Ou: Petistas têm profundo desprezo por seus aliados
Bem, bem, bem…
No texto que escrevi sobre o transe que vive o governo Dilma no Congresso, apontei o fator “incompetência”, quase sempre subestimado nas análises. E por que o subestimamos? Para tornar a vida mais interessante, acho eu.
É mais agradável pensar que a nossa tarefa é desvendar uma estratégia, descrever os seus meandros, detalhar suas intenções secretas, identificar as forças ocultas que atuam para dar uma determinada configuração à narrativa. Admito: às vezes, é assim mesmo; precisamos, de fato, entender a trama, a urdidura. Mas há casos em que as pessoas são apenas… incompetentes.
Na Folha Online, Maria Clara Cabral conversa com o deputado Jilmar Tatto (SP), nada menos do que líder do governo na Câmara. É uma coisa realmente espantosa. Eu sou um homem justo, mesmo com aqueles por quem não tenho apreço político. Esse cargo já foi do mensaleiro José Genoino (quando o PT era oposição), que era notavelmente competente na função porque, lamento reconhecer!, inteligente. Tatto? Huuummm…
Quem não é de São Paulo ignora tal fato, cujos detalhes se encontram em vários sites por aí. Tatto é o representante de uma família imensa de políticos, que dominam — em sentido literal e figurado — uma área pobre da periferia de São Paulo chamada Capela do Socorro. Nome antigo!
O atual é “Tattolândia”, tal o controle que a turma exerce por ali. A família, uma verdadeira legião, dá as cartas. Na campanha à Prefeitura de 2004, representantes dos donos do pedaço, todos muito robustos, treinados para o choque, em forma de tropa, tentaram impedir o PSDB de fazer campanha. Gritavam: “Tá tudo dominado, tá tudo dominado”. Nada se parece mais com o sertão, O MENTAL, do Brasil do que a Tattolândia.
Uma pesquisa sobre os métodos da família lhes será muito instrutiva. Reproduzo, por exemplo, trecho de uma reportagem da VEJA de 24 de junho de 2006.
Volto em seguida.
(…)
Sempre se soube que uma das principais fontes de renda do PCC, organização criminosa formada por presos e ex-presos das cadeias paulistas, era o mercado de lotações - ou de peruas, como são genericamente chamados os microônibus e as vans que circulam por São Paulo como uma alternativa ao transporte público coletivo. O PCC não só domina parte das linhas do sistema como também extorque cooperativas que, sem ligação com ele, operam no setor. Há três semanas, a polícia prendeu Luiz Carlos Efigênio Pacheco, presidente da Cooper Pam, uma das principais cooperativas de perueiros da capital paulista, suspeita de ligação com a organização criminosa. Conhecido como “Pandora”, o perueiro é acusado de ter financiado, com dinheiro de lotações, uma tentativa frustrada de resgate de preso de uma cadeia de Santo André (região do ABC paulista), em março passado.
Detido, ele negou pertencer ao crime organizado, mas admitiu a infiltração do PCC no setor perueiro e disse que foi por ordem de Jilmar Tatto, ex-secretário de Transportes da prefeita Marta Suplicy, que sua cooperativa incorporou integrantes da organização criminosa. As duas afirmações, graves, constam do depoimento que Pandora deu formalmente à polícia. Uma terceira informação, porém, ainda mais grave, ficou de fora do inquérito. Ela foi dada por Pandora ao delegado Marcelo Fortunato, que o prendeu. Segundo disse o presidente da Cooper Pam, o ex-secretário de Marta recebeu 500.000 reais para favorecer um grupo de perueiros ligados ao PCC no processo de licitação para a exploração da região sul da capital.
(…)
Retomo
Já fui processado por dois Tattos por uma única reportagem publicada na revista Primeira Leitura. Não havia acusação nenhuma lá. O texto limitava-se a descrever os métodos da família. Felizmente, prevaleceram o direito à liberdade de expressão do jornalista e o direito direito da população à informação.
