O advogado José Carlos Dias, ex-ministro da Justiça, já aventou ontem a possibilidade de o devido processo legal estar sendo violado caso a votação seja fatiada, como propôs o relator. O ministro revisor, Ricardo Lewandowski, leu o regimento interno e afirmou que, se a ordem definida nele não fosse seguida rigorosamente, o Supremo estará decidindo de maneira irregular. Mas recuou de sua posição à noite.
O plenário do STF em certos momentos mais parecia uma Torre de Babel, pois muitas vezes ministros que estão defendendo posições semelhantes se desentendiam porque um não fala a língua do outro. Ou, o mais grave, defendiam posições divergentes e não se mostravam dispostos a encontrar uma solução que pudesse ser aceita por todos.
A primeira indagação a ser feita é por que os ministros não discutiram internamente o procedimento de votação, deixando que as divergências aflorassem em pleno julgamento, em frente às câmeras de televisão?
Não é possível que não conseguissem chegar a um resultado majoritário que seja respeitado por todos, como aconteceu na montagem do calendário do julgamento.
Mesmo nesse caso, quando se pensava que era ponto pacífico a intenção de fazer o julgamento no menor prazo possível, tanto para chegar-se mais rápido a uma definição como também para permitir que o ministro Cezar Peluso pudesse votar antes de sua aposentadoria compulsória a 3 de setembro, veem-se a cada dia atitudes procrastinatórias, tanto por parte dos advogados de defesa — o que é natural, já que desconfiam que Peluso tenda a votar pela condenação dos réus — quanto de alguns ministros.
Com relação à maneira de votar, o desentendimento começou assim que o relator Joaquim Barbosa anunciou que adotaria em seu voto a mesma sistemática já adotada quando das alegações finais.
Ele dividiu o processo em oito itens, e o revisor Ricardo Lewandowski viu nesse ato uma demonstração de que Barbosa aderira de antemão à estrutura da acusação, o que já indicaria sua posição.
Acontece que a Procuradoria Geral da República dividiu o processo em três núcleos — o político, o operacional e o financeiro — e não em itens.
Esclarecido o mal-entendido, continuou-se num impasse, pois, se o relator queria que se votasse item por item, o revisor Lewandowski dizia que seu voto segue um raciocínio unitário e tinha que ser lido de uma vez.
Na tentativa de chegar a uma decisão majoritária sem imposição, o presidente da Corte, Ayres Britto, colocou a questão em votação, e a maioria decidiu que cada um votaria como quisesse.
Mas essa solução não resolveu o impasse do Supremo.
O ministro Joaquim Barbosa acabou de votar seu primeiro item, pedindo a condenação do ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha — candidato a prefeito de Osasco nestas eleições municipais —, por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro, e do lobista Marcos Valério e de seus sócios por corrupção ativa e peculato.
Nesse processo imaginado por Barbosa, na segunda-feira seria a vez de o ministro revisor dar seu voto sobre os envolvidos nesse primeiro item, para em seguida os ministros votarem.
Acontece que, se Lewandowski decidisse ler seu voto na integralidade, não apenas ocuparia as próximas três ou quatro sessões como, mais grave, falaria sobre temas e personagens que ainda não teriam sido abordados pelo voto do relator.
Seria o caos, como definiu o ministro Marco Aurélio Mello. Por isso, a necessidade de um dos dois recuar de sua posição, e coube a Lewandowski se curvar diante da tendência da maioria.
Há ainda o risco de que, na metodologia de Barbosa, o ministro Cezar Peluso vote em alguns casos e não tenha tempo de votar em outros, o que poderá ser também objeto de contestação.
17 de agosto de 2012
Merval Pereira, O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário