A economia brasileira crescerá 3,1% neste ano, com inflação de 5,7%, muito acima dos 4,8% projetados no fim de 2012, segundo as novas estimativas do Banco Central (BC). Os preços continuarão subindo bem acima da meta, de 4,5%, pelo menos até o primeiro trimestre de 2015, de acordo com o Relatório de Inflação, um panorama divulgado a cada três meses pelo BC.
Rico de informações e projeções sobre a economia nacional e os mercados globais, esse estudo seria, no entanto, mais completo, e muito mais realista, se incluísse uma seção especial sobre as intervenções desastradas da presidente Dilma Rousseff na política de contenção de preços.
A última interferência notável ocorreu na quarta-feira, véspera da publicação do relatório. O palavrório estabanado da presidente, numa entrevista em Durban, na África do Sul, provocou tensão no mercado financeiro, seguida de explicações oficiais, desmentidos e uma reação irada da própria Dilma.
"Foi uma manipulação inadmissível de minha fala", disse a presidente, numa vã tentativa de atribuir a outras pessoas o próprio erro. Não houve manipulação. Durante o dia todo as emissoras de televisão reapresentaram a desastrada fala presidencial sobre a "política superada" de combate à inflação.
Sua declaração foi interpretada, como era de esperar, como condenação do uso dos juros no combate à inflação. Nenhuma outra interpretação seria mais compatível com o discurso habitual de quem apresenta como conquista do governo a redução dos juros básicos.
O presidente do BC, Alexandre Tombini, foi mobilizado para cuidar do estrago. Em entrevista ao Broadcast, serviço de informação em tempo real da Agência Estado, ele tentou desfazer o "mal-entendido". Afirmou o compromisso da presidente com o combate à inflação como "um valor em si", negou a tolerância à inflação e acrescentou uma explicação tão importante quanto tardia:
"De inflação fala a equipe econômica. Em relação à política de juros fala o BC". Mas esta é a mais perfeita negação do comportamento habitual da presidente e também do ministro da Fazenda. Sobram razões para ninguém levar a sério, desde o começo do atual governo, o discurso oficial sobre a autonomia do BC.
O escorregão presidencial já seria bastante grave, e até grotesco, se o episódio tivesse terminado na quarta-feira. Seria difícil, no entanto, apagar em tão pouco tempo as impropriedades ditas em tom professoral pela presidente da República. Ela tentou provar seu ponto de vista apontando o contraste do baixo crescimento econômico do ano passado com a inflação próxima de 6%.
Segundo ela, a alta de preços decorreu de um fator externo e fora do controle do Brasil - a alta das cotações das commodities. Qual teria sido o crescimento - esta é a pergunta implícita - se os juros tivessem subido?
É uma argumentação ingênua, incrivelmente inepta e desmentida no Relatório de Inflação divulgado ontem. Ao mencionar a resistência da inflação, o documento cita a alta de preços do setor de serviços (8,66% nos 12 meses até fevereiro), "a maior dispersão recentemente observada" nos aumentos de preços ao consumidor, além de "pressões sazonais e pressões localizadas no segmento de transportes, entre outros fatores".
Faltou acrescentar: o encarecimento dos serviços e a dispersão dos aumentos são claros indícios de inflação de demanda, sustentada por fatores também citados no relatório, como a geração de emprego e renda e a expansão do crédito (moderada, segundo o BC, mas nem tanto). Falta uma ressalva. Não se pode chamar de "recente" a dispersão dos aumentos, há muito tempo destacada pelos analistas independentes.
Para completar, o relatório contesta a oposição simplória entre crescimento econômico e combate à inflação. Segundo o documento, a evidência internacional, ratificada pela experiência brasileira, aponta distorções graves resultantes da inflação elevada.
Essas distorções aumentam os riscos e deprimem os investimentos, encurtando os horizontes de planejamento das famílias, empresas e governos e reduzindo a confiança dos empresários. Em suma, taxas altas de inflação "reduzem o potencial de crescimento da economia" e as possibilidades de geração de emprego e renda. Esse relatório seria uma leitura instrutiva para a presidente.
29 de março de 2013
Editorial do Estadão
Rico de informações e projeções sobre a economia nacional e os mercados globais, esse estudo seria, no entanto, mais completo, e muito mais realista, se incluísse uma seção especial sobre as intervenções desastradas da presidente Dilma Rousseff na política de contenção de preços.
A última interferência notável ocorreu na quarta-feira, véspera da publicação do relatório. O palavrório estabanado da presidente, numa entrevista em Durban, na África do Sul, provocou tensão no mercado financeiro, seguida de explicações oficiais, desmentidos e uma reação irada da própria Dilma.
"Foi uma manipulação inadmissível de minha fala", disse a presidente, numa vã tentativa de atribuir a outras pessoas o próprio erro. Não houve manipulação. Durante o dia todo as emissoras de televisão reapresentaram a desastrada fala presidencial sobre a "política superada" de combate à inflação.
Sua declaração foi interpretada, como era de esperar, como condenação do uso dos juros no combate à inflação. Nenhuma outra interpretação seria mais compatível com o discurso habitual de quem apresenta como conquista do governo a redução dos juros básicos.
O presidente do BC, Alexandre Tombini, foi mobilizado para cuidar do estrago. Em entrevista ao Broadcast, serviço de informação em tempo real da Agência Estado, ele tentou desfazer o "mal-entendido". Afirmou o compromisso da presidente com o combate à inflação como "um valor em si", negou a tolerância à inflação e acrescentou uma explicação tão importante quanto tardia:
"De inflação fala a equipe econômica. Em relação à política de juros fala o BC". Mas esta é a mais perfeita negação do comportamento habitual da presidente e também do ministro da Fazenda. Sobram razões para ninguém levar a sério, desde o começo do atual governo, o discurso oficial sobre a autonomia do BC.
O escorregão presidencial já seria bastante grave, e até grotesco, se o episódio tivesse terminado na quarta-feira. Seria difícil, no entanto, apagar em tão pouco tempo as impropriedades ditas em tom professoral pela presidente da República. Ela tentou provar seu ponto de vista apontando o contraste do baixo crescimento econômico do ano passado com a inflação próxima de 6%.
Segundo ela, a alta de preços decorreu de um fator externo e fora do controle do Brasil - a alta das cotações das commodities. Qual teria sido o crescimento - esta é a pergunta implícita - se os juros tivessem subido?
É uma argumentação ingênua, incrivelmente inepta e desmentida no Relatório de Inflação divulgado ontem. Ao mencionar a resistência da inflação, o documento cita a alta de preços do setor de serviços (8,66% nos 12 meses até fevereiro), "a maior dispersão recentemente observada" nos aumentos de preços ao consumidor, além de "pressões sazonais e pressões localizadas no segmento de transportes, entre outros fatores".
Faltou acrescentar: o encarecimento dos serviços e a dispersão dos aumentos são claros indícios de inflação de demanda, sustentada por fatores também citados no relatório, como a geração de emprego e renda e a expansão do crédito (moderada, segundo o BC, mas nem tanto). Falta uma ressalva. Não se pode chamar de "recente" a dispersão dos aumentos, há muito tempo destacada pelos analistas independentes.
Para completar, o relatório contesta a oposição simplória entre crescimento econômico e combate à inflação. Segundo o documento, a evidência internacional, ratificada pela experiência brasileira, aponta distorções graves resultantes da inflação elevada.
Essas distorções aumentam os riscos e deprimem os investimentos, encurtando os horizontes de planejamento das famílias, empresas e governos e reduzindo a confiança dos empresários. Em suma, taxas altas de inflação "reduzem o potencial de crescimento da economia" e as possibilidades de geração de emprego e renda. Esse relatório seria uma leitura instrutiva para a presidente.
29 de março de 2013
Editorial do Estadão
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