"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sexta-feira, 20 de abril de 2012

ESPANHA DEFINE O FEMICÍDIO. PARA QUANDO O MACHOCÍDIO?


Ativistas de todos os naipes têm-se dedicado, nos últimos anos, a criar neologismos para definir o que não existe ou amenizar palavras que, com o tempo, se tornaram pejorativas. Em falta do que fazer, adoram criar conceitos novos, que pouco ou nada têm a ver com a realidade. O pior é que geralmente são neologismos mal construídos, que demonstram desconhecimento do vernáculo e da etimologia.

Pior ainda, estes desvarios semânticos são acolhidos pelo Judiciário, que pretende inclusive criar língua, prerrogativa que sempre foi do povo. A tal de homoafetividade, por exemplo. Segundo o ministro Carlos Ayres Britto, do STF, homossexuais já não mais existem. Agora são todos homoafetivos.

Comentei ano passado. Em defesa da nova terminologia, o ministro dizia que o vocábulo foi cunhado pela vez primeira na obra União Homossexual, o Preconceito e a Justiça, de autoria da desembargadora aposentada e jurista Maria Berenice Dias, consoante a seguinte passagem: “Há palavras que carregam o estigma do preconceito. Assim, o afeto a pessoa do mesmo sexo chamava-se 'homossexualismo'. Reconhecida a inconveniência do sufixo 'ismo', que está ligado a doença, passou-se a falar em 'homossexualidade', que sinaliza um determinado jeito de ser. Tal mudança, no entanto, não foi suficiente para pôr fim ao repúdio social ao amor entre iguais”.

Acontece que o neologismo está errado. O homo, de homossexual, é palavra grega que quer dizer mesmo. Homossexual, mesmo sexo. A palavra homoafetivo, se formos fiéis ao étimo, quer dizer mesmo afeto. Ora, mesmo afeto não quer dizer nada específico. Quer dizer apenas que você tem o mesmo afeto que outra pessoa tem por você. Mas homoafetivo, segundo a desembargadora desocupada, seria um eufemismo para homossexual. Não é. É palavra que foi construída errada.

Da mesma forma, homofobia. Pretendeu-se associar o homo a homossexual, quando homo continua tendo seu significado original, mesmo. Homofobia, etimologicamente, quer dizer “mesmo medo”. Ora, a palavrinha pretende ser sinônima de repulsa ao homossexualismo. Não é. Também foi construída errada. É espantoso ver jornalistas, profissionais que todos os dias lidam com as palavras, aceitarem conceitos sem pé nem cabeça, sem sequer questioná-los.

Os legisladores espanhóis querem agora brindar-nos com outra pérola: femicídio. Leio no El País que a Câmara dos Deputados aprovou por unanimidade, na noite de ontem, o projeto que propõe incorporar a figura do femicídio no Código Penal como um tipo agravado de homicídio, que estabelece “agravantes pelo vínculo” e descarta o uso de atenuantes quando o homem tenha antecedentes por violência. Após um debate de quase duas horas, o projeto foi aprovado por 204 votos – o que reuniu o consenso da maioria das bancadas – e enviado ao Senado.

O projeto modifica vários incisos do Código Penal. O novo inciso 1 defende a pena de reclusão perpétua ou prisão perpétua a “quem matar sua ascendente, descendente, cônjuge, ex-cônjuge, ou a pessoa com quem mantém ou manteve uma relação de casal, mediante ou não convivência”. A partir de agora, o inciso 4 define o femicídio como “um crime em relação a uma mulher quando o feito seja perpetrado por um homem e mediante violência de gênero”.

Ainda segundo o jornal, a incorporação da figura do femicídio ao Código Penal é uma antiga reivindicação das organizações sociais e de direitos humanos, que exigem o reconhecimento como tais dos crimes em que as vítimas foram assassinadas por sua condição de mulher.

Matar uma mulher deixou de ser homicídio. Agora é femicídio. Desde que o assassino seja homem. Perguntinha que fica no ar: e se a vítima for assassinada por sua companheira, como é que ficamos? O novo inciso é claro: “quanto o feito seja perpetrado por um homem”. Mulher matando mulher volta a ser homicídio?

Ora, palavra puxa palavra. Se homem matando mulher mediante violência de gênero não é mais homicídio, mas femicídio, urge nova palavra para designar mulher que mata homem mediante violência de gênero. Pela lógica, teríamos machocídio. Pelo jeito, os bravos e percucientes legisladores espanhóis esqueceram de tipificar esta importante figura jurídica.

O Judiciário brasileiro, que já incorporou o exótico conceito de homoafetividade, certamente não tardará muito em propor ao Código Penal o crime de femicídio. Se alguém acha que estupidez é quinhão nosso, os deputados espanhóis se apressaram em desmentir esta calúnia. A estupidez é universal.


20 de abril de 2012
janer cristaldo

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