Um evento isolado não é detonador de inflação. Normalmente, os preços sobem como resultado de um conjunto de problemas. A alta do dólar agora é um complicador porque se soma a todos os fatores que têm mantido a inflação alta, apesar do baixo crescimento do PIB. O trabalho do Banco Central ficará um pouco mais difícil a partir do salto de 7% que o câmbio deu no mês de maio.
O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, disse no fim de semana em Istambul que a alta do dólar é um fenômeno mundial e que o “repasse do dólar para a economia brasileira é limitado”.
O fato de ser um fenômeno mundial, ou seja, a moeda americana estar subindo no mundo inteiro, não significa que não nos afeta. Complica mais um pouco. Mas o Banco Central nem por isso tem que tentar intervir para derrubar o dólar; pode fazê-lo — como explicou o presidente do BC — para evitar o excesso de volatilidade.
O câmbio é uma relação delicada. Se sobe muito, encarece o endividamento externo dos países e das empresas; se cai muito, prejudica a balança comercial. Quando o governo decide defender uma dada taxa de câmbio acaba enfrentando corridas contra a moeda local. O dólar incomoda quando sobe, incomoda quando cai. Basta ver as declarações das autoridades a cada movimento mais acentuado.
Desde o final do ano passado houve vários desses momentos assim. O dólar subiu bastante no ano passado, e o ministro da Fazenda sempre comemorou o fato como um sinal de que isso ajudaria os exportadores. Chegou a dizer, em novembro, que o câmbio acima de R$ 2 tinha vindo para ficar.
A ideia geral que passou foi de que se tentaria desvalorizar mais o real. Quando o dólar se aproximou de R$ 2,15, o Banco Central entrou derrubando e isso inverteu totalmente a curva. E o entendimento geral foi que o BC estava tentando derrubar o dólar para melhorar a inflação.
Quando, no final de janeiro, chegou a ameaçar ficar abaixo de R$ 2,00, o ministro Guido Mantega disse que o governo não estava mudando a política cambial e que não permitiria a “valorização especulativa” da moeda. Na época, Mantega disse: “É verdade que no passado tivemos elevação do dólar e nós apoiamos. Tivemos 20% de desvalorização do real e isso afeta a inflação”, disse.
O “apoio” dado à alta do dólar quando ele estava fraco no resto do mundo foi dado na convicção de que isso afetaria favoravelmente a balança comercial e não teria maior impacto na inflação. Ocorre que o Brasil está com déficit na balança comercial e inflação alta.
O resultado da balança comercial de maio foi o melhor número do ano, mas foram magros US$ 760 milhões de superávit. No ano, o déficit está em US$ 5,4 bilhões. A Associação do Comércio Exterior do Brasil (AEB) vai rever a projeção da balança comercial só em julho, mas o presidente da associação, José Augusto de Castro, disse que dá para explicar esse resultado pelas exportações de soja, minério de ferro e petróleo. Só de petróleo, em quantidade, a queda é de 45%, em grande parte pela produção menor da Petrobras.
O real mais fraco é uma das causas da inflação mais alta. Desde 2011, nossa moeda vem perdendo valor ano a ano. Em janeiro de 2011, o dólar valia R$ 1,65. Chegou a cair para R$ 1,55 em abril daquele ano, mas fechou em R$ 1,87, numa valorização de 13% no período.
No ano seguinte, nova alta do dólar, que fechou em R$ 2,04, ganhando 9%. Na sexta-feira, fechou em R$ 2,14, com valorização de 5% desde janeiro e alta de 7% em maio. Ao todo, a moeda americana ficou 30% mais forte desde que a presidente Dilma tomou posse e escolheu a política de uma moeda mais desvalorizada.
04 de junho de 2013
Míriam Leitão, O Globo
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