PARTE 4
Os trechos mais fortes do Ato
Institucional no 5
Uma seleção do que valeu no Brasil
entre 13 de dezembro de 1968 e 31 de dezembro de 1978
Art. 2o - O presidente da República
poderá decretar o recesso do Congresso Nacional, das Assembléias Legislativas e
das Câmaras de Vereadores, por ato complementar, em estado de sítio ou fora
dele...
Art. 3o - O presidente da República, no
interesse nacional, poderá decretar a intervenção nos estados e municípios, sem
as limitações previstas na Constituição.
Art. 5o - A suspensão dos direitos
políticos, com base neste ato, importa simultaneamente em:
I - cessação de privilégio de foro por
prerrogativa de função;
II - suspensão do direito de votar e de
ser votado nas eleições sindicais;
III - proibição de atividades ou
manifestações sobre assunto de natureza política;
IV - aplicação, quando necessário, das
seguintes medidas de segurança:
a) liberdade vigiada;
b) proibição de freqüentar determinados
lugares;
c) domicílio determinado.
Art. 6o - O presidente da República
poderá, mediante decreto, demitir, remover, aposentar ou pôr em disponibilidade
quaisquer titulares das garantias referidas neste artigo...
Art. 10o - Fica suspensa a garantia de
habeas-corpus, nos casos de crimes políticos, contra a segurança nacional, a
ordem econômica e social.
A carta inacabada de Passarinho
Minha mulher,
Meu filho Júnior 13 dez. 1968
"Estou sentado à mesa do Conselho
de Segurança decidindo o presente e o futuro imediato do Brasil.
Vocês sempre me viram defender a
liberdade e a democracia. Hoje, pode parecer a ambos que estou passando à
História brasileira como um liberticida, apoiando poderes ditatoriais
conferidos, neste instante, ao senhor presidente da República.
Vou referendar o novo ato
institucional. No meu entender, isso equivale a uma ditadura, ao menos em
potencial.
Felizmente, o fiador de tudo será o
marechal Costa e Silva, que não usará abusivamente dos poderes que lhe damos
neste momento. Deus assim o permitirá.
Por outro lado, não são os artigos de
uma Constituição que garantem uma democracia. Na Rússia, o direito ao livre
expressar do pensamento é letra da Constituição. No entanto, é letra morta. De
que vale..."
O que se disse no palácio
Quantas vezes foram citadas algumas
palavras na reunião do conselho
Revolução (de 1964) - 47
Ordem - 36
Subversão - 13
Ditadura - 13
Estado de sítio - 13
Repressão - 6
Democracia - 6
Contra-revolução - 6
Desagregação - 3
Moral - 3
Liberdade - 3
Desordem - 2
Escrúpulo(s) - 2
Caos - 1
Corrupção - 1
Censura - 0
Tortura - 0
Quatro anos de confronto
A escalada política de 1964 a 1968
1964
31 de março
A revolução depõe João Goulart.
Castello Branco é o primeiro presidente do regime militar.
1966
25 de junho
Três atentados são cometidos pela
direita em Pernambuco. Um dos alvos é o Aeroporto dos Guararapes.
19 de novembro
Juscelino Kubitschek e Carlos Lacerda
lançam a Declaração de Lisboa, o primeiro manifesto da Frente Ampla, de
oposição ao governo.
1967
15 de março
Arthur da Costa e Silva é empossado na
Presidência da República. Seu vice é o deputado Pedro Aleixo.
24 de setembro
Carlos Lacerda e João Goulart assinam o
Acordo de Montevidéu, que defendia a volta do país ao regime democrático.
1968
28 de março
O estudante Edson Luis é morto no
restaurante Calabouço, no Rio de Janeiro.
21 de junho
Quatro mortos, 58 feridos e mil presos
numa manifestação estudantil, no centro do Rio. É a sexta-feira sangrenta.
26 de junho
Passeata dos 100 mil, no Rio.
29 de agosto
A polícia invade a Universidade de
Brasília.
2 de setembro
O deputado Márcio Moreira Alves faz um
discurso criticando a invasão da UnB. O governo usaria esse pronunciamento como
pretexto para o AI-5.
3 de outubro
Um estudante morre no confronto entre a
direita do Mackenzie e a esquerda da Faculdade de Filosofia, em São Paulo.
12 de outubro
Cai o Congresso da UNE, em Ibiúna.
Charles Chandler, capitão americano,
acusado de pertencer à CIA, é assassinado numa ação da VPR.
12 de dezembro
Por 216 votos contra 141, a Câmara
rejeita o pedido de licença para processar Márcio Moreira Alves.
13 de dezembro
AI-5
"Eu vi gente torturada"
Um depoimento exclusivo do presidente
Fernando Henrique sobre o AI-5
No dia 13 de dezembro de 1968, eu
estava em São Paulo quando ouvi, pelo rádio, a voz desagradável do ministro da
Justiça, Gama e Silva, que havia sido meu colega no Conselho Universitário da
USP, a ler os artigos do Ato Institucional no 5. Ele lia esbravejando e isso me
dava uma reação muito estranha porque eu o conhecera bem. Nunca o tive como um
bravo.
Daí por diante, foi uma noite escura.
Foi uma noite escura porque houve repressão, censura e violências de todo tipo,
o que gerou o terrorismo e uma série de movimentos que tinham o objetivo de
mudar o regime autoritário mas que acabaram contribuindo, de alguma maneira,
para o contrário e foram esmagados violentamente, também por tortura e morte.
Antes disso, eu estava na França.
Voltei ao Brasil em outubro de 1968 para concorrer à cátedra na Universidade de
São Paulo. Concorri à cátedra de Ciência Política e ganhei. Mas, quando ouvi o
AI-5 sendo lido, imaginei logo que minha duração na USP seria curta.
Efetivamente, em abril de 1969, esse mesmo AI-5 fundamentou um ato que me
aposentou compulsoriamente, afastando-me da USP. Se fosse para levar ao pé da
letra o AI-5, eu fiquei proibido até de exercer certo tipo de atividade, como a
pesquisa.
Não obstante, nós montamos um centro de
pesquisa, que foi o Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento), e
procuramos resistir com dignidade, mantendo nosso pensamento altivo embora não
na ação política direta, a não ser mais tarde, quando passamos a apoiar o MDB e
os movimentos democráticos em geral, como o movimento pela anistia. Ainda
assim, como conseqüência do AI-5, em 1975, eu e meus companheiros do Cebrap
fomos levados à chamada Oban (Operação Bandeirantes), um órgão de repressão
onde havia tortura, e eu vi gente torturada. Embora isso não tivesse ocorrido
comigo, aconteceu com alguns companheiros de trabalho que tinham, como único
pecado, o fato de ter a cabeça livre. Eles não estavam de forma alguma metidos
em organizações clandestinas ou terroristas. Mas, naquele tempo, tudo era
confundido. O que era uma ação mais crítica era confundido com uma ação
subversiva. Por sorte, o Brasil foi capaz de superar, embora lentamente, esses
anos de chumbo. Hoje, o AI-5 é apenas uma memória negativa de um momento triste
da História do Brasil.
29 de julho de 2012
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