"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



segunda-feira, 24 de setembro de 2012

HISTÓRIAS DO JORNALISTA SEBASTIÃO NERY

NOS TEMPOS DE JUCA QUARESMA


Dona Amélia é quem mandava em Bonito de Santa Fé, lá nos perdidos sertões da Paraíba. Chamou Manuel Sabugo, mandou matar Zeca do Riachão. De noite, se arrependeu. De manhã, não encontrou mais Manuel Sabugo. Despachou um portador para avisar a Zeca do Riachão. E ainda fez um bilhete para Zeca mostrar a Manuel Sabugo: “Manuel Sabugo, não puxe o gatilho contra Zeca do Riachão”.
Sabugo encontrou Zeca. Zeca lhe mostrou o bilhete:
– Sabugo, leia este bilhete de dona Amélia.
Manuel Sabugo leu e guardou:
– Tudo bem, Zeca. Está cumprida a ordem de dona Amélia. Não vou atirar em você. Mas eu já rezei pela sua alma. Então, você vai morrer na faca.

E Manuel Sabugo matou Zeca do Riachão na faca.

Esta é uma história de um século atrás. Do começo do século passado. De um tempo que hoje só existe nos livros. E de uma terra que há muito deixou de ser um perdido sertão da Paraíba. História de horror de uma morte gratuita, vista só por uma pessoa e sabida só por um punhado de gente.

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CANDIDATO DO HOSPÍCIO

George Pires Chaves, comunista, advogado e cônsul do Piauí no Rio, voltou a Teresina para visitar um cliente. Encontrou-o louco, internado no Sanatório Meduna, fundado e dirigido pelo inesquecível Clidenor de Freitas.

O cliente, lúcido na sua chestertoneana loucura, não queria saber de processos nem de negócios. Só de política:

– Dr. George, nós estamos cansados de eleger governadores sãos. Nenhum deles prestou. Agora, queremos um doido para o governo do Estado.
– E quem é o candidato?
– É aqui nosso colega, o doutor Clidenor.

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VOTE NO SOBRINHO
 
Juca Quaresma, PSD, amigo de Juscelino, era coronel de vastas terras e líder político em Águas Formosas, acima de Teófilo Otoni, lá para as bandas do Jequitinhonha, no norte de Minas. Eleição para ele não tinha mistério.
Quando Kennedy derrotou Nixon, em 1960, o resultado saiu logo:

– Não vejo vantagem. Eles dizem que são desenvolvidos por isso. Quero ver é saber o resultado adiantado. Sei quem vai ganhar aqui daqui a dez anos.

Numa eleição para prefeito, o sobrinho dele, Líbio, saiu candidato contra ele. Juca Quaresma ficou uma fera. Mandou seu aliado Zé de Luca fazer uma pesquisa no município todo. Veio o resultado, e ele disse ao agrônomo José Maria Pimenta, cearense que trabalhava naqueles mundos, hoje deputado estadual (bom deputado) do Ceará e candidato a federal pelo PL:

– Doutor, não tem jeito. O povo quer. É o caso de dizer: é o meu candidato.

Apoiou e elegeu o sobrinho. O advogado Olinto Medrado, amigo dele, propôs uma campanha para Águas Formosas virar comarca. Juca não aceitou:

– Doutor, vamos trazer juiz para cá, para ser mais importante do que nós e prender nossa gente? Vamos ficar nós aqui com nós mesmos.

Dizem que hoje a política é mais transparente. Mas é tudo na base do dinheiro, do compra-compra, do governo que pode tudo porque compra tudo.

24 de setembro de 2012
 Sebastião Nery

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