"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



quinta-feira, 28 de março de 2013

EM APOIO AO PASTOR

Leio no Estadão de hoje que, na tentativa de retirar o deputado e pastor evangélico Marco Feliciano do comando da comissão de Direitos Humanos, uma vez que ele se recusa a renunciar, o PPS decidiu entrar na próxima terça-feira, 2, com processo por quebra de decoro parlamentar contra o pastor no Conselho de Ética do Congresso. O colegiado tem a possibilidade de decidir por um afastamento de Feliciano da função. "Precisamos acabar de vez com a situação vexatória vivida na a Câmara desde a eleição do pastor para presidir o colegiado", afirmou o deputado Arnaldo Jordy (PPS-PA).

Para o PPS, além das acusações de racismo e homofobia, o pastor precisa explicar denúncias de uso irregular de verbas de sua cota na Câmara. Jordy alega que Feliciano paga com dinheiro público escritórios de advocacia que lhe defendem em processos de interesse pessoal. O pastor nega irregularidade. O deputado do PPS defendeu ainda como outra alternativa uma renúncia coletiva dos integrantes da comissão de Direitos Humanos, mas a idéia deve ser descartada pelos líderes porque a maioria do colegiado é composta por apoiadores do pastor.

Medíocres tempos estes nossos, em que me vejo obrigado a defender um pastor evangélico. Que o deputado seja afastado por uso irregular de verbas, é normal. Se bem que assim sendo, o Congresso ficaria reduzido à metade, ou muito menos. Que seja afastado por opinião, é voltar aos tempos da ditadura. É o que quer um punhado de gatos pingados, que constituem certamente a minoria mais barulhenta do país.

Quem me acompanha sabe que sou ateu e mantenho uma distância crítica de todas as religiões. Apesar de ser ateu, defendo a existência de todas elas. Se o ser humano gosta de ser enganado, amém! Mas os tais de pastores evangélicos há muito deviam estar na cadeia. Não administram religiões, mas caça-níqueis. Isso sem falar no exercício ilegal da medicina. Em cada emissão televisiva, os milagres superam de longe o número de milagres que Cristo realizou em toda sua vida. Ocorrem em cadeia industrial, ao ritmo de dois ou três por minuto. O pastor até parece entediar-se com a freqüência dos mesmos e descarta rapidamente o miraculado que tem nos braços para abraçar o seguinte.

Durante algum tempo, dediquei alguns minutos na madrugada para assistir às pregações dos pastores. (Ultimamente, cansei). Não que pretendesse ouvir suas baboseiras. O que me fascinava era ver aqueles templos imensos lotados, com quatro mil, cinco mil ou mais pessoas, sem que se veja uma só cadeira vazia, todos fanatizados por um discurso estúpido e obviamente desonesto. Gosto de ver quando a câmera foca rostos. Pessoas de boa aparência, com traços até mesmo inteligentes, hipnotizadas pela lábia precária do pastor.

É meu modo de entender melhor o mundo. Vivo em um pequeno universo rarefeito, de poucos amigos, todos cultos e inteligentes. Corro o risco de achar que o mundo é mais ou menos assim. A televisão então me mostra, sem que eu precise sair de casa, a verdadeira face dessa pobre humanidade. Os pastores, sem nenhum pudor, ensinam como preencher cheques e boletos bancários.

Ainda há pouco, o pastor Silas Malafaia – muito admirado pelo recórter tucanopapista hidrófobo da Veja, o Reinaldo Azevedo – pedia 1000 reais de cada crente, com a promessa de bênção financeira e salvação de almas. O objetivo era conseguir um milhão de ofertantes e garantir com isso a salvação de um milhão de almas.

Mais ainda: não contente de cobrar o dízimo, Silas Malafaia inventou o trízimo, que cobra até dos desempregados. Pede quantia equivalente ao dinheiro do aluguel, com a promessa de casa própria para o pobre diabo. Em pleno século XXI, ainda há quem caia nesse tosco conto do vigário.

O pastor Feliciano pertence à mesma raça de vigaristas. Mas vigarista por vigarista, o Congresso está cheio deles. Feliciano foi eleito deputado com mais de cem mil votos, e eleito presidente da Comissão de Direitos Humanos por seus pares. Contra a vontade do dito povo e dos demais deputados, ergueu-se uma chusma de ativistas, que querem retirar o deputado da presidência da comissão. Querem afastar o deputado no grito. Só porque teria manifestado sua condenação aos homossexuais – que antes de ser dele é bíblica.

E por ter dito uma frase infeliz sobre os africanos, como se Lula não disse frases atrozes todos os dias. Ou alguém não mais lembra quando Lula, em entrevista à Playboy, em 1979, manifestou sua admiração por Hitler: "O Hitler, mesmo errado, tinha aquilo que eu admiro num homem, o fogo de se propor a fazer alguma coisa e tentar fazer". Este senhor chamava-se – e ainda se chama – Luís Inácio Lula da Silva. Jamais ouvi alguém chamá-lo de nazista. Nazista é adjetivo reservado ao deputado Bolsonaro que, pelo que me consta, jamais manifestou apreço ao Fürher.

Não bastasse sua admiração pelo ditador alemão, manifestou seu apreço pelo celerado iraniano, o aiatolá Khomeini: "Eu não conheço muita coisa sobre o Irã, mas a força que o Khomeini mostrou, a determinação de acabar com aquele regime do xá foi um negócio sério".

Foi eleito e reeleito. O deputado Feliciano, também eleito, é instado a renunciar, por suas opiniões sobre homossexualismo. O pastou bate pé e diz que não renuncia. Espero que não. Porque no dia em que um deputado legitimamente eleito para uma comissão tiver de renunciar em função da gritaria de baderneiros, acabou a democracia no país.

O deputado Natan Donadon foi considerado culpado pelo Supremo em outubro de 2010 por supostamente liderar uma quadrilha que desviava recursos da Assembléia Legislativa de Rondônia. Os desvios teriam ocorrido entre 1995 e 1998, num total de R$ 8,4 milhões. A condenação foi decidida por 7 votos a 1, com pena de 13 anos, 4 meses e 10 dias de prisão em regime fechado, além de multa. O deputado não foi preso porque poderia recorrer em liberdade. Continua exercendo seu mandato, sem que ninguém peça sua renúncia.

Isso sem falar em Renan Calheiros, recordista de atos secretos - 260 de 663 atos tabelados - em favor de aliados, que hoje preside o Senado. Verdade que houve tímidos protestos na avenida Paulista, e outros no Facebook, por parte da militância de sofá. Mas ninguém foi bagunçar as sessões que preside no Congresso.

Ou José Genoíno e João Paulo Cunha, condenados pelo STF no julgamento do mensalão. Genoíno, condenado a seis anos e 11 meses pelos crimes de formação de quadrilha e corrupção, impertérrito, assumiu a vaga que ocupava como suplente pelo PT. João Paulo Cunha, condenado também pelo STF a nove anos e quatro meses pelos crimes de peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro, continua exercendo o cargo de deputado federal pelo PT. Condenados por desobedecerem a lei, hoje elaboram leis. Não ouço protesto algum das esquerdas contra estes senhores.

Ou seja, de formação de quadrilha, corrupção, peculato e lavagem de dinheiro pode. O que não pode é manifestar-se contra o homossexualismo, direito de todo cidadão.

As badernas promovidas pela chusma de bagunceiros não seriam toleradas nem em bordel. Só são toleradas no Congresso Nacional. Se alguém ainda tem algum apreço pelo Estado de direito, urge apoiar o pastor.

O tempora, o mores.


28 de março de 2013
janer cristaldo

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