"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sexta-feira, 12 de outubro de 2012

MAIS BRANDA, LEI ANTIGA DEVE BENEFICIAR RÉUS


Os réus do mensalão condenados pelo Supremo Tribunal Federal por corrupção ativa e passiva, como o ex-ministro José Dirceu (Casa Civil) e o presidente licenciado do PTB Roberto Jefferson, devem receber penas mais brandas do que as previstas na legislação em vigor, segundo ministros ouvidos pela Folha.

Isso porque a maioria dos crimes imputados a esses acusados ocorreu antes de novembro de 2003, quando a legislação penal definia que as penas variavam de 1 a 8 anos de prisão.

Naquele mês, o Código Penal foi modificado, endurecendo as punições para corruptos e corruptores. A mudança estabeleceu que as penas devem variar de 2 a 12 anos.

Segundo os ministros, a "regra de ouro" do direto penal é que uma lei nunca pode retroagir para prejudicar o réu, apenas para beneficiá-lo.

É possível, inclusive, que isso livre alguns condenados do regime fechado --seria improvável uma pena maior do que oito anos, a partir de quando o início do cumprimento é em regime fechado.

Roberto Jayme/UOL/Folhapress
Os ministros Marco Aurélio (à esq.), Celso de Mello, Joaquim Barbosa e Ayres Britto entram no plenário
Os ministros Marco Aurélio (à esq.), Celso de Mello, Joaquim Barbosa e Ayres Britto entram no plenário

Quase todos os fatos apresentados na denúncia pelo Ministério Público, como os acordos de aliança política em troca de dinheiro, boa parte dos pagamentos e as votações importantes, como as reformas da Previdência e tributária, aconteceram até outubro de 2003, ou seja, quando a legislação antiga, mais branda, estava em vigor.

Outros fatos, como repasses a parlamentares e outros membros de partidos (como o ex-PL, o PP e o PTB), porém, ocorreram em 2004, sob a vigência das penas mais duras.

Na avaliação dos ministros ouvidos pela Folha, pode haver divergência quanto às punições nesses casos. Um deles disse que deve considerar a legislação mais antiga, mesmo para os fatos que aconteceram após a mudança legal.

Isso porque os pagamentos feitos em 2004 seriam a concretização da corrupção que, na prática, ocorreu em atos combinados em 2003.

Nada impede, no entanto, que alguns ministros entendam que os atos de 2003 sejam analisados sob o enfoque da lei antiga e os fatos relativos a 2004 pela atual.
Como resultado, condenados pelo mesmo crime receberiam sentenças distintas por conta dessa "peculiaridade", disse um ministro.

CONTINUADO

A mesma discussão ocorre nos casos em que o STF considerar ter havido crime continuado --como o de um réu condenado por corromper alguém por mais de uma vez, ao longo de 2003 e 2004.

Há quem diga que, apesar de o crime continuado envolver vários atos criminosos, considera-se apenas o primeiro --os demais são vistos como um prolongamento--, aplicando o que dizia a lei na época do primeiro crime.

O Código Penal, porém, define que nesses casos o juiz deve estabelecer a pena mais grave e, a partir dela, aumentar em até dois terços. Por essa interpretação, a lei atual poderia ser utilizada.

12 de outubro de 2012
FELIPE SELIGMAN, DE BRASÍLIA

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