Aproximação da elite econômica com as classe mais baixas pode ser a resposta para a sobrevivência do sonho americano
Só porque Newt Gingrich é um deles, isso não significa que ele está errado quando reclama que os Estados Unidos são comandados por uma elite alienada. As provas podem ser encontradas em um livro publicado nessa semana por Charles Murray, co-autor de The Bell Curve (“A Curva do Sino”), livro que, em 1994, criou polêmica ao apresentar associações entre raça e inteligência. Coming Apart: The State of White America 1960-2010 (“Separando: O Estado da América Branca 1960-2010”) está repleto de ideias sobre os problemas que assolam os Estados Unidos.
David Brooks, um colunista conservador do New York Times, acredita que esse será o livro mais importante do ano para a sociedade norte-americana. E mesmo aqueles que não forem convencidos pelas ideias de Murray, terão a chance de entender os males que atacam os Estados Unidos na visão conservadora, um assunto não menos fascinante. Embora não seja sua meta principal, o livro reúne quatro temas ouvidos incessantemente na campanha republicana: a divisão cultural entre os valores tradicionais e os da elite (um dos assuntos favoritos dos membros do Tea Party); a defesa dos valores religiosos e familiares (a base da plataforma de Rick Santorum); a excepcionalidade norte-americana (mencionada por todos os candidatos); e (a favorita de Mitt Romney) o perigo dos Estados Unidos se tornarem um Estado de bem estar social no molde dos países europeus.
Murray começa lamentando o isolamento da nova classe alta, que ele define como os 5% mais bem sucedidos dos adultos. Essas pessoas não são apenas ricas, mas também são excepcionalmente espertas, porque os Estados Unidos se especializaram em mandar suas mentes mais brilhantes para as mesmas universidades elitistas, nas quais eles se casam entre si, e dão a sua prole não apenas o conforto da riqueza, mas também uma vantagem cognitiva que dá a essa classe sua impressionante estabilidade.
A nova elite não é simplesmente isolada culturalmente. Ela também vive num mundo à parte, em bolhas como a porção sul da 96th Street (onde a proporção de adultos com diplomas universitários cresce de 16% em 1960 para 60% em 2000) e um pequeno número de “SuperZips”, bairros nos quais a riqueza e o sucesso acadêmico estão mais concentrados. Esses bairros têm populações brancas e asiáticas maiores que o resto dos Estados Unidos, com índices menores de crimes e famílias mais estáveis. Não são, ao contrário do que acredita Gingrich, bairros necessariamente “liberais”: muitos dos moradores dos SuperZips votaram nos republicanos em 2004. Mas sem dúvida, são pessoas distantes da realidade do país.
No século XIX, Alexis de Tocqueville se impressionou com o fato dos poderosos dos Estados Unidos não estarem alheios ao resto do povo. Isso, diz Murray, não acontece mais. Ele deduz que essa classe comanda os Estados Unidos, mas toma decisões com base em vidas atípicas. Um grande abismo cultural separa essa elite dos outros norte-americanos. Eles dificilmente assistem Oprah ou Judge Judy. Na verdade, eles nem assistem muita televisão. Eles comem em restaurantes, mas dificilmente vão à Applebees’s, ao Denny’s, ou à Waffle House, cadeias mais ligadas ao gosto comum. Eles podem ler a Economist, juntamente com o New York Times, o Wall Street Journal, e talvez a New Yorker ou a Rolling Stone. Eles bebem vinhos e cervejas artesanais (e podem discuti-las como especialistas), mas de maneira moderada, e raramente fumam cigarros.
Boa parte dos comentários sobre a elite norte-americana vem acompanhada de um rancor (Gingrich), ou é movida pela desigualdade (Occupy Wall Street) ou pela “justiça” (Barack Obama). Por outro lado, Murray não parece ter nada contra essa classe de bons pais e bons vizinhos. Ele só quer que a elite saiba mais e se importe mais com o resto do país. E ao invés de simplesmente abrir mão de uma parcela maior do seu dinheiro, ele gostaria que ela ensinasse seus valores ao resto dos Estados Unidos.
Quem mais precisa de instrução são os novos pobres, talvez um quinto da população branca do país (Murray excluiu negros e latinos, simplificando sua tese ao tirar as etnias da equação), que está à beira do colapso. Muitos de seus homens não trabalham; muitas de suas mulheres criam seus filhos fora do casamento; a devoção religiosa está em declínio. Nos bairros mais pobres, a união das comunidades desapareceu. A família, o orgulho profissional, a religiosidade e o senso de comunidade desapareceram: essa, diz Murray, são “as coisas da vida”. Livre-se delas e você bloqueará o caminho para a felicidade.
E então surge o discurso obrigatório sobre as falhas na excepcionalidade norte-americana. Para Murray, o que está em jogo não é apenas o futuro da classe mais baixa, mas “o projeto norte-americano”. Jefferson pensava que o Estado deveria impedir que as pessoas machucassem umas às outras, mas que exceto por essa questão, deveria deixar a população livre “para regular suas próprias buscas de industrialização e desenvolvimento”. Mas e se uma proporção cada vez maior de norte-americanos perdesse as virtudes que fazem deles membros atuantes de uma sociedade livre? O perigo previsto por Murray está na possibilidade do país copiar o erro da Europa e designar a tarefa de consertar famílias e comunidades a governos burocráticos que estão fadados ao fracasso. A classe mais alta pode concordar com isso, porque é mais fácil pagar impostos mais altos do que se envolver na vida de cidadãos que os ricos já não conseguem mais compreender.
Os Estados Unidos irão se transformar na Europa e a ideia de Jefferson morrerá.
Murray conclama “um grande despertar civil”, no qual a elite sairá de seus SuperZips para convencer os manos afortunados a se casarem, trabalhar mais duro, e tornarem-se melhores vizinhos. Brooks acredita que o serviço nacional aproximaria as classes. Os candidatos republicanos acreditam que qualquer que seja a resposta, ela não deve custar nenhum centavo a mais.
Mas como será que a classe mais baixa responderá ao ouvir que a ajuda de que precisa é uma injeção de moralidade? Murray acredita que seus números mostram que aqueles que seguem sua receita são capazes de viver vidas plenas com quase qualquer nível de renda. Ele pode ter razão, mas aqueles nas classes mais altas que derem atenção a seu chamado, provavelmente deixarão a Mercedes-Benz em casa quando partirem para o Denny’s em sua missão de persuasão.
4/02/2012
Fontes:The Economist
Um painel político do momento histórico em que vivem o país e o mundo. Pretende ser um observatório dos principais acontecimentos que dominam o cenário político nacional e internacional, e um canal de denúncias da corrupção e da violência, que afrontam a cidadania. Este não é um blog partidário, visto que partidos não representam idéias, mas interesses de grupos, e servem apenas para encobrir o oportunismo político de bandidos. Não obstante, seguimos o caminho da direita. Semitam rectam.
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A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)
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