"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

FINANÇAS E DECADÊNCIA


          Artigos - Economia 
       
A promessa de salvação não é mais algo que se possa relacionar ao comportamento produtivo. A salvação é agora garantida pelo Estado, que deste modo está criando uma nova religião política

Uma sociedade decadente é sinal de que todas as esferas de atividade estão afetadas. A degradação que segue à decadência debilita a moral, a religião, as finanças e a política. A decadência não afeta apenas um ramo da atividade humana — ela afeta todos. Olhando para o corrente declínio do sistema econômico questionamo-nos se estamos passando por um ciclo normal de "correções" e crises. Alguns dizem que estamos entrando em um "super ciclo".


Vemos nas crises orçamentárias contemporâneas um esforço para sustentar e ampliar o estado de bem-estar social. Na manchete da Bloomberg vemos: "Acordo do Senado significa aumento dos impostos em 77% das casas".
Nenhuma pessoa bem informada acredita que a atual discussão orçamentária trará algum alívio nos imposto ou um suposto acerto financeiro do governo que equilibraria os próprios gastos com aquilo que arrecada.
Mais importante ainda, nenhum observador inteligente nega que o país esta se tornando mais dependente do governo. Ninguém acredita que os gastos diminuirão ou que a economia andará no mesmo passo dos programas governamentais.

Mais de sete décadas atrás, o economista austríaco Ludwig von Mises escreveu um livro sobre o socialismo no qual ele discutiu o estado de bem-estar social. Mises explicou que, certa época, os alemães descobriram a previdência social. Eles viram ela "como a maior das coisas que [...] a sabedoria política poderia atingir".
Supostamente, a previdência social deveria dar a "todos os cidadãos o cuidado adequado e o melhor dos tratamentos médicos a quem estivesse doente..." Evidentemente, Mises mostra que "nenhuma comunidade organizada foi insensível a ponto de deixar que os pobres e incapacitados passassem fome".
A caridade privada e os indivíduos em geral ajudavam os pobres muito antes do surgimento do estado de bem-estar social. Entretanto, com a intervenção do Estado, que não mais confia na bondade humana, Mises notou que "aquilo que antes era um ato de caridade ao qual os pobres não tinham direitos sobre ele, agora tornou-se um dever da comunidade". 
   
Segundo Mises, o sistema de previdência social é problemático. As pessoas podem forjar acidentes e doenças para adquirirem benefícios. E de fato, algumas pessoas estão claramente motivadas a fazer isso.
Como prova disso, no começo da crise americana em 2008-9, um oficial da previdência me disse que as reivindicações de compensação financeira subitamente se elevaram porque as pessoas sabiam que seriam demitidas e, sendo assim, eles sabiam que a compensação previdenciária pagava mais do que os valores recebidos após uma eventual demissão. Em outras palavras, era melhor se machucar durante o serviço do que esperar a carta azul para receber o seguro-desemprego. Sobre essa situação, Mises escreveu:

 "O aspecto destrutivo do seguro social para acidentes e problemas de saúde reside, acima de tudo, no fato de que essas instituições promovem acidentes, doenças, atraso na recuperação do indivíduo e comumente criam — ou intensificam em algum grau — os distúrbios funcionais que se seguem às doenças ou acidentes".

É uma afirmação notável vinda de Mises. Eis a base factual a qual reside essa afirmação: "Irrefutáveis estatísticas mostram que os segurados levam um tempo muito maior para curar suas lesões se comparados a outras pessoas.
Além disso, os segurados são muito mais passíveis a um prolongamento dos seus problemas ou mesmo a perpetuação dos distúrbios funcionais se comparados àqueles que não dispõem de seguro".
A partir disso, Mises chegou a uma conclusão chocante: “Seguro contra doenças causa doenças”.
Ele argumentou que se “a vontade de ser eficiente e estar bem é fragilizada, a doença e a inabilidade para trabalhar são os efeitos esperados”.

Mises endossou essa polêmica tese ao dizer que “as forças psíquicas que estão ativas em todos os seres vivos, inclusive o homem, na forma de uma aspiração à saúde e ao trabalho não estão independentes do ambiente social.
Certas circunstâncias reforçam essas aspirações, outras a enfraquecem. Portanto, não é por acaso que uma série de doenças neuróticas apareceram nos lugares onde os golpistas mais se refugiam. (esse tema foi explorado no polêmico livro do Dr. Thomas S. Szasz, The Myth of Mental Illness: Foundations of a Theory of Personal Conduct)

A promessa de salvação não é mais algo que se possa relacionar ao comportamento produtivo. A salvação é agora garantida pelo Estado, que deste modo está criando uma nova religião política. Nossos salvadores agora são os políticos, porém o método deles não pode nos salvar, pois ele desmoraliza a economia ao degradar aqueles que são os mais produtivos e elevar aqueles que são pouco produtivos.
Neste caso, é possível constatar como a moralidade é minada por um excedente de maldade e por um empréstimo irresponsável. Christopher Lasch uma vez disse: “A cobiça pela gratificação imediata está impregnada de alto a baixo na sociedade americana. Há uma preocupação universal com o eu – coisas como a ‘realização de si mesmo’ e o mais recente termo ‘autoestima’ são slogans de uma sociedade incapaz de gerar um senso de obrigação cívica”.

Podemos facilmente substituir o termo “obrigação cívica” por “obrigação financeira” nessa fala de Lasch. Argumentou-se anteriormente – e deve ser argumentado novamente – que nosso caráter enquanto povo está sendo minado pelo estado de bem-estar social. As coisas foram muito longe e nossa posição está cada vez mais insustentável.
Perdemos nosso senso de propriedade e a noção de perigo. Como Lasch também escreveu: “… a cultura é um modo de vida apoiado pela disposição de punir aqueles que desafiam seus mandamentos”. Antigamente, quitar uma dívida era algo sério que exigia responsabilidade. Trabalhar para o próprio sustento já foi considerado algo honroso.

Quando uma sociedade entra em decadência, todas as esferas de atividade são afetadas. A degradação que vem com a decadência necessariamente mina a economia. Deste modo, é improvável que nossos problemas atuais sejam apenas cíclicos. É possível estarmos à beira de um prolongado declínio civilizacional.
 
10 de janeiro de 2013
Jeffrey Nyquist
Publicado no Financial Sense.

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