Divino, à noite

· Descendo a mesma rua do Prado, mais abaixo e do lado esquerdo, La Fídula. Música erudita, ao vivo. É lugar mais para escutar que para conversar

· Lembrar que em Madri não cabe esquentar banco por muito tempo em um só café. A ordem é girar de um café a outro noite adentro.

· Na calle Etchegaray, frente ao Hotel Inglês, a cinco minutos da Alemana, há o Venencia, um bar especializado em jerez. Só tem jerez e só abre à noite. Imperdível. Ótimo para curtir o balcão, doses de jerez a 150 pesetas, com direito a umas tapitas. Ambiente buñuelesco: todos falam e ninguém ouve, pelo menos foi essa a impressão que tive. Bom pra curtir perto de meia-noite

· Alguns metros à frente, há o Cacerola. Os garçons mais novos, eu os conheço desde 71, quando eram pivetes. Hasta las doce del mediodía, se pedes um pincho no balcão, a cerveja ou café já estão incluídas no preço. No fundo, há um restaurante bom, nada caro, onde podes experimentar, por exemplo, callos a madrilenha, a versão espanhola do nosso mocotó. Como pincho, me agrada muito a morcilha de Burgos

· Paralela à Etchegaray, tem a Ventura de Vega, com vários restaurantes. O que mais me agrada é o La Vega, reduto de jornalistas, gente de teatro, enfim... Sempre que passo pela rua, acabo deixando todos os restaurantes de lado e voltando sempre ao La Vega. Bom para fim de noite

· Na Calle de la Bola, perto do Palácio Real, desviando um pouco pra direita, há o La Bola, considerado por especialistas como o fornecedor do melhor “cocido madrileño”. Atenção: chegar perto das duas, ou não consegues lugar. Depois das duas e meia, os madrileños se atiram com fúria ao cocido. Há outros pratos, mas a boa escolha é o cocido. Deixa que o garçom te explique como se come. Em suma, primeiro deves despejar o cocido da jarra nos fideos que estão no prato. Tomada esta sopa, despejas então os garbanzos e carnes da jarra no prato e partes pra segunda fase. Esta é a estratégia dos “dos vuelcos”. Puristas acham que o cocido deve ser degustado en “tres vuelcos”, no segundo viriam os garbanzos e o toucinho, deixando as carnes para o terceiro. Mas deixa pra lá, o sabor é o mesmo

· Lembrar que soa estranho falar em almoço em Madri antes de las dos del mediodía

· Estando em Madri, não deixar de ir a Toledo. Sugiro pegar um trem, ônibus pode dar engarrafamento. É passeio para um dia, podes sair de Madri pelas nove, dás um giro pela cidade - a catedral é uma das mais imponentes da Europa -, almoças e voltas em fim de tarde. Meu restaurante predileto é o Casa Aurelio, perto da catedral. Lá, optando por perdices a toledana, cochinillo ou cordero lechal, estás soberbamente servido. Pessoalmente, eu deixaria as perdices para uma segunda visita, os cochinillos e lechales se impõem ao marujo de primeira viagem. Atenção, há três Aurélios. O mais charmoso é o da Sinagoga, 6.

· Estando em Madri, como não espichar até Segovia? Se queres um lechal divino, degustado junto a aquedutos romanos, você deve buscar o Candido. Mas o Conde Duque, um pouco mais acima, é mais solene. Quando vivia, o próprio Conde Duque partia com um prato o cochinillo, para atestar sua maciez

· Agora, se você quiser a quinta-essência do cordero lechal, melhor alugar um carro e ir até Pedraza de la Sierra, a uns 40 minutos de Segovia. Pedraza é uma cidade-fantasma, que tem cinco ou seis restaurantes para receber turistas. E só. Mas esta viagem, me parece, é para viajor mais especializado. Para quem ainda não conhece bem a Espanha, melhor ficar com os lechales de Segovia

05 de junho de 2012
janer cristaldo

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