Se é possível você se opor ao PT durante toda a sua carreira política, tornar-se vice-governador de São Paulo na chapa do governador eleito pelo PSDB, para depois, às vésperas de novas eleições, passar para o lado do PT em troca de um ministério criado de última hora para abrigá-lo, tudo o que se faça no seu ramo de atuação daqui para frente deverá ser visto como algo natural. Absolutamente natural.
Afif Domingos acumula desde a semana passada as funções de vice-governador de São Paulo com as de ministro da Secretaria da Micro e Pequena Empresa.
Servirá ao mesmo tempo a dois governos comandados por partidos que são ferozes desafetos.
Para não ser forçado a assumir o governo de São Paulo caso Geraldo Alckmin viaje ao exterior, Afif será obrigado também a deixar o país. A não ser que assuma. Por hora, hesita. Pensará melhor a respeito.
Por que Afif não renuncia ao cargo de vice-governador?
Resposta dele: porque nada o obriga a isso.
A vergonha deveria obrigá-lo, mas Afif não a leva em consideração.
Seguirá desfrutando das vantagens e benefícios que lhe oferece o cargo de vice-governador? Ou abrirá mão deles em favor das vantagens e benefícios que lhe garantirá o cargo de ministro?
Faça política há muito tempo e você verá que ela e vergonha são incompatíveis!
Como vice-governador, Afif tem acesso a informações sigilosas sobre São Paulo, o mais rico e poderoso Estado do país e jóia da coroa da oposição.
Quem garante que não as compartilhará com Dilma Rousseff, sua nova patroa? Afinal, ela é a presidente da República. Deve ser uma pessoa bem informada. Estão em jogo os superiores interesses do país!
Lula foi duramente criticado por ter inventado ministérios e cargos só para distribui-los com aliados de ocasião. Afirma-se que nenhum presidente loteou mais seu governo do que Lula.
Com licença: e Dilma? O que a diferencia de Lula em tal quesito?
No seu primeiro ano de governo, Dilma afastou ministros e partidos suspeitos de corrupção. Para se reeleger, carinhosamente chamou-os de volta. E eles voltaram, felizes.
Sem fazer alarde, Dilma dedica-se nos últimos meses a tapar todas as frestas por onde possa entrar oxigênio suficiente para fortalecer seus eventuais adversários nas eleições do próximo ano. Ou pelo menos para mantê-los vivos.
O PSD de Afif poderá vir a apoiá-la presenteando-a com seu tempo de propaganda no rádio e na tv? Solta logo um ministério para adoçar a boca dele.
Um milionário do Mato Grosso do Sul encantou-se com a retórica e os belos olhos azuis de Eduardo Campos, governador de Pernambuco e aspirante a candidato a presidente pelo PSB?
Manda o vice-presidente da República oferecer a legenda do PMDB para que ele concorra ao governo do seu Estado. Certamente deve dinheiro e favores ao BNDES. Não desejará sofrer um aperto.
O governador de Santa Catarina flerta com Eduardo?
Flertava.
Dilma recebeu-o outro dia. E na presença do ex-prefeito Gilberto Kassab, de São Paulo, garantiu-lhe ajuda para que governe bem.
"Tudo que lhe darei servirá de desculpa para que você me apoie", ensinou Dilma com a refinada sutileza que dita seus gestos. "Não é preciso. Eu a apoiarei de todo jeito", respondeu o governador, encabulado.
O aperto de mão trocado por Lula e Paulo Maluf nos jardins da mansão de Maluf no ano passado ficou como o mais notável símbolo da eleição de Fernando Haddad para prefeito de São Paulo.
Símbolo da conversão reafirmada do PT à política do vale tudo e qualquer coisa pelo poder.
Até aqui, somente até aqui, a entrega a Afif de um ministério sem a contrapartida do seu afastamento do governo de São Paulo é o mais sério candidato a símbolo da provável reeleição de Dilma.
13 de maio de 2013
in Ricardo Noblat
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