Há a exigência de ficha limpa para candidatos, mas não há nos regimentos da Câmara e do Senado nada que diferencie um parlamentar do outro para a ocupação de postos importantes: presidências das casas, lideranças de bancadas, comando de comissões e conselhos. De onde as barbaridades prosperam sem que nada se possa fazer além de pressão que gera desgaste político e pode, ou não, levar a um recuo.
Investigações, denúncias e renúncias forçadas não impediram que Renan Calheiros e Henrique Eduardo Alves fossem eleitos presidentes do Senado e da Câmara.
Protestos e paralisação dos trabalhos da Comissão de Direitos Humanos reduzem as chances de o deputado Marco Feliciano continuar na presidência do colegiado, mas não garantem o desfecho.
Se o PMDB não quiser, nada impedirá o deputado Eduardo Cunha de seguir líder da bancada do partido, apesar de ser agora alvo de processo no Supremo Tribunal Federal (STF).
Assim como o PT não viu impedimento em indicar dois condenados à prisão pelo STF para a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Do ponto de vista das regras internas, estão todos e mais alguns com contas abertas na Justiça dentro da legalidade.
E a legitimidade? Esta não conta como critério na escolha dos partidos para a distribuição de posições, embora pudesse passar a valer a partir de um acordo (de cavalheiros?) conduzido pelos presidentes das casas, que prometeram investir na recuperação da credibilidade do Parlamento.
A instituição de uma espécie de norma da ficha limpa para o exercício dos mandatos seria uma sugestão algo utópica. Criaria uma enorme confusão e levaria os preteridos a invocar o princípio do "respeito" aos votos que os levaram ao Congresso.
Situação anômala, verdade. Ocorre, porém, que anomalia maior é a que se estabelece hoje em um Poder Legislativo onde o cardinalato é composto de gente que antes era da turma do baixo clero, não tinha pretensões a comandos nem ocupava espaços de destaque.
Passavam despercebidos, e suas máculas não chegavam a contaminar de todo o ambiente. Hoje é diferente, esse pessoal manda. Isso determina que obedeçam a exigências mínimas de conduta e aconselharia o Congresso a levar em conta ao menos as aparências.
Linha auxiliar. A fusão de partidos ou a criação de uma nova legenda é uma preliminar importante para os planos eleitorais do governador Eduardo Campos. É a maneira segura de conseguir que parlamentares mudem de partido sem o risco de perderem os mandatos, numa repetição da fórmula que levou o PSD a ter mais de 50 deputados.
O problema é que os "grandes" articulam a aprovação de uma emenda constitucional para "fechar" a janela aberta pelo Supremo quando, na interpretação da regra da fidelidade partidária, decidiu que o troca-troca não gera punição se ocorrer por discordância doutrinária, fusão ou criação de nova legenda.
Preocupados em serem vítimas da possível sangria, pretendem impedir o acesso dos "novos" ao tempo de televisão e ao fundo partidário antes de passarem pelo crivo de uma eleição, como foi permitido ao PSD.
No paralelo. As viagens internacionais de Lula custeadas por empreiteiras são, segundo a assessoria do ex-presidente, um périplo em defesa dos "interesses do País".
Com a mesma justificativa, o Itamaraty distribuiu passaportes diplomáticos a quem não deveria, e com a mesma alegação secretários do governo Sérgio Cabral circulavam pela noite de Paris com guardanapos na cabeça.
A questão não são as atividades remuneradas de Lula, mas a "ponte" entre elas e a influência dele no governo.
24 de março de 2013
DORA KRAMER - O Estado de S.Paulo
Nenhum comentário:
Postar um comentário