Blanca Rosa Mármol de León avalia que a Corte se tornou um braço armado do chavismo. Para ela, o mandato do vice-presidente acaba nesta quinta-feira, e ele não tem legitimidade para comandar o país
Após 38 anos dedicados ao Direito, o que a levou a ocupar por 12 anos um dos 32 postos do Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) da Venezuela, Blanca Rosa Mármol de León foi afastada em 31 de dezembro, segundo ela e outros especialistas.
Ela era uma das poucas juízas que votavam de forma independente do chavismo. Na entrevista abaixo, ela afirma que a Venezuela fica a partir de desta quinta-feira “sem governo legítimo” e detalha a série de rupturas constitucionais vigentes no país. Segundo a ex-magistrada, o “Tribunal Supremo de Justiça virou um braço armado do Executivo”.
Antes de tudo, por que o afastamento da senhora foi inconstitucional?
Meu período de 12 anos de Supremo venceria em dezembro, estava certo eu me aposentar, assim como outros sete juízes, três deles que votavam de forma independente como eu. O problema é que a gente tinha suplentes, cujos mandatos também venciam, para que a Assembleia Nacional (responsável na Venezuela pela nomeação da Corte Suprema) designasse, assim, novos juízes.
Com o fim do nosso mandato, simplesmente mandaram a gente embora e puseram os suplentes lá. E adivinha?! Todos os suplentes são chavistas! Nenhum substituto foi designado. Isso porque a Assembleia Nacional jamais permitiria a nomeação de magistrados chavistas, porque a situação não tem dois terços dos assentos, portanto, não detém maioria absoluta.
Por isso ninguém levou a votação à pauta. Ou seja: o TSJ virou um braço armado do Executivo, o Legislativo foi desrespeitado.
A atual situação é que ninguém vai contestar mais nenhuma decisão que fira a Constituição. Todos os juízes agora fazem o que o chavismo manda.
As interpretações dos juízes da Sala Constitucional lidas ontem pela presidente do TSJ são prova disso? O TSJ poderia ter adiado a posse de Chavez até que ele voltasse para a Venezuela?
Claro que não. Pela Constituição, o presidente a partir de hoje teria que ser o presidente da Assembleia (Diosdado Cabello). Presidente em exercício, ou para esperar pela volta de Chávez (no caso de ausência temporária), ou para convocar novas eleições (no caso de ausência permanente).
Isso de manter o status quo com Nicolás Maduro à frente do governo é uma ruptura institucional e constitucional gravíssima, prova que as instituições da Venezuela ruíram. Juízes sérios e isentos jamais poderiam ter dado esta interpretação à Carta. Podemos dizer hoje: não há mais governo legítimo aqui.
A comissão médica para avaliar o estado de saúde do presidente também não foi e pelo visto nem será nomeada...
Mais um desrespeito à Constituição e ao povo venezuelano. Todas as entidades jurídicas internacionais concordam que a população tem o direito, como eleitora, de saber a quantas anda a saúde de um chefe de Estado. A saúde do presidente é uma questão de segurança nacional. Especulações contribuem para a instabilidade. Uma junta independente precisava avaliar se Chávez tem condições ou não de voltar.
Ao contrário do Brasil, o vice-presidente da Venezuela não faz parte da chapa eleita pelo povo, ele foi nomeado pelo presidente. O mandato de Nicolás Maduro, além de acabar hoje, é menos legítimo por isso?
O mandato dele acaba e, a partir de hoje, perde totalmente a legitimidade. O cargo de Maduro precisaria ser oficialmente renovado por Chávez, a partir da data da nova posse, assim como os cargos dos ministros. Maduro fala constantemente em nome de Chávez, mas quem prova isso? Diosdado Cabello leu uma carta de Maduro, supostamente a pedido de Chávez, mas a carta estava assinada? Não. A pergunta é: quem está nos governando?
10 de janeiro de 2013
O Globo
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