"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

QUEM É PAULO VENTURA? AÉCIO? DIL MA?

O brado retumbante de Guilherme Fiúza
Foto: Divulgação / TV Globo / Estevam Avellar

QUEM É PAULO VENTURA? AÉCIO? DILMA? EM ENTREVISTA AO 247, UM DOS AUTORES DA MINISSÉRIE DA GLOBO QUE TROUXE A POLÍTICA DE VOLTA À TELEVISÃO REVELA QUAIS FORAM AS REFERÊNCIAS E INSPIRAÇÕES PARA CRIAR OS PERSONAGENS DA TRAMA
22 de Janeiro de 2012 às 15:40

Leonardo Attuch _247 – O jornalista Guilherme Fiúza tem provado a cada livro que é um dos grandes talentos da nova geração brasileira de escritores. Como poucos, ele sabe contar uma história, seja ela sobre um jovem de classe média que se torna traficante (“Meu nome não é Johnny”), uma garota idealista que se embrenha na selva para produzir couro vegetal (“Amazônia: 20º andar”), um humorista que conquistou o Brasil (“Bussunda, a vida do Casseta”) e até sobre economistas que enfrentam a inflação (“3000 dias no bunker”).

Guilherme, portanto, é versátil. E, como fala de tudo, também fala de política. Sua verve de colunista devotado ao mundo do poder se desenvolveu na revista Época, onde ele escreve duas vezes por mês, e chegou agora à televisão numa minissérie da Rede Globo, que tem dado o que falar, chamada “O Brado Retumbante”, escrita por uma equipe composta por Euclydes Marinho, Nelson Motta, Denise Bandeira e o próprio Fiúza.

Como tudo que se passa no império da família Marinho, essa produção também dá margem a teorias conspiratórias.

Afinal, o que quer a Globo com uma produção política em pleno horário nobre?

Seria Paulo Ventura, o presidente fictício do "Brado Retumbante", Aécio Neves, como muitos chegaram a desconfiar? Seria uma versão masculina de Dilma Rousseff, uma vez que chega quase que por acaso à presidência da República e é forçado a fazer sua faxina ministerial?

Com a palavra, Guilherme Fiúza.

247 – Quais foram as suas referências para criar os personagens da série?

Guilherme Fiúza – Há vários pontos de conexão com a realidade contemporânea. Criamos um enredo quase surreal para levar uma pessoa comum, e honesta, à presidência da República. O Paulo Ventura é um cara que faz um blog, é aclamado deputado federal, torna-se presidente da Câmara num arranjo não conduzido por ele e assume a presidência depois que o presidente e o vice morrem num acidente. De repente, temos lá uma pessoa de classe média que passa a ter a perspectiva do poder, sem ter sido um profissional da política.

247 – Mas, na série, há várias referências a acontecimentos recentes: livros didáticos comprados pelo MEC que contam a história com um viés ideológico, organizações não-governamentais que sobrevivem com dinheiro governamental, ministros que se corrompem em nome do partido e assim por diante...

Fiúza – A referência, de fato, é o Brasil de 2012, embora a história seja ficção. Retratamos uma ocupação parasitária do Estado, onde os partidos e seus ministros estão lá para sugar os recursos públicos. Mas, de repente, esses ministros se deparam com um presidente que não está disposto a fazer o jogo tradicional da política.

247 – O Paulo Ventura pode ser uma versão masculina da presidente Dilma?

Fiúza – Não creio, até porque esse Estado ocupado tem muito o sotaque do PT e de sua base aliada, ainda que o governo da Dilma seja diferente do governo do Lula.

247 – Bom, mas como ele não resiste a um rabo de saia, também tem sido comparado ao senador Aécio Neves. Faz sentido?

