Na varanda, cercada de plantas e cheia de artesanato popular, da casa discreta na Rua Enéas de Lucena, em Rosarinho, Recife, Miguel Arraes e Jarbas Vasconcelos conversaram pela última vez, em 1992.
Depois de longa conversa, Arraes foi embora sem dizer o que queria, mas Jarbas sabia. Na semana seguinte, o neto de Arraes, Eduardo Campos (hoje ministro de Ciência e Tecnologia), voltou à casa de Jarbas. Queria ser o vice de Jarbas na eleição para a Prefeitura do Recife.
Jarbas já tinha outro lado, outra aliança e outro candidato: Silvio Pessoa, do PSDB. Eduardo Campos saiu candidato a prefeito, pelo PSB. Foi o quinto. Jarbas ganhou no primeiro turno, derrotando também André de Paula, do PFL, Roberto Freire, do PPS e Augusto Lucena, do PTB.
Era uma história de amor, que tinha virado uma história de ódio.
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ARRAES
Em 16 de setembro de 1979, trazido nos braços da anistia, Arraes voltara de 15 anos de exílio na Argélia e Paris, recebido por uma multidão, em um comício a que fui no carro de um jovem alto, testa larga, cabelos ainda pretos, Jarbas Vasconcelos.
Quem preparou o comício foi o diretório do MDB de Pernambuco, comandado pela competência de Jarbas. Era o primeiro grande comício do MDB depois da anistia. Para subir no palanque, a escadinha estreita não dava jeito. Ao lado, um rapaz forte de cabelo encaracolado, barba preta, camisa branca e calça jeans, dava a mão e nos puxava para cima. Era Lula.
Em 1978, Jarbas tinha sido o candidato do MDB a senador. Teve 700 mil votos. Pela Arena, Nilo Coelho fez 350 mil, Cid Sampaio 300 mil. A sublegenda elegeu Nilo. Em 82, Jarbas e Arraes apoiaram para governador Marcos Freire, derrotado por Roberto Magalhães, do PDS, e se elegeram deputados federais, Arraes com 191 mil votos, a maior da história do Estado.
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JARBAS
Em 85, Arraes apoiou Jarbas para prefeito. Em 86, Jarbas apoiou Arraes para governador. Juntos, ganharam as duas. Em 90, a chapa com Jarbas para governador e Arraes para senador era imbatível. Mas Arraes passou o governo para o vice Carlos Wilson, saiu do PMDB, foi para o PSB, não disputou o Senado, fez uma chapa para federal, teve 300 mil votos, elegeu mais quatro.
E conseguiu o que queria: derrotou Jarbas, que perdeu para Joaquim Francisco, do PFL, e todo o MDB histórico da resistência à ditadura, que o sustentou politicamente no exílio: Oswaldo Lima Filho, Fernando Lyra, Cristina Tavares, Fernando Coelho, outros. Ninguém se reelegeu.
Por isso, em 92, Jarbas vetou o neto de Arraes. Era o troco de 90. Em 94, Arraes se elegeu governador com Jarbas apoiando Gustavo Krause, do PFL. Em 96, Jarbas apoiou Roberto Magalhães, também do PFL, e derrotou Roberto Freire, do PPS, candidato de Arraes, e João Paulo, do PT.
Em 98, Jarbas e Arraes, que queria ser governador pela quarta vez, emendaram os bigodes, acertaram as contas. Disputaram afinal o governo do Estado. Jarbas teve uma vitória devastadora: 64,39%. Ganhou em Recife e em todas as regiões de Pernambuco. O ódio estava consolidado.
Após esse rompimento, Jarbas e Campos no último dia 3 apareceram em público pela primeira vez para fazer campanha e discursar lado a lado. O encontro foi na inauguração do comitê de Jarbas Filho, o Jarbinhas, filho do senador candidato a vereador em Recife.
Jarbas confidenciou que as conversações já vinham ocorrendo desde o fim das eleições passadas, mas que eram destinadas a costurar uma aliança só para 2014, mas o acordo acabou sendo antecipado. O ódio não existe mais.
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