A expansão do crack reclama ações urgentes em duas frentes, a do abastecimento e a do consumo.
Ambas têm indicadores alarmantes. O Brasil, que já se consolidou na triste posição de rota preferencial do tráfico internacional de cocaína, parece caminhar para também ocupar um lugar de ponta no mercado mundial dessa droga, segundo projeções da ONU.
Atualmente, somos o terceiro no mundo no ranking dos maiores consumidores da terrível substância. A previsão das Nações Unidas se assenta nessas duas evidências: o consumo interno aquecido e as rotas que asseguram o movimento de exportação e importação de entorpecentes são inquestionável sinal de que a situação pode descambar para o descontrole.
Na ponta do provimento do mercado, deve-se recorrer a ações integradas das três instâncias do poder público, com ênfase na repressão aos grupos de traficantes e à rede criminosa que garante a circulação da droga.
Disseminado por praticamente todo o país, o crack já causa problemas no sistema de saúde de 64% das cidades brasileiras, diz a Confederação Nacional de Municípios.
O Brasil consome até uma tonelada de crack por dia, segundo a Polícia Federal. Com tais números, o combate ao tráfico para asfixiar o abastecimento dos pontos de venda é uma unanimidade.
Já na outra ponta do problema, a das consequências, as ações envolvem questões mais complexas, principalmente no âmbito do tratamento a ser dispensado aos usuários.
Em São Paulo, o poder público retomou a política de recolhimento, nas cracolândias, e internação compulsórios de viciados.
O Rio divide-se entre adotar ou não essa linha de ação, ora hesitando em seguir tal procedimento, ora fazendo incursões em áreas de comércio e consumo da droga atrás de viciados.
A dificuldade de estabelecer uma política unificada, em todo o país, nessa ponta do flagelo, implica levar mais a fundo as discussões sobre os procedimentos mais indicados para enfrentá-lo. Algumas iniciativas são inquestionáveis (ainda que, infelizmente, a unanimidade sobre a sua necessidade não seja capaz de superar leniências do poder público na sua adoção).
É crucial, por exemplo, que qualquer política de redução de danos parta do princípio de que o crack espalha-se pelo país com características de uma epidemia — terreno, portanto, de tomar providências na área da saúde pública.
Também é imprescindível que municípios e estados criem sistemas multidisciplinares de atendimento (médico, psicológico, social) aos viciados, com a criação de espaços de acolhimento que não sejam meros depósitos de ineficazes programas de “prende-solta”.
Ao contrário, devem funcionar como estágio de recuperação dos usuários. Dentro dessa filosofia, o acolhimento compulsório tem de ser a última instância — aquela em que estão em jogo a vida, a integridade física do viciado, bem como a preservação da segurança da sociedade — e não a linha preferencial das ações de combate ao crack.
13 de fevereiro de 2013
Editorial O Globo
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