Fiúza – Todas as referências que nós buscamos foram de pessoas que já passaram pela presidência, como o Fernando Henrique, o Lula e o JK, e não de futuros pretendentes. Mas até achei parecida uma comparação com uma foto do Aécio e uma do Domingos Montagner, que interpreta o Paulo Ventura. Fora isso, não há qualquer semelhança. O Aécio é um profissional da política. O Paulo chegou lá por acidente.

247 – Dias atrás, o seu presidente demitiu o ministro da Agricultura. Alguma referência ao Wagner Rossi?

Fiúza – Foi até engraçado, porque esse episódio foi escrito antes do escândalo do Wagner Rossi. Mas, em certos aspectos, o Brasil acaba sendo previsível.

247 – Quando você começou a escrever essa história?

Fiúza – O projeto, do Euclydes Marinho, tem dois anos. E nós, que fazemos parte dessa equipe liderada por ele, começamos a escrever em outubro de 2010, antes da posse da Dilma.

247 – Num projeto da Rede Globo, muitas pessoas buscam teorias conspiratórias. Como você encara isso?

Fiúza – É natural. Como se trata do maior grupo de comunicação do País, as pessoas querem saber qual é a mensagem subliminar. Mas não há nenhuma. Por parte da Globo, não houve nenhum veto e nenhuma sugestão, a não ser o pedido para que os personagens não tivessem nomes parecidos com os de pessoas reais.

247 – Mas o telespectador acaba enxergando um Fernando Haddad no ministro da Educação, um Wagner Rossi no da Agricultura e assim por diante.

Fiúza – Pois é. Ontem me ligaram dizendo que a Neide Batalha, escritora que industrializa as teses da esquerda e mora na Vieira Souto, seria o Emir Sader.

247 – E é?

Fiúza – Eu só me divirto com as leituras que as pessoas fazem.

247 – A primeira-dama Antônia, interpretada pela Maria Fernanda Cândido, vem ganhando força na história. Não deveria ser ela a presidenta?

Fiúza – De fato, ela tem dado um show, como no episódio em que contestou o ministro da Educação na compra dos livros de história contaminados pela ideologia. Além de belíssima, é uma mulher que tem vida própria e não se deslumbra com os encantos do poder. Neste caso, confesso que tivemos sim uma inspiração, que foi a Dona Ruth Cardoso.

247 – Um pouco melhorada...

Fiúza – Devo admitir.

247 –
Esse casal Antônia e Paulo Ventura não parece utópico demais? Vai conseguir resistir ao jogo das pressões políticas e da governabilidade?

Fiúza – É utópico. Mas por que não?

247 – Sim, mas a questão é: ele termina seu mandato?

Fiúza – Essa é uma boa pergunta. Eu diria que ele ainda terá muitas oscilações, com seus altos e baixos. Já sofreu até uma tentativa de atentado e terá problemas de popularidade.

247 – Na revista Época, você foi um crítico ácido do governo Lula e também de Dilma quando candidata. Hoje, uma pesquisa revela que ela tem aprovação superior à dos dois antecessores: Lula e FHC. Ela o surpreendeu?

Fiúza – O que me surpreende é ver como os estratos superiores da sociedade se enganam em relação à Dilma. Nesse primeiro ano de governo, o que houve foi um não governo. Nunca vi tanto capital político ser desperdiçado. Por mais que ela tenha tido o mérito de moderar algumas posições na área internacional, especialmente no caso do Irã, este é um governo que termina o primeiro ano sem nenhum projeto, nenhuma ideia. Nunca achei que isso pudesse acontecer.

247 – Como analista político, você não reconhece nenhum progresso?

Fiúza – A marca foi a faxina. Mas uma faxina feita a contragosto e a reboque da imprensa. Não se avançou na infraestrutura, na questão tributária, em nenhum setor. O que temos é pura espuma. O que eu enxergo, na verdade, é um apagão administrativo.
http://www.brasil247.com.br/pt/247/midiatech/37173/O-brado-retumbante-de-Guilherme-Fi%C3%BAza.htm

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