Fiz essa breve digressão para demonstrar que indivíduos podem fazer a diferença até no petismo. Pois bem. Volto ao texto da Folha.
A repórter resolveu ouvir Jilmar Tatto, agora líder do PT na Câmara sobre a crise. Como foi noticiado, uma boa fatia da base governista afirmou que só vota a Lei Geral da Copa quando houver uma data para a votação do Código Florestal. Pensando, quem sabe?, estar na Tattolândia, Jilmar afirma:
“A oposição pode falar isso, agora, a base falar: ‘nós queremos a data’. Isso não pode. Olha a situação do governo! A base falando publicamente, pedindo para marcar a data. Que história é essa? O governo quer discutir mérito”!
Eita! Que história é essa de “que história é essa”??? Partidos nomeiam seus líderes nas duas Casas — e também o governo — porque se supõe que deva existir uma negociação entre o Executivo e o Legislativo, não? Se, nos Parlamentos do mundo, a base jamais se rebelasse, estaria extinta a independência entre os Poderes. “Ah, mas é por uma má causa que a base está rebelada”. Huuummm… Eu, pessoalmente, não considero o Código uma causa ruim — muito pior me parece a forma que tomou a tal Lei Geral da Copa, ela, sim, um estupro institucional.
Tatto saiu ontem atirando contra os “ruralistas”. Sabem como é… Acostumado a chefiar a Tattolândia, não gosta de rebeliões. E aqueles rapagões fortes que tentaram impedir os tucanos de entrar na Capela em 2004 não puderam atuar. Tentando consertar, afirma à Folha:
“Eu não falei mal dos ruralistas ontem, falei dos predadores; agora, se alguém vestiu a carapuça [...]. O clima ontem estava péssimo em função de toda a situação, agora vamos diminuir o tom do discurso se isso ajudar a aprovar a Lei Geral da Copa [...]. Estou mudando meu discurso, estou mais ‘light’, vamos ver se assim a gente se entende”.
Parabéns, deputado Tatto! Tato assim nunca antes na história da Câmara!
Então o senhor só criticou “os predadores”. Quem não quiser se sentir “um predador” deve concordar com o governo. É um jeito de ver a política… Mas gosto mesmo é quando ele diz que vai “diminuir o tom do discurso para ajudar a aprovar a Lei Geral da Copa”. Qualquer ser viciado em lógica, como este escriba, entende que, uma vez aprovada, o tom pode se elevar de novo. Notem que ele deixa claro que está “mudando o discurso”, agora “mais light”, sugerindo que as convicções continuam as mesmas.
Concluo
O busílis é o seguinte: Jilmar Tatto está confundindo a Câmara com a Tattolândia, onde — lá vai uma metáfora, Pedrinho, que agasalha um antítese — os Tattos mandam soltar e prender.
A verdade insofismável que vaza das palavras deste grande pensador da política, formado segundo os métodos consagrados naquele território “todo dominado”, é que o PT tem uma misto de desprezo e nojo dos partidos aos quais se associou para governar o país. Considera-os indignos. E tenta nos fazer crer que o petismo, ele-mesmo, é algo eticamente superior, superiormente ético.
As táticas empregadas na Tattolândia são um bom exemplo dessa “superioridade”.
PS - Espero que o deputado não se zangue de novo com a crítica… Sabem como é, não sou base aliada…
22 de março de 2012
Reinaldo Azevedo
Um painel político do momento histórico em que vivem o país e o mundo. Pretende ser um observatório dos principais acontecimentos que dominam o cenário político nacional e internacional, e um canal de denúncias da corrupção e da violência, que afrontam a cidadania. Este não é um blog partidário, visto que partidos não representam idéias, mas interesses de grupos, e servem apenas para encobrir o oportunismo político de bandidos. Não obstante, seguimos o caminho da direita. Semitam rectam.
"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)
"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)
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