Tomo emprestado à "Folha de S.Paulo" o título da entrevista feita, recentemente, com o ex-ministro José Dirceu.
Quanta ironia! No dia em que ele pedira exoneração da Casa Civil, enviei-lhe e-mail, lembrando-lhe o sentido original da palavra grega, "ostracismo", utilizada para designar os que se destacavam (geralmente por suas qualidades): eram colocados à margem das decisões públicas para evitar que se tornassem tiranos.
Eu me encontrava ainda atordoada pelas declarações do deputado Roberto Jefferson sobre o que vinha acontecendo no governo Lula. Não podia acreditar fossem verdadeiras aquelas acusações.
Quando Zé Dirceu chegou à Câmara dos Deputados, no mesmo ano que eu, transformou-se rapidamente em uma espécie de xerife. Fazia a três por dois representações ao Ministério Público pedindo investigações. Desconfiava de tudo e todos e teve papel proeminente no "impeachment" de Collor.
Não era esse o meu estilo de ser representante popular. Não achava que transformar o Congresso Nacional em delegacia de polícia fazia parte de nosso papel. Fiscais, sim, mas não acusadores e perseguidores de quem quer que fosse.
E no interior do PT, por ação dele, ia minguando a democracia interna, substituída pela "luta política".
À época do e-mail, eu já fora defenestrada do Ministério do Trabalho e Emprego. Não conseguia entender a maioria das iniciativas do governo de que eu tanto esperara.
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ARREPENDIMENTO
Zé Dirceu agora se arrepende de não ter ajudado a criar uma sólida cultura de esquerda no país e vê que a cantada e decantada nova "classe média", criada a partir de medidas tomadas por Lula/Dilma, está "vivendo num paraíso", mas também vem sendo "cooptada" por valores conservadores… "É preciso trabalhar. A esquerda nunca teve uma vida tranquila no mundo. Nunca usufruiu das benesses do poder".
E prossegue: "O Ministério Público e a polícia com esse poder, esses grampos… isso está virando uma Gestapo. Quando as pessoas acordarem, pode ser tarde demais".
Zé Dirceu só se esqueceu de que, enquanto presidente do PT e depois virtual "primeiro-ministro", poderia ter posto um paradeiro na doce ilusão que eles compartilharam ao confundir estar no governo com ter o poder. Todos e, principalmente, o chefe estavam maravilhados por serem paparicados pelos poderosos: haviam trocado a aguardente pelas boas safras de Romanée Conti; pelos presentes como Rolex e Land Rover; vestiam ternos finamente cortados pelos melhores alfaiates do Brasil e deixavam que suas mulheres se transformassem em dondocas de cabeleireiros famosos, cheias de botoques deformadores.
Viveram a ilusão do poder. Só que os que têm poder só o têm porque podem explorar, excluir, subornar e corromper.
Agora, muitos vão ter de se arrepender na cadeia. Onde espero, de coração, possam se transformar em sábios, reconhecendo seus erros e o engano a que levaram os pobres do Brasil.
Se ainda houver tempo para que isto aqui não se transforme num imenso meio-oeste americano, cheio de fanáticos reacionários…
04 de janeiro de 2013
Sandra Starling
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