Entrevista: Martha Payne
Garota de 9 anos criou blog para criticar a qualidade da merenda de sua escola. O resultado: 8 milhões de visitas e 356.000 reais para caridade
Martha Payne, autora do blog NeverSeconds e inspiração de Isadora Faber (Divulgação)
Nesta semana, Isadora Faber ganhou status de heroína ao atrair para sua página no Facebook quase 200.000 fãs. Em Diário de Classe, a menina de 13 anos, estudante do 7º ano da Escola Municipal Maria Tomázia Coelho, de Florianópolis (SC), conta os problemas que atingem a maioria das escolas públicas: professores desinteressados, infraestrutura precária e falta de manutenção.
A inspiração, contou Isadora, veio de Martha Payne, uma escocesa de 9 anos que desde abril mantém o blog NeverSeconds ("É proibido repetir o prato", uma ordem de fato vigente na sua escola), onde avalia – e espinafra, por vezes – a merenda servida a ela e aos seus colegas. Martha é um sucesso.
Hoje, seu blog soma quase 8 milhões de visitas e recebeu elogios até do chef e apresentador de TV britânico Jamie Oliver.
Martha diz que foi fácil conseguir o apoio de amigos e professores, mas seu diário on-line despertou a ira do conselho regional de educação, que chegou a proibir a menina de fotografar a comida da escola.
Sem poder alimentar o blog temporariamente com suas próprias fotos, ela abriu o espaço a colaborações - que logo chegavam de todas as partes do mundo.
Martha foi além: deu início a uma campanha internacional para arrecadar dinheiro para crianças que não têm o que comer. Na semana passada, totalizou 110.000 libras (cerca de 356.000 de reais) em doações, dinheiro que será destinado a uma instituição de caridade.
No fim de setembro, Martha vai ao Malaui entregar parte da verba e já está escrevendo um livro sobre a experiência. Na entrevista a seguir, concedida ao site de VEJA, Martha Payne fala sobre como, aos 9 anos, já transformou a vida de tanta gente, inclusive a de Isadora.
Confira:
O que a motivou a fazer o blog?
Em sempre quis escrever diariamente sobre alguma coisa, como os jornalistas. Ao mesmo tempo, eu estava insatisfeita com a merenda da minha escola. Juntei as duas coisas.
Como seus professores e amigos receberam o projeto?
Todos na minha escola gostaram muito da ideia, mas o conselho de educação, que gere as escolas da região, não gostou nada do meu blog.
Você chegou a ser impedida de publicar as fotos, não é?
Sim, o conselho me proibiu de escrever sobre a merenda da minha escola, mas as pessoas começaram a reclamar e eles voltaram atrás. Então, decidi dar voz a crianças de outras escolas. Hoje, pessoas de diferentes partes do mundo escrevem durante uma semana no meu blog contando sobre a comida de seus países.
Com a pressão do conselho, você não pensou em desistir?
Nunca. Estou adorando ter convidados no meu blog. Gostaria até de convidar a Isadora para escrever lá.
Você conversou com seus pais antes de começar o blog?
Sim. Meu pai me ajudou a fazer o blog e também pedi a permissão da escola para esse projeto. A coordenação pediu ao meu pai que me acompanhasse de perto.
Sua vida mudou bastante depois do blog?
Eu me exercito menos agora porque fui convidada a escrever um livro sobre meu blog. Agora também tenho mais amigos fora da Escócia. Um dia quero conhecer todos eles.
E a merenda da sua escola, mudou?
Sim, melhorou!
Você também transformou a vida de muita gente com o seu blog. Como surgiu a ideia de ajudar outras crianças por meio da caridade?
Meu avô me apresentou a Mary’s Meal, uma organização internacional que leva comida a crianças do mundo todo. No ano passado, eu ajudei a organizar um evento na escola e arrecadamos 70 libras (226 reais) para essa organização.
Quando o meu blog ficou famoso, comecei a receber comentários de pessoas do mundo todo e algumas me diziam que eu tinha muita sorte de ter o que comer.
Então, criei um site (www.justgiving.com/neverseconds) para arrecadar dinheiro para as crianças que não têm merenda. Daqui a quatro semanas, vou ao Malaui entregar uma parte do dinheiro que eu levantei.
Você recebe muitos e-mails de crianças que se inspiram no seu blog?
Recebo alguns, sim. Mas o caso da Isadora é o melhor até agora.
Como você se sente inspirando outras crianças?
Fico um pouco nervosa com isso, mas me sinto feliz. As crianças que eu inspiro também inspiram outras crianças.
Que conselhos você dá para a Isadora e para as demais crianças querem fazer o que você faz? Sejam honestas, usem muitas fotos e escrevam o que estão sentindo.
Quais os seus planos para o futuro?
Depois que eu voltar do Malaui, não sei o que vou fazer. Acho que o Malaui me fará pensar bastante sobre a vida. Muito em breve vou completar 10 anos... quem sabe o que vai acontecer?
02 de setembro de 2012
Nathalia Goulart, Veja
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