Editorial da Folha
Em junho de 2009, numa decisão que por um voto não foi unânime, o Supremo Tribunal Federal declarou que a obrigatoriedade de diploma em jornalismo para o exercício da profissão é inconstitucional, por restringir as liberdades de informação e expressão.
Não tardou para que o lobby de faculdades e sindicatos providenciasse proposta de emenda à Constituição destinada a assegurar sua reserva de mercado à custa daquelas liberdades fundamentais. Tal emenda foi aprovada ontem pelo Senado; ainda é tempo de a Câmara corrigir o grave erro.
O jornalismo não é uma ciência, mas uma técnica de apreender e relatar fatos de interesse público. Não é uma especialidade, mas uma ampla coleção delas. Como quase todo tema pode ser objeto de cobertura jornalística, seu exercício coletivo demanda a contribuição de profissionais com as mais diversas formações e experiências.
A obrigatoriedade do diploma se justifica nas profissões ─ medicina e engenharia, notoriamente ─ em que o despreparo pode ser aquilatado de modo objetivo e conduzir a danos irreparáveis. Os danos causados pelo mau jornalismo nunca são tão graves, nem tão indiscutível a sua constatação.
Em qualquer atividade profissional, quando se estabelece uma reserva de mercado em benefício de uma minoria, reduz-se a competição, rebaixam-se os padrões de qualidade e quase sempre se prejudica a maioria, ou seja, o público. O jornalismo brasileiro precisa de mais, não de menos qualificação intelectual. Um dos aspectos nocivos da obrigatoriedade é desencorajá-la.
Avessos a investir anos preciosos num curso de comunicações rara vez compensador, ficariam alijados do jornalismo profissionais com valiosa formação em história, medicina, direito, economia e tantos outros saberes que costumam formar o mosaico das melhores redações.
Além de nociva, a obrigatoriedade é anacrônica. A internet abriu as fronteiras do jornalismo para modalidades flexíveis e semiprofissionais, como o jornalismo cidadão e os blogs coletivos, cuja prática escapa a qualquer regulamentação, exceto aquela exercida por Estados policiais.
“Não há interesse público envolvido nisso”, disse o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) a respeito do lobby do diploma em jornalismo. Com efeito, a preocupação é gremial, localizada nas cúpulas sindicais e nos departamentos universitários de comunicações.
O que mais convém ao país é manter o jornalismo como profissão livre, pública e aberta, beneficiária dos talentos multifacetados do pensamento humano.
09 de agosto de 2012
Augusto Nunes
PUBLICADO NA FOLHA DE S. PAULO DESTA QUINTA-FEIRA
Em junho de 2009, numa decisão que por um voto não foi unânime, o Supremo Tribunal Federal declarou que a obrigatoriedade de diploma em jornalismo para o exercício da profissão é inconstitucional, por restringir as liberdades de informação e expressão.
Não tardou para que o lobby de faculdades e sindicatos providenciasse proposta de emenda à Constituição destinada a assegurar sua reserva de mercado à custa daquelas liberdades fundamentais. Tal emenda foi aprovada ontem pelo Senado; ainda é tempo de a Câmara corrigir o grave erro.
O jornalismo não é uma ciência, mas uma técnica de apreender e relatar fatos de interesse público. Não é uma especialidade, mas uma ampla coleção delas. Como quase todo tema pode ser objeto de cobertura jornalística, seu exercício coletivo demanda a contribuição de profissionais com as mais diversas formações e experiências.
A obrigatoriedade do diploma se justifica nas profissões ─ medicina e engenharia, notoriamente ─ em que o despreparo pode ser aquilatado de modo objetivo e conduzir a danos irreparáveis. Os danos causados pelo mau jornalismo nunca são tão graves, nem tão indiscutível a sua constatação.
Em qualquer atividade profissional, quando se estabelece uma reserva de mercado em benefício de uma minoria, reduz-se a competição, rebaixam-se os padrões de qualidade e quase sempre se prejudica a maioria, ou seja, o público. O jornalismo brasileiro precisa de mais, não de menos qualificação intelectual. Um dos aspectos nocivos da obrigatoriedade é desencorajá-la.
Avessos a investir anos preciosos num curso de comunicações rara vez compensador, ficariam alijados do jornalismo profissionais com valiosa formação em história, medicina, direito, economia e tantos outros saberes que costumam formar o mosaico das melhores redações.
Além de nociva, a obrigatoriedade é anacrônica. A internet abriu as fronteiras do jornalismo para modalidades flexíveis e semiprofissionais, como o jornalismo cidadão e os blogs coletivos, cuja prática escapa a qualquer regulamentação, exceto aquela exercida por Estados policiais.
“Não há interesse público envolvido nisso”, disse o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) a respeito do lobby do diploma em jornalismo. Com efeito, a preocupação é gremial, localizada nas cúpulas sindicais e nos departamentos universitários de comunicações.
O que mais convém ao país é manter o jornalismo como profissão livre, pública e aberta, beneficiária dos talentos multifacetados do pensamento humano.
09 de agosto de 2012
Augusto Nunes
PUBLICADO NA FOLHA DE S. PAULO DESTA QUINTA-FEIRA
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