"A verdade será sempre um escândalo". (In Adriano, M. Yourcenar)

"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o soberno estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade."
Alexis de Tocqueville (1805-1859)



sábado, 24 de novembro de 2012

UMA CERIMÔNIA CARREGADA DE SIGNIFICADOS

 

Um feixe de simbolismos envolveu a cerimônia de posse do novo presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, conferindo-lhe emoção especial. O primeiro deles era a visão de um negro sentado na cadeira mais alta de um dos três poderes da República.

Quanto não teve de andar o país escravista que nós fomos para chegar a este ponto, que é promessa de novos desenvolvimentos!

O segundo simbolismo era o da unidade dos poderes, todos sentados à mesma mesa (a presidente Dilma muito séria, por motivos que se conhece, mas obediente à liturgia da hora).

Do terceiro simbolismo encarregou-se o novo presidente do STF, ao dizer que “é preciso ter a honestidade de reconhecer que há um grande déficit de justiça entre nós”. Joaquim Barbosa disse o que todos sabemos: “Nem todos os brasileiros são tratados com igual consideração quando buscam o serviço público da Justiça.”

As causas são as mais variadas, começando com o fato de que o país passou, recentemente, por um importante upgrading social — pessoas mais conscientes dos seus direitos, que resolvem pedir justiça, e esbarram num sistema congestionado, medieval em alguns aspectos.

Reformas no sistema são indispensáveis; e neste sentido, é muito feliz a coincidência que leva o relator do processo do mensalão ao posto mais alto do Judiciário, e, em consequência, à direção geral do Conselho Nacional de Justiça.

O austero e técnico magistrado Joaquim Barbosa tem agora a oportunidade, à frente do CNJ, de trabalhar a favor do que defendeu em seu discurso de posse.

Desde que foi instituído, em fins de 2003, pela emenda constitucional que deflagrou o atual ciclo de reforma do Judiciário, o CNJ tem justificado sua criação como instrumento destinado a dar transparência a um poder opaco, distante da sociedade, de baixa competência administrativa.

Sem interferir no conteúdo das decisões dos magistrados — preservadas de qualquer interferência pela Constituição —, o CNJ busca defender a ética nos tribunais e estabelecer métodos administrativos modernos, a partir da definição de metas para tramitação mais rápida, ou menos vagarosa, dos processos que se acumulam.

O combate ao “grande déficit de justiça” existente no país, a que se referiu Barbosa, também é travado a partir do CNJ. Por meio dele, Joaquim Barbosa poderá perseguir um Judiciário “sem firulas, sem floreios, sem rapapés”.

Também merece destaque, na cerimônia de posse, o discurso de saudação do ministro Luiz Fux, em que se faz a defesa do Supremo contra os “desvarios e insensatez antirrepublicanos” de grupos que se opõem a seus veredictos pelos mais ignóbeis interesses políticos.

24 de novembro de 2012
O Globo, Editorial